Na manhã desta terça-feira (14), a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, esteve no campus da Universidade de São Paulo (USP), em Piracicaba (SP), onde funciona a Escola Superior de Agronomia Luiz de Queiroz (ESALQ), voltada aos cursos de ciências agrárias, sociais aplicadas e ambientais.
A ministra foi convidada pela direção da ESALQ para ser paraninfa das oito turmas de formandos do ano de 2019, que somam mais de 200 estudantes.
Como ela justificou a ausência na colação de grau, que acontecerá na próxima quinta-feira (16), a diretoria do campus organizou um encontro entre os formandos e a ministra nesta terça, assim como uma coletiva de imprensa.
Segundo a formanda de Ciências Biológicas Angélica Borges, estiveram presentes cerca de 80 pessoas, incluindo desde o reitor da USP, a direção da ESALQ, o prefeito de Piracicaba, professores, técnicos e estudantes do campus.
Nara Perobelli, formanda da 15ª turma de Bacharelado em Gestão Ambiental, durante o encontro, leu uma carta dos estudantes à Tereza Cristina, os quais denunciam a escolha da paraninfa, assim como o modelo do agronegócio e suas políticas, a exemplo das queimadas na Amazônia, a morte de indígenas, quilombolas e ambientalistas e o silenciamento de cientistas e pesquisadores.
A estudante terminou a leitura do texto citando Ana Maria Primavesi, agrônoma e pioneira no estudo e na prática da agroecologia, que faleceu no dia 5 deste mês. Primavesi defendeu durante sua vida um sistema agrário que produza alimentos saudáveis ao mesmo tempo em que cuida da terra.
Leia na íntegra a carta escrita pelos formandos:
Bom dia a todas e a todos!
Aqui na ESALQ nós passamos de 4 a 7 anos de nossas formações ouvindo, independentemente do curso que fazemos, sobre o agronegócio. Desde a administração, passando por ciência dos alimentos e engenharia florestal, todos, exceção, entram em contato com esse universo.
De um agro que é pop, que é tech, que é tudo. Temos a certeza de que a senhora, ministra, e o governo Bolsonaro como um todo, representam, geram e reproduzem em seu projeto de país esse modelo.
Um modelo que é a cara da bancada ruralista. Um projeto de governo fundamentado e sustentado no capital e na desigualdade.
Que em 2019 gerou incêndios de proporções assustadoras;
Que prendeu e matou ambientalistas, indígenas, quilombolas, agricultores, mulheres, negros, lgbtqi+;
Que buscou silenciar cientistas, pesquisadores, professores e todos que com dados escancaravam os problemas trazidos pelo tipo de agricultura que vocês incentivam com palavras e dinheiro.
Nós passamos de 4 a 7 anos aqui dentro ouvindo de muitos que essa era a única maneira possível de acabar com a fome no Brasil e no mundo.
Ouvimos de muitos, mas não de todos.
Hoje, segurando este microfone tenho o orgulho de representar quem entende, por meio da ciência, da ética, e do amor sem rótulos, que uma outra agricultura e modelo de sociedade são possíveis.
Esse grupo de pessoas é formado por estudantes, professores e funcionários que fazem pesquisa e extensão fundamentados na agroecologia nesta universidade, que é pública e que deve ser de todos e todas.
Para este grupo do qual eu faço parte, é intragável que esta Escola, que se diz gloriosa, seja conivente com uma forma de produção e um projeto de país que se baseia no lucro, excluindo as pessoas do campo e as múltiplas funções da agricultura.
Um governo que cerceia a ciência e a autonomia das universidades, que distorce informações, que não se propõe a ouvir as nossas vozes nas ruas, mas que suporta nos escutar por dois minutos em troca de publicidade e uma placa de homenagem.
Não, não representa a nenhuma ou nenhum de nós uma paraninfa ou paraninfo que do alto cargo de liderança que possui, escolha fazer política dessa forma.
Acreditamos, trabalhamos para isso e seguiremos na luta em direção a um sistema, que, como diz nossa sempre presente Ana Maria Primavesi, “não é para vender adubos e defensivos, mas para produzir bem e barato”.
Edição: Rodrigo Chagas