Eduardo Oliveira* trabalha há dez anos como professor temporário, uma função precarizada dentro da rede pública de educação no Estado de São Paulo. Em tese, os temporários não são concursados, e apenas suprem a ausência de profissionais efetivos que estão em licença. Não é o caso de Eduardo. Em 2013, ele passou em um concurso para Professor de Educação Básica 2 (PEB2): estavam previstas 59 mil vagas, mas 15 mil nunca foram chamados para trabalhar, segundo estimativa do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp).
“Eu e meus colegas que estão na mesma situação, de certa forma, somos discriminados. Quando perguntam: ‘Você não é efetivo? Você é categoria O [temporário]?', sinto que há nessa fala um preconceito. Como se quem fosse temporário não tivesse a mesma qualidade, preparo e a mesma qualificação do efetivo. Isso não é verdade, todos temos o mesmo curso, o mesmo diploma, e muitos fizeram o concurso, mas não foram chamados”, desabafa o professor.
O contrato temporário é de três anos, renovável após um intervalo obrigatório de 40 dias, sem direito a assistência médica. Como não há vínculo formal, os professores da categoria O podem ficar até três meses do ano sem salário — correspondente ao período de férias escolares.
O professor efetivo tem direito a até seis faltas abonadas, com justificativa. Os temporários têm direito a duas e, se no período de 12 meses tiverem uma falta (justificada ou não), perdem o direito às férias remuneradas. Os professores da categoria O também ficam, obrigatoriamente, sem salário no período final do contrato.
“No final do ano, ele é desligado e fica sem salário de dezembro a fevereiro, quando acontece a distribuição de aulas”, lamenta o professor.
A professora Cecília da Silva* mora no interior e passou no concurso, mas também não foi convocada para a vaga efetiva. "Tem sala de aula em que o professor se aposentou, mas quem pegou essa aula? Eu me sinto humilhada, porque a gente se esforça, estuda, paga a taxa… tudo isso, para nada”, critica.
As aulas na rede pública já começaram, e há dezenas de turmas sem professor. “Ter que ficar mendigando aula, esperando abrir portaria, é muito triste”, conclui Cecília, que dá aulas na rede pública desde 1989.
Números não batem
A secretaria de Educação de São Paulo explicou que as regras para temporários são diferentes, no que diz respeito aos direitos, porque é uma modalidade distinta de contratação, conforme a lei 10.093/09. Não há previsão de novos concursos.
A rede pública tem cerca de 3,5 milhões de alunos matriculados em 5,4 mil escolas. Sobre o concurso de 2013, a secretaria informa que foram chamados 89 mil aprovados, porém, por conta da rotatividade, não é possível informar quantos ainda estão na rede e quantos ainda poderiam ser chamados — pois o concurso expirou em 2017, como era previsto no edital.
A Apeoesp entrou com uma ação civil pública exigindo que o Estado faça a convocação dos 15 mil professores classificados no concurso para preencher as vagas disponíveis na rede. O governo aceitou negociar um acordo na Justiça na última sexta-feira (1º).
“Estamos aguardando, portanto, o agendamento da audiência de conciliação no TJ para que o acordo seja formalizado”, comunicou o sindicato, em nota.
Para 2019, o governo do Estado de São Paulo teve que recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF) para liberar a contratação de temporários sem concurso público, que estava barrada na Justiça, e assim completar o quadro de professores.
* Nomes fictícios. Eduardo e Cecília temem retaliação do governo estadual.