Coluna

Tortura de animais no setor de alimentos e cosméticos

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Segundo a FAO – Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação, 67 bilhões de porcos, aves e vacas são expostos, anualmente, a condições de crueldade. - Amber Kipp / Unsplash
67 bilhões de porcos, aves e vacas são expostos, anualmente, a condições de crueldade

Animais não são humanos, não devem ser tratados como humanos e nem mesmo confundidos com humanos. Não são capazes de raciocinar ou de falar. Mas, por outro lado, são capazes de sofrer.

Essa constatação nos coloca diante de um dilema: por que nós, animais humanos, que jamais aceitaríamos a tortura contra um humano, aceitamos a violência contra animais não humanos?

Você pode dizer: porque precisamos deles para nos alimentar. Não é bem assim. Milhões de pessoas vivem sem ter a proteína animal como referência central de suas dietas. O fazem por vários motivos, por exemplo: não compactuar com a violência contra animais, não compactuar com o desmatamento para criar gado, não concordar com o plantio de soja para alimentar gado.

Identidade vegana

O tema já transcende a visão distorcida de que veganos são gente estranha, esquisitões que deixaram a carne para viver de alface. Em um mundo em que até Arnold Schwarzenegger virou vegetariano, algo está ocorrendo. A indústria vegana movimenta US$ 50 bilhões anualmente. É o limiar de uma transformação que apenas começa. No Brasil, segundo o Ibope Inteligência, 30 milhões de pessoas se identificam com o vegetarianismo, o que dá 14% da população.

O esquisitão não é o vegano. O esquisito sou eu que aceito e como o resultado da tortura no churrasco de domingo. E na segunda escrevo artigos sobre direitos humanos e ética empresarial. Hummm.

A Ciência mais do que provou que animais sentem dor, são inteligentes, têm vidas sociais de alta complexidade. Eles têm circuitos neuronais semelhantes aos nossos e sentem dor, afeto, angústia.

Me sinto envergonhado em comer um pedaço de carne.

Crueldade contra animais

Um tempo atrás, em um trabalho para a Humane Society International (HSI), visitei fazendas criadoras de porcos para alimentação humana. Porcos são muito inteligentes. Sentem alegria, afeto, gostam de estar juntos e se relacionam muito bem com humanos.

O que vi é inaceitável. As porcas que produzem os leitões são mantidas em “celas de gestação”, gaiolas praticamente do tamanho do seu corpo, onde nem conseguem se virar. A opção é ficar em pé ou se deitar, sempre na mesma posição. Ficam assim durante meses.

Dão à luz, desmamam os leitões e são quimicamente estimuladas a entrar no cio, para um novo ciclo dentro daquela cela. Para que? Para que eu possa comer uma costeleta de porco no churrasco de domingo?

O que fazem com essas porcas é tortura. O mesmo ocorre com galinhas confinadas a vida toda. Gado confinado é a mesma coisa. Gansos são alimentados de maneira forçada até que seu fígado fique doente, gordo, e possa ser consumido como iguaria em restaurantes caríssimos.

Quanta crueldade você pode engolir em uma refeição com amigos ou familiares? Até onde você aceita a violência contra animais para satisfazer o teu paladar?

Indústria de cosméticos

No setor de cosméticos, macacos são torturados, amarrados pelos braços e pelo pescoço, torturados até a morte para o teste de componentes. Coelhos e cães são submetidos à tortura até ficarem cegos.

O que é isso?

Em 2019, a Cruelty Free International conseguiu se infiltrar em laboratórios alemães de testes com animais. Voltou com imagens chocantes de tortura e morte sob sofrimento extremo.

Vamos aceitando. A gente vai aceitando. Até que nos tirem o último resquício de humanidade. Será o momento em que nos tornaremos consumidores exemplares.

Porcos, aves e vacas são os animais que mais sofrem tortura e maus-tratos no mundo. Segundo a FAO – Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação, 67 bilhões de porcos, aves e vacas são expostos, anualmente, a condições de crueldade. Maltratados exclusivamente para a produção de alimentos.

No Brasil, segundo a Humane Society International (HSI), 70 milhões de galinhas vivem trancadas em “gaiolas em bateria”, superlotadas e sem espaço para as aves sequer abrirem as asas.

Temos algo a refletir. Não devemos deixar de alimentar um animal humano se ele for sentir fome. Mas, assim como o princípio do altruísmo serve para esse propósito, ele também serve para analisar o tema do sofrimento animal.

Me sinto envergonhado em comer um pedaço de carne. Minha filha, vegana, me olha com ternura porque ela sabe que ninguém muda à força.

Parei de fumar em setembro de 2019. Quando fumava, corria três minutos e sentia a morte perto de mim. Hoje, sem o cigarro, corro 40 minutos e sinto a vida me abraçar.

Keith Richards, dos Rolling Stones, disse que foi mais difícil largar o cigarro do que a heroína. Talvez eu concorde com o Keith. Ao mesmo tempo, acho que não deve ser tão difícil parar de comer carne.

Uma das frases mais sábias e amorosas que li diz o seguinte: “Você não precisa impor, mas pode ser o agente de mudança e o exemplo para outras pessoas”.

Pense nisso.

Edição: Leandro Melito