O quantitativo de redações avaliadas com nota zero no Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) do ano passado saltou de 112.559 para 143.736 no comparativo com a edição de 2018. Houve também uma redução sensível, de 55 para 53, no número de candidatos que tiraram nota 1.000 na redação, o grau máximo de desempenho do teste.
Os dados foram divulgados nesta sexta-feira (17), em Brasília (DF), durante coletiva de imprensa do ministro da Educação, Abraham Weintraub, e do presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), Alexandre Lopes. O Enem 2019 foi o primeiro da gestão Bolsonaro.
As notas médias das provas objetivas também registraram queda. O desempenho em matemática, por exemplo, ficou em 523,1 na última edição, enquanto, em 2018, a média foi de 535,5. Na avaliação de ciências humanas, a diferença foi maior: a média passou de 569,2 para 508 no período. Na área de linguagens, houve mudança de 526,9 para 520,9 e, em ciências da natureza, a média dos candidatos baixou de 493,8 para 477,8 no mesmo intervalo.
A nota média da prova de redação foi a única que subiu entre os dois anos, passando de 522,8 para 592,9. O principal motivo das notas zero no exame foi a entrega da prova em branco, o que ocorreu com 56.945 candidatos. Outros 40.624 fugiram ao tema proposto, segundo o Ministério da Educação (MEC) e 23.265 copiaram o texto apresentado no enunciado da prova.
Questionado sobre os resultados e sobre as comparações com anos anteriores, o titular da pasta, ministro Abraham Weintraub, disse que não seria possível avaliar a qualidade da prova pelas notas médias e classificou o Enem de 2019 como “um sucesso”.
A respeito do salto no número de redações que receberam nota zero, ele afirmou que não seria possível avaliar o Enem por esse critério e criticou indiretamente temas anteriores que pautaram questões relacionadas a direitos humanos.
“Pra saber se a qualidade do Enem é melhor ou pior, não é pela nota da redação. Entre fazer uma redação com um texto sobre um dialeto de travestis – eu nem sabia que tinha dialeto de travestis; pra mim, são pessoas que falam português – e um tema que foi do último Enem, eu preferia ter feito o do último Enem. Agora, a quantidade de zeros ou 10 não vai dizer a qualidade do tema (16:08)”, afirmou, acrescentando que “não há viés ideológico” no exame do ano passado.
Ao longo da coletiva, o ministro evitou comparações sobre o desempenho dos candidatos nas provas em relação aos números de 2018, apesar de ter sido questionado sobre o tema por diversas vezes.
“Quando você compara custo por aluno, complexidade da prova, logística, qualidade das questões, você vê que não teve polêmica. Foi tudo muito aceito. [Sobre a] a quantidade de problemas, a gente vê que não teve problema operacional. Foi o melhor que teve, por vários critérios”, tergiversou.
Enem digital
O MEC também anunciou que dobrou a meta para o número de pessoas que devem fazer o Enem com aplicação digital, a ser lançado este ano como projeto-piloto. Agora, em vez de 50 mil, o ministério espera que 100 mil candidatos optem por essa versão do exame. De acordo com o presidente do Inep, em breve serão lançados editais com esclarecimentos sobre o esquema da prova.
Segundo o governo, a ideia é que o Enem seja 100% digital até o ano de 2026, o que fará com que o exame presencial seja extinto com o tempo. De acordo com o ministro, neste ano, os candidatos poderão escolher se preferem fazer a versão digital ou a convencional.
Orçamento
Outros temas relacionados ao MEC também tiveram destaque no lançamento das notas nesta sexta-feira. Weintraub foi questionado, por exemplo, sobre o fato de o ministério não ter dado um destino para a verba de R$ 1 bilhão recebida em 2019 da Lava Jato a partir de recursos recuperados pela operação.
A pasta foi a que recebeu a maior quantidade entre o montante encaminhado para o Poder Executivo federal, mas não empenhou o dinheiro, que seria para a área de educação básica. A revelação foi feita pelo jornal Folha de São Paulo, nesta sexta-feira (17).
“A gente vai utilizar esse R$ 1 bilhão este ano para o maior projeto do mundo ocidental de creches que já foi feito. Não sei de onde foi tirado que esse dinheiro não vai ser aproveitado”, afirmou o ministro, após fazer duras críticas à Folha de São Paulo por ter publicado a informação. Ao ser novamente questionado sobre o motivo da não utilização do recurso em 2019, Weintraub disse que “ele não foi usado porque não estava pronto o projeto”.
A decisão do MEC tem como cenário uma sequência de medidas do governo que asfixiaram as verbas para a educação ao longo do ano passado. Os cortes atingiram todos os níveis de ensino e especialmente as universidades e agências de fomento à pesquisa, como a Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) e o CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico).
Ataques
Em diferentes momentos da coletiva, Weintraub reagiu às perguntas dos jornalistas com ataques à imprensa e críticas aos governos da Venezuela e de Cuba. Também tentou polemizar o entendimento sobre a ditadura militar no Brasil, ao ser questionado sobre a ausência de questões relacionadas ao tema no Enem 2019.
“Para mim, ditadura é isto: uma situação muito pesada. Como aqui, no Brasil, existe ainda uma coisa não pacificada de como foi o período do regime militar e o objetivo do Enem não é polemizar e sim selecionar as melhores cabeças, nós... nem eu, não fui eu, a banca examinadora resolveu não colocar”, afirmou, acrescentando que não haveria ingerência política do MEC e do Inep na banca que elabora o exame.
Edição: Leandro Melito