Dos 30 casos confirmados de coronavírus em todo o estado de Roraima, Boa Vista registrou 24 deles. Mas, diferente do restante do país, apenas um dos casos é de pessoa com mais de 60 anos. O pico de confirmações se deu entre pessoas de 20 a 39 anos, mas também há registros em dois bebês de um ano e uma criança de dois anos.
Entre os infectados, dois estão internados em estado grave na UTI - um senhor de 60 anos com histórico de doenças e um homem de 48 anos. Outras duas pessoas também estão internadas, mas estáveis. Segundo o último censo do IBGE de 2010, a maior parte da população de Roraima tem entre 10 e 39 anos.
Em entrevista ao Brasil de Fato, a prefeita de Boa Vista, Teresa Surita (MDB), afirma que o momento pede a colaboração de todas e todos para que o vírus não se prolifere ainda mais, já que a cidade já tem casos de contaminação comunitária. Ela afirmou que todas as medidas para evitar o contágio e oferecer assistência valem tanto para brasileiros quanto para venezuelanos, mas que até o momento nenhum imigrante foi contaminado.
Antecipando a crise, um decreto municipal foi publicado no último dia 20 de março suspendendo o funcionamento de bares, restaurantes, lanchonetes, balneários, parques aquáticos, clubes com piscinas e lagos e todas as atividades nas quadras esportivas das praças públicas da cidade. Segundo a publicação, nem as luzes das praças serão acesas durante a noite e ficou proibida a permanência da população em calçadas e locais públicos.
A preocupação da prefeitura se dá em relação aos poucos leitos de UTI disponíveis no estado. Há apenas 30 leitos, sendo 10 para traumas, para mais de 600 mil habitantes. O Exército Brasileiro construiu um Hospital de Campanha em Boa Vista com capacidade para 1200 pessoas e, em poucos dias, a unidade deve entrar em funcionamento. A ideia é que todas as pessoas que necessitarem de internação sejam levadas para lá.
"Nós temos que trabalhar dia a dia, de acordo com as o número de infectados oficiais, mas sabemos que pode ser muito maior. Estamos pensando na projeção da projeção. Se for necessário fazer um decreto mais rígido, faremos. Estamos adotando as medidas recomendadas no mundo todo", explicou Teresa Surita.
Ela declarou que está muito preocupada porque depois do primeiro discurso em rede nacional do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e do decreto do governador do estado Antonio Denarium, do PSL, que flexibiliza o funcionamento dos comércios, muitas pessoas voltaram a transitar pela cidade.
"Não podemos levar uma situação tão dramática pro lado político. Eu sou contra o que o presidente e o governador do estado colocam. A carreata foi um erro. Isso fez com que a cidade começasse a ter um outro comportamento", explicou a prefeita que se posiciona a favor do isolamento social para conter o avanço da doença.
Eu sou a favor do isolamento social, não porque eu não estou preocupada com a economia, mas como prefeita eu preciso me preocupar com salvar vidas. E cobrar do Estado ajuda pra salvar o município. Eu não posso ir contra a OMS e o Ministério da Saúde, seria muita irresponsabilidade
Desde a última segunda-feira (23), equipes realizam vistorias pela cidade para fechar todos os estabelecimentos que não sejam de serviços emergenciais. Participam das ações Procon Municipal, Secretaria Municipal de Planejamento e Finanças, Vigilância Sanitária e Guarda Municipal.
Na primeira fiscalização, mais de dez estabelecimentos foram fechados, entre oficinas de moto, salão de beleza e lojas de confecções. A população também está proibida de se reunir em espaços públicos.
No último dia 27 de março, Denarium anunciou alterações no decreto permitindo que comércios funcionem com sistema de retirada ou delivery, medida parecida com a já anunciada pela prefeitura.
Mas uma pequena diferença entre os decretos pode colocar todo o estado em risco, já que o governador não fez nenhuma restrição sobre quais tipos de comércio, aumentando assim consideravelmente o número de pessoas nas ruas e em transportes públicos.
Por mais que os empresários não entendam, primeiro precisamos salvar vidas. E precisamos trabalhar melhor a difusão de informações, porque o povo fica confuso quando município, estado e governo federal dão direcionamentos diferentes. Precisamos melhorar a nossa comunicação porque estamos tendo dificuldade de manter o controle com tantas versões
Boa Vista perdeu 35 médicos que faziam parte do programa Mais Médicos e enfrenta hoje o déficit desses profissionais. A rede municipal atende crianças até os 12 anos e adolescentes até os 16 na questão ambulatorial. Para auxiliar o atendimento à população, a Prefeitura de Boa Vista convocou 237 profissionais da saúde para reforçar o combate ao coronavírus.
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Para Teresa Surita há uma demora muito grande na confirmação dos casos de coronavírus na cidade. Ela diz que estão fazendo as coletas, mas que os resultados levam muitos dias para chegar, o que faz com que a prefeitura "trabalhe no escuro".
"Por mais que a população não esteja respeitando tão seriamente o decreto, segundo a Vigilância Sanitária ainda estamos conseguindo segurar o contágio com as medidas preventivas", afirma.
O Comitê Municipal de Combate ao Coronavírus, criado há 15 dias, discute diariamente as medidas para a população mais vulnerável - pessoas em situação de rua, trabalhadores informais, pequenos empresários. "Nós somos a prefeitura mais pobre de capital do Brasil, estamos com recursos limitados. Temos consciência que não podemos ajudar com recursos financeiros para o povo, por isso dependemos da ajuda do Estado e do governo federal", completa Surita.
Para a prefeita, é necessário que a Renda Básica Emergencial de R$ 600 sancionada na última quarta-feira (1) e oficializada 24h depois no Diário Oficial da União, seja direcionada o quanto antes para essa população.
"Eu estou muito preocupada mesmo. Eu gostaria de ter mais clareza dos números e gostaria de ver também uma velocidade maior no apoio econômico do governo federal, completa Surita.
Serviço
O consumidor que deparar com algum caso de descumprimento do decreto ou ainda valor de produtos ou serviços relacionados ao novo coronavírus, que considere abusivo, poderá registrar denúncia, de forma anônima, pelo e-mail do Procon pelo e-mail [email protected] ou pelos telefones: (95) 3625-2219, (95) 3625-2214, (95) 3625-3477 e (95) 3625-6201.
Edição: Leandro Melito