É possível aperfeiçoar e expandir o ensino superior brasileiro sem recorrer à privatização e à terceirização. É o que defendem as universidades federais paulistas no projeto “Outro futuro”, formulado em conjunto com a União Nacional dos Estudantes (UNE) e com a Associação Nacional de Pós-Graduandos (ANPG).
Antagônica ao "Future-se", projeto de lei apresentado pelo Ministério da Educação, a proposta desenvolvida pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), pela Universidade Federal do ABC (UFABC) e pelo Instituto Federal de São Paulo (IFSP) apresenta argumentos em defesa da autonomia universitária de forma ampla, com financiamento público, gestão democrática e gratuidade.
Pedro Arantes, pró-reitor de Planejamento da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), ressalta que o documento das federais é baseado em princípios assumidos na redemocratização do país.
“Fizemos uma proposta que, no geral, tem um núcleo duro de defesa dos valores que a sociedade brasileira constituiu um torno da educação pública. Eles estão expressos na Constituição, na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) e no Plano Nacional de Educação”, lembra Arantes.
De acordo com o texto do “Outro Futuro”, que será encaminhado ao Congresso Nacional, o planejamento e as atividades das universidades devem ser pautados pelos princípios da liberdade e do pluralismo de ideias.
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Entre as diretrizes para a garantia do financiamento público ao ensino superior e tecnológico, o documento defende a revisão da Emenda Constitucional 95, que instituiu um teto para os investimentos públicos do país.
Além de sustentar que as leis orçamentárias devem garantir os recursos para a plena manutenção das instituições federais, a proposta aposta que é necessário continuar a expandir o número de vagas públicas para o ensino superior.
A ampliação da rede de atendimento dos hospitais universitários, assim como o fortalecimento da política de bolsas de pesquisa e extensão universitárias, também são ressaltados pelo projeto.
O antagonismo em relação ao "Future-se" está expresso em todos os tópicos do projeto, que propõe valorizar o papel social das instituições universitárias. “Universidades inovadoras são as que pensam os problemas do país em uma perspectiva social e não mercantil, por isso são relevantes as parcerias público-privada, com entidades civis, comunidades e movimentos sociais e não apenas com empresas privadas”, diz o texto.
Para Iago Montalvão, presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), o projeto é relevante porque evidencia que existem alternativas à proposta de lei do governo Bolsonaro.
“Ter uma sistematização das propostas ajuda a dialogar e convencer as pessoas de que há outra possibilidade, sim, que não passa pelo 'Future-se', que não passa por um projeto de privatização, que não passa por um projeto de organizações sociais que reduz a autonomia da universidade”, ressalta.
A defesa do concurso público para seleção de técnicos e docentes, o repúdio às propostas que ampliem a terceirização e a equiparação do modelo de eleição e nomeação de reitores entre universidades e institutos também estão entre as propostas das federais paulistas.
A aprovação urgente de uma nova Lei de Licitações, que preveja modalidades que favoreçam as compras especiais das universidades -- principalmente as associadas à pesquisa --, é outro ponto do plano apresentado.
Entre outras ações, o documento também defende o favorecimento de compras de alimentos produzidos por agricultores familiares e assentados da reforma agrária para os restaurantes universitários.
Mudanças legislativas
No que tange à captação de recursos próprios e parcerias, a aprovação imediata da PEC 24/2019 é o primeiro ponto defendido pelo projeto “Outro Futuro”.
Segundo o texto, a aprovação da PEC permitiria “excluir despesas de instituições federais de ensino financiadas por meio de receitas próprias, de convênios ou de doações da base de cálculo e dos limites individualizados para as despesas primárias”.
Para estimular a captação de recursos, o plano das federais paulistas também sugere a isenção e a redução de impostos na importação de máquinas e insumos destinados à pesquisa científica.
Outra indicação do documento é a revisão da Lei dos Fundos Patrimoniais, para que esta passe a prever incentivos fiscais e isenções tributárias para doadores. O objetivo é estimular que recursos sejam dirigidos para a pesquisa.
Segundo Pedro Arantes, o “Outro Futuro” é uma agenda pragmática.
"Não é um projeto de lei como o 'Future-se', mas traz elementos para que esse debate aconteça no Brasil todo", afirma. "A ideia é que estejamos preparados para o debate no ano que vem, sobretudo quando ele acontecer no Congresso, quando nós novamente devemos sofrer problemas orçamentários. Quando o 'Future-se' estiver tramitando, se estiver tramitando, precisamos estar com argumentos e para poder dialogar com deputados e senadores”, explica o pró-reitor.
Arantes esclarece ainda que, apesar das mudanças propostas, uma reforma universitária não está no horizonte das instituições que assinam o projeto. Para ele, em meio à crise na área da educação, “as universidades estão sendo tratadas como adversárias e professores e estudantes tratados como inimigos da nação” por parte do governo Bolsonaro.
Edição: Daniel Giovanaz