Neste domingo (22) é celebrado o Dia Mundial da Água. A data foi instituída em 1993, pela Organização das Nações Unidas (ONU), como forma de marcar a importância desse recurso natural e para incentivar sua preservação. Hoje, 27 anos depois, devido a uma pandemia global, a água ganha ainda mais protagonismo na vida humana. É um elemento fundamental na contenção do coronavírus, que se alastra com enorme velocidade em todo o planeta. Mas a água não é um bem acessível regularmente para todos os brasileiros.
Não se pode lavar as mãos diante dessa realidade que tem uma vítima preferencial: quem vive a pobreza.
Desde o final do ano passado, quando surgiu na China, o vírus veio gerando discussão e mobilização de toda a comunidade internacional. Com a confirmação de sua chegada ao Brasil, no final de fevereiro, e os subsequentes anúncios de vítimas fatais da covid-19, doença que acomete as pessoas infectadas, se intensificaram as campanhas e as medidas para contenção da pandemia no país. Dentre as orientações mais básicas e eficazes para que os cidadãos não sejam afetados por ela estão: lavar as mãos com frequência, usar álcool 70% e evitar aglomerações.
Ocorre que vivemos em uma sociedade capitalista extremamente desigual. E à parte significativa da população brasileira são negados os recursos mais básicos. Muitas favelas lidam desde sua fundação com os desafios impostos pela escassez ou falta completa de água. Por esse e outros motivos - como a necessidade de se manter trabalhando por exemplo -, neste momento de crise, as pessoas que habitam esses territórios se encontram muito mais vulneráveis.
A pandemia, assim como outras calamidades, coloca em xeque nossa humanidade.
Uma sociedade que pouco ou nada percebe a pulsação de vida nas favelas e periferias terá que ser capaz de se reinventar coletivamente, voltando seus esforços para essas comunidades.
Campanhas físicas ou digitais, doações, projetos de lei. Até agora essas iniciativas estão sendo tomadas por quem sempre as capitaneou: movimentos de moradores, algumas e alguns parlamentares de esquerda e ONGs. Mas é preciso muito mais. É preciso que a população como um todo compreenda que garantir todas as vidas é tarefa elementar para a construção de uma sociedade saudável, física e emocionalmente, e segura.
Jovens moradores estão arrecadando fundos para produzir faixas de conscientização e as estenderem nas ruas e vielas de suas favelas. Essa mesma juventude e algumas organizações estão lançando campanhas para a distribuição de alimentos e produtos que o capitalismo deixa mais caros em momentos de dificuldades. Há ainda o projeto de lei, elaborado por nós na Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj), que obriga as distribuidoras hídricas a estabelecerem meios alternativos de efetuar o abastecimento de água onde não há o fornecimento regular ou existem falhas.
Muitas ações estão em curso. E você? Está com esse tema no topo de suas prioridades? É preciso seguir divulgando e colaborando com essas iniciativas.
Mas é possível ir além: precisamos cobrar as autoridades, principalmente um presidente que nega uma realidade que se impõe de maneira evidentemente dura e preocupante.
A favela e a periferia não têm escolha, elas buscam sobreviver todos os dias, não só nesse momento de pandemia de covid-19. Por isso sua população continua a sair cotidianamente para buscar o seu ganha-pão, a prioridade é manter-se vivo, mesmo que pra isso seja necessário arriscar a própria vida. Os governos precisam olhar para os habitantes dessas localidades de maneira diferenciada, pois nelas as necessidades já são muitas no dia a dia. E agora só vão aumentar.
Neste domingo, um 22 de março de calamidade, se faz necessário relembrar a Lei 9.433, conhecida como Lei das Águas do Brasil. Ela que, no seu artigo 1, inciso III, afirma que em situações de escassez, o uso prioritário dos recursos hídricos é o consumo humano, e o seu artigo 2, inciso I, determina que são objetivos da Política Nacional de Recursos Hídricos assegurar à atual e às futuras gerações a necessária disponibilidade de água, em padrões de qualidade adequados. Se não houver empenho para que essa lei seja cumprida, sabemos qual será o trágico resultado. Que o dia da água num momento como este possa lembrar aos governantes a importância desse bem comum para toda vida humana, conforme prevê a Resolução A/RES/64/292. Água limpa e segura e saneamento básico são direitos humanos.
*Renata Souza é jornalista e deputada estadual no Rio de Janeiro.
**Rejany Ferreira é geógrafa, componente do Observatório da Bacia Hidrográfica do Canal do Cunha.
Edição: Mariana Pitasse