O Chile inicia 2020 com 360 pessoas vítimas de lesão ocular como resultado da repressão policial nos protestos iniciados no último mês de outubro. Os dados atualizados foram apresentados pela Ordem dos Médicos do Chile (Colmed na sigla em espanhol) durante um protesto realizado nesta sexta-feira (03) em frente ao Hospital del Salvador, em Santiago, capital do país.
A manifestação realizada nessa manhã exigia justiça para Diego Lastra, um estudante de medicina que entrou para as estatísticas de vítimas dos Carabineros, como são chamados os policiais que integram a Força de Ordem e Segurança do país. Lastra perdeu a visão do olho esquerdo após ser atingido por uma bomba de gás lacrimogêneo no rosto.
Só no Hospital de Salvador, onde foi realizado o ato, a Unidade de Trauma Ocular registrou, em menos de três meses, 277 casos de lesão.
“São 277 pacientes com lesões oculares graves, entre os quais pelo menos 50 solicitarão, em um prazo que será definido, o uso de uma prótese ocular. Nacionalmente, se consideramos os pacientes de outros centros, tanto públicos como privados, temos aproximadamente 360 lesões oculares graves que poderiam deixar eventuais sequelas, entre elas, a cegueira”, afirmou o vice-presidente da instituição, Patricio Meza.
Desde o começo dos protestos, a polícia chilena é denunciada por diversas violações aos direitos humanos. Em novembro, uma decisão judicial proibiu o uso de balas de festim para reprimir e dispersar os manifestantes. No entanto, a decisão foi revertida após recurso apresentado pelos Carabineros no início de dezembro.
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Uma das vítimas mais recentes da atuação violenta da polícia é a fotojornalista Nicole Kramm, que perdeu 89% da visão no olho esquerdo após ser atingida por um projétil enquanto cobria a manifestação realizada na capital do país na virada do ano, intitulada “Ano novo com dignidade”.
“Caminhávamos pela avenida Alameda, felizes, com amigos e colegas, na direção da Praça Dignidade [como foi rebatizada a Praça Itália], quando passamos pelo Monumento de Carabineros e avistamos diversos bloqueios policiais (...) Alguns estavam tacando pedras, então aceleramos o passo e de repente senti uma pancada muito forte no olho, que vinha de onde estavam localizados esses bloqueios policiais, a pancada foi tão forte que me derrubou, fiquei totalmente atordoada, sangrava, e pensei o pior, foi traumático e desesperador. As/os voluntárias/os de saúde vendaram meus olhos e minha cabeça, me colocaram na cama mas os carabineros continuaram atirando e por isso o paramédico colocou um escudo pra me tirar do lugar. (...) P.S.: estava tranquilo, sem bloqueio de manifestantes”, afirma Nicole em seu relato publicado em sua conta no Instagram.
Embora o ato realizado na passagem do dia 31 de dezembro para o dia 1 de janeiro tenha sido pacífico, com a organização de um jantar coletivo e shows gratuitos, houve repressão policial com bombas de gás lacrimogêneos e jatos de água.
Durante a jornada, os manifestantes chilenos organizaram um altar para homenagear Mauricio Fredes, de 33 anos, que faleceu no dia 27 de dezembro ao cair em um fosso enquanto fugia da repressão policial.
Segundo dados recentes apresentados pela ONG Human Rights Watch (HRW), desde o início dos protestos em outubro, 1.051 pessoas ficaram feridas por projéteis ou balas de borracha, 26 pessoas morreram e 116 foram vítimas de crimes que "atentam contra a dignidade e a integridade sexual".
Na última quinta (02), o Partido Comunista do Chile anunciou que denunciará o presidente do país, Sebastián Piñera, na Corte Penal Internacional (CPI), localizada em Haia, na Holanda, pelas violações aos direitos humanos ocorridas nos últimos meses.
Edição: Luiza Mançano