A morte do major-general iraniano Qasem Soleimani pode reforçar o nacionalismo e gerar uma forte onda anti-imperialista nos povos do Oriente Médio, avaliam especialistas em conflitos internacionais.
A reação dos países da região, no entanto, é oposta à postura do presidente estadunidense Donald Trump, que, em discurso nesta quarta-feira (8), demonstrou sentir-se vitorioso ao declarar que estava “feliz por informar que o povo americano deve estar grato e feliz”. No dia anterior, ele já havia dito, pelo Twitter, que estava “tudo bem”.
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Marcelo Buzetto, professor de Relações Internacionais e pesquisador especialista em conflitos do Oriente Médio, acredita que a morte do líder militar vai alimentar uma união entre os povos do Golfo Pérsico contra a invasão de exércitos estrangeiros.
“O que a gente sente, nos povos do Iraque e do Irã, é um clima de vitória do Irã diante da situação. Eu penso que a decisão equivocada do Trump, o ato terrorista e covarde de assassinar o Soleimani, vai acabar criando um movimento contrário ao que o Trump desejava. Essa iniciativa só vai fortalecer um movimento que já vinha sendo construído, que é um movimento pela retirada imediata de todas as tropas estadunidenses do Oriente Médio”, diz o professor.
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Para Buzetto, a expulsão das tropas estadunidenses será a medida mais dura e libertadora que os países da região podem tomar em retaliação à morte de Soleimani. O primeiro país a assumir a postura foi o Iraque, país onde o general foi morto, que aprovou a retirada das tropas estadunidenses em resposta ao ataque aéreo. “O primeiro passo para você construir um Oriente Médio melhor é você expulsar os soldados. Quem conseguir cumprir essa tarefa vai dar um primeiro passo para a construção de um Oriente Médio melhor”.
Marcelo Zero, especialista em Relações Internacionais e membro do Grupo de Reflexão sobre Relações Internacionais (GR-RI), considera o assassinato do líder iraniano um erro estratégico da Casa Branca. Para ele, o efeito vai ser o contrário do desejado, que era conter a influência do Irã sobre países vizinhos, como o Iraque.
“A minha impressão é que o Trump foi influenciado, mal influenciado, por alguns extremados do departamento de estado norte-americano para assassinar Soleimani e, com isso, tentar conter essa influência do Irã no Iraque. Tentar manter as suas bases, as suas tropas, em uma região que eles consideram estratégica. Mas isso pode, realmente, ser contraproducente para os interesses norte-americanos, porque provocou uma revolta na população, não apenas do Irã, mas em toda a população xiita do Oriente Médio”, afirma o especialista.
Zero diz temer que os Estados Unidos incitem uma guerra interna no Oriente Médio, com a intenção de derrubar governos contrários a eles, a partir de grupos sunitas radicais como o Estado Islâmico. “Eu acho que, a depender dos resultados do que vai acontecer no Iraque, os Estados Unidos vão fazer algum tipo de ação provavelmente estimulando grupos sunitas, radicais, como o Estado Islâmico e outros, contra o governo do Iraque.
O especialista reforça ainda que não há interesse do Irã em uma guerra contra os Estados Unidos ou países aliados, já que a postura do país – e do próprio Soleimani -- tem sido de superar o isolamento diplomático de anos atrás.
“Eles não têm interesse em uma guerra aberta contra Estados Unidos, Israel ou ao menos contra a Arábia Saudita porque eles sabem que isso vai custar muito e vai promover, de novo, um certo isolamento diplomático. [Os iranianos] vão realizar ações mais diplomáticas, políticas, simbólicas, do que propriamente militares de grande expressão”, opina Zero.
Edição: Julia Chequer