Diretoras, roteiristas, produtoras demonstram seu talento e sensibilidade, reconhecidos pelo público e crítica. A humanização de histórias, o resgate cuidadoso de dramas pessoais, a tragédia política recente do país, a desigualdade social focalizada com a sutileza do olhar feminino são colocadas em documentário ou ficção premiados dentro e fora do Brasil.
Uma das mais jovens é a diretora mineira Petra Costa, 36 anos, que concorreu ao Oscar em 2020 com o documentário Democracia em Vertigem. Lançado pela Netflix em junho de 2019, em 190 países, o filme narra em primeira pessoa o processo de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff e a ascensão dos discursos de extrema-direita que elegeram o presidente Jair Bolsonaro, que a atacou após a indicação.
“Como antropóloga, sentia um desconforto de não colocar a rachadura subjetiva pela qual eu estava enxergando a situação e minhas próprias contradições”, relata. Feminista e atriz desde os 16 anos, dirigiu ainda o curta “Olhos de Ressaca” (2009), e os premiados longas "Elena" (2012) e "Olmo e a gaivota" (2014). “Temo que nossa democracia tenha sido apenas um sonho efêmero”, observa.
Anna Muylaert, com Que horas ela volta (2015), também concorreu à indicação ao Oscar. Comoveu, ao explicitar os conflitos de uma empregada doméstica (Regina Casé) com os patrões de classe média alta e a relação com a filha. A jovem não apenas percebe a exploração, mas supera sua origem nordestina humilde com acesso ao ensino público superior, possível após a ascensão de governos de esquerda, sem que a diretora em nenhum momento tangencie o proselitismo.
Outra jovem cineasta é a jornalista Susanna Lira, 46 anos, com mais de 40 filmes. Torre das Donzelas (2015) é seu mais recente documentário, retratando a experiência de presas políticas no presídio Tiradentes, em São Paulo. “Foi uma aula de sororidade máxima, de troca, de acolhimento de uma para a outra. O filme é sobre resiliência de mulheres e um convite à resistência”, conclui.
As pioneiras
Muitas outras cineastas vieram antes abrindo caminhos, como Lucy Barreto, responsável pela produção de dois indicados ao Oscar, O Quatrilho e O Que É Isso, Companheiro?, além de outros clássicos como Terra em Transe, Bye Bye Brasil, Dona Flor e seus Dois Maridos. Ou Laís Bodanzky, com Bicho de Sete Cabeças. Lúcia Murat levou às telas a traumática experiência da prisão e tortura na ditadura em várias de suas produções. Há décadas Tata Amaral faz filmes sobre mulheres, como o premiado Um Céu de Estrelas (1997).
No RS, a diretora Tetê Moraes filmou os premiados documentários Terra para Rose e O Sonho de Rose, centrados na ocupação da fazenda Annoni nos anos 1980. Também no estado temos o recente Central (2017), uma visão humanitária da diretora Tatiana Sagger sobre o caos do sistema carcerário. Da nova geração de cineastas, Daniela Sallet produziu um inestimável documentário sobre as pioneiras agroecologistas gaúchas Magda Renner e Giselda Casttro, em Substantivo Feminino (2018). Outras gaúchas são pilares do bom cinema, como Ana Luiza Azevedo, uma das que sustenta a qualidade da Casa de Cinema desde 1987.
Com toda a sua subjetividade e determinação, as mulheres têm feito toda a diferença na forma e no conteúdo da produção cinematográfica. O mundo aplaude no cinema o que o elogio da cegueira propagado pela televisão, turva a visão sobre a trágica realidade nacional. Mais um motivo para o atual governo querer asfixiar o cinema brasileiro.
Fonte: BdF Rio Grande do Sul
Edição: Katia Marko