A favela da Rocinha, na zona sul do Rio de Janeiro, contava com um espaço comunitário que promovia aulas de alfabetização para adultos, inglês, costura e música. O programa "De Olho no Lixo: transformando resíduo em arte, cultura e educação" foi interrompido na última sexta-feira (16) por uma ação da Prefeitura do Rio, que demoliu o galpão sede do projeto socioambiental. O projeto, que estava em atividade desde 2016, utilizava reciclagem como matéria-prima para geração de emprego e arte.
Uma semana após a derrubada, os 57 trabalhadores da cooperativa de catadores, sem outra perspectiva de renda, permanecem sem espaço para continuar as atividades. Os funcionários, que ficaram conhecidos como verdinhos por causa do uniforme, passaram a desempenhar as funções de Agentes Socioambientais.
“O projeto é de educação ambiental e também de recuperação, a maioria das pessoas que trabalham conosco a sociedade não dava emprego. E hoje elas estavam trabalhando, ganhando seu sustento sem fazer mal a ninguém”, diz José Antônio Trajano, presidente da Cooperativa Recicla Rocinha, que compõe o projeto "De Olho no Lixo".
O projeto teve início em 2016 na Rocinha e recolheu até outubro desse ano 960 toneladas de lixo não recicláveis, coletados e destinados ao Aterro Sanitário, que deixaram de escoar para a praia de São Conrado. A Cooperativa Rocinha Recicla já coletou 260 toneladas de resíduos recicláveis comercializados, gerando uma renda entre R$ 800 e R$ 1500 para cada cooperado. “Espero que a prefeitura se conscientize e veja que não foi certo construir uma praça no local”, alerta.
Remoção
“Sem nenhuma notificação, recebemos a notícia que quebraram o portão da nossa cooperativa, começaram a retirar o material de qualquer maneira e a gente sem poder fazer nada”, lamenta Trajano sobre a demolição do local que completou uma semana nesta sexta-feira (23). A ação surpreendeu os participantes do "De Olho no Lixo", e colocou o galpão a baixo.
A Secretaria Municipal de Infraestrutura e Habitação informou ao Brasil de Fato que a transferência faz parte do programa de reurbanização da Rocinha. O real motivo, segundo a Prefeitura do Rio, era que o local não apresentava infraestrutura necessária para abrigar as atividades ONG. E que um espaço adequado será disponibilizado futuramente na Estrada da Gávea.
Cultura
Em 2015, a Secretaria de Estado do Ambiente (SEA), o Instituto Estadual do Ambiente (Inea) e o Viva Rio Socioambiental elaboraram o De Olho no Lixo. Além do trabalho com reciclagem, o forte envolvimento com a comunidade local também marca a atuação do programa. A Escola de Possibilidades Sonoras Funk Verde e a Escola de Moda Ecomoda oferecem aulas de capacitação a partir do reaproveitamento de materiais retirados do lixo.
Todas as turmas estão paradas, inclusive as de alfabetização e inglês, que tinham a previsão de se formar no final do ano e receber um certificado. “As aulas de alfabetização abrangiam os cooperados, muitos deles não sabiam ler nem escrever. A Rocinha precisa desse projeto, hoje estamos sem nada, mas na esperança de acontecer algo e o nosso trabalho continuar. A prefeitura arrancou o sonho até mesmo de aprender e ser alguém”, diz.
Escola de Moda Ecomoda é um curso de costura e produção de peças e acessórios feitos com matéria-prima reciclável (Foto: Secretaria do Ambiente SEA – RJ /Divulgação)