São Paulo

Empreendimento imobiliário ao lado de aldeia Guarani está na mira da Justiça Federal

Empresa pretende construir condomínio de cinco prédios no Pico do Jaraguá e está impedida de seguir cortando árvores

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |

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Indígenas acompanharam a audiência sobre a desocupação com reza, música e dança. Os guarani pedem respeito ao luto pelas árvores mortas - Elineudo Meira

A Justiça Federal proibiu que a construtora Tenda continue derrubando árvores em uma região do Pico do Jaraguá, São Paulo (SP), localizada no limite da Terra Indígena do Jaraguá, onde há diversas aldeias do Povo Guarani. A incorporadora pretende construir um conjunto de cinco torres de prédios residenciais para cerca de 800 moradores.

No dia 30 de janeiro, a empresa iniciou o processo de derrubada de mais de 520 árvores e a comunidade indígena fez uma denúncia ao Ministério Público. A Tenda alega que o empreendimento não se enquadra como atividade potencialmente poluidora e por isso não estaria sujeito a prévio licenciamento ambiental. Ainda segundo a empresa, a Secretaria do Verde e do Meio Ambiente da Prefeitura de São Paulo autorizou o manejo das árvores. Mas a administração municipal nega que tenha concedido a autorização.

O defensor público Vinícius Silva, que representa a comunidade, ressalta que a Constituição determina que a disputa sobre direitos indígenas devem ser processados e julgados por juízes federais. Além disso, o artigo 63 do Estatuto do Índio garante que “nenhuma medida judicial será concedida liminarmente em causas que envolvam interesse” de Patrimônio Indígena, sem prévia audiência da União e do órgão de proteção ao índio”.

“A gente percebe que houve uma complexidade em todo esse processo. A reintegração de posse, que foi decisão da justiça estadual, continua valendo. No entanto, no âmbito da Justiça Federal a discussão sobre os danos socioambientais, a necessidade de consulta prévia da comunidade vai ser feita de uma fora mais acurada. Para que garanta que uma eventual autorização do empreendimento não cause danos aos direitos dos indígenas.”

 


Mapas da região do Pico do Jaraguá / Brasil de Fato

Ocupação e luto

Desde o dia 30 de janeiro os guarani ocupam o terreno onde o empreendimento será construído em um ritual de luto pela flora e a fauna prejudicadas com a derrubada das árvores. A  Tenda entrou com pedido de reintegração de posse, que foi concedido pela justiça estadual. Os indígenas pedem que a Construtora permita a permanência deles no local até o próximo dia 23, quando se encerra o ciclo lunar dos rituais fúnebres. No entanto, a incorporadora não abriu mão da desocupação imediata.

Não queremos a posse da terra, mas a preservação da natureza. A gente vem lutando para isso.

Nesta quarta-feira (12), o assunto foi discutido no 49º Batalhão da Policia Militar Metropolitana, que atende a área. A reunião contou com a presença de representantes legais da empresa e das aldeias. Ao sair do encontro, o líder indígena Mateus Wêra afirmou que até a próxima sexta-feira (14) a comunidade vai decidir se deixa o local voluntariamente ou se vai manter os rituais.

A Polícia Militar se comprometeu a não implementar ações violentas ou truculentas, caso tenha que fazer a desocupação. Mateus lembra que a manifestação tem caráter pacífico desde o início.

“Nós estamos em luto. Fizemos a proposta de sair pacificamente, mas com tempo determinado. Nossa reza vai até o dia 23, quando a lua nova traz um novo ciclo. A Tenda nos propôs que fossemos ao local apenas uma vez por dia para fazer as rezas, mas nós gostaríamos que eles respeitassem o nosso luto e permanência na área. Nós respeitamos a decisão judicial. Temos consciência de que o que a Justiça manda deve ser feito. Mas pedimos apenas diálogo para respeitar nosso momento de luto. Até sexta-feira vamos definir se vamos continuar e resistir ou sair. Vamos conversar na comunidade, com diálogo. A última coisa que a gente quer é confronto. Não queremos a posse da terra, mas a preservação da natureza. A gente vem lutando para isso.”

A Secretaria do Verde e Meio Ambiente tem cinco dias úteis para prestar informações à justiça federal e a construtora também será intimada. O empreendimento no Pico do Jaraguá fica nas proximidades de uma área de preservação criada há quase meio século, uma das poucas áreas na cidade de São Paulo que ainda preservam fauna e flora nativa da mata atlântica.

Edição: Rodrigo Chagas