A Defensoria Pública do Estado de São Paulo ingressou nesta terça-feira (7) com ação civil pública pela manutenção da unidade II de Atendimento Diário Emergencial (Atende). A unidade fica na Rua Helvétia, área conhecida como Cracolândia no bairro de Campos Elíseos, região central da capital.
Os defensores que assinam a ação apontam o estado de São Paulo como epicentro da disseminação do coronavírus no Brasil, o que levou a medidas como a declaração de emergência na capital em 16 de março pelo prefeito Bruno Covas (PSDB). Quatro dias depois, o governador João Doria (PSDB) declarou estado de calamidade.
Criado no âmbito do programa Redenção, o serviço oferece atendimento multidisciplinar destinado ao acolhimento de pessoas em situação de rua e em uso de substâncias psicoativas. Articulado com a rede setorial e intersetorial, principalmente a atenção psicossocial, possibilita alternativas de enfrentamento à dependência química.
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“É fato notório que a situação é grave e exige medidas de saúde e assistência social. Por outro lado, a gravidade do problema exige que o poder público não tome, neste momento, medidas que possam aprofundar problemas, conflitos e feridas sociais já existentes – os esforços devem ser de apaziguamento social e acolhimento, em especial das populações mais vulneráveis”, anotam os defensores públicos.
Por essa razão, na ação eles pedem a suspensão imediata de qualquer medida que vise ao fechamento do serviço até o fim da emergência decorrente da pandemia de covid-19 e a manutenção de, no mínimo, os serviços voltados às necessidades básicas e primárias de acesso à água, banheiro, distribuição de kits de higiene e alimentação no local.
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Pedem ainda a elaboração de um plano específico para atendimento de pessoas em situação de rua durante a epidemia na cena de uso localizada na região da Luz, conhecida como Cracolândia, prevendo incremento nas estratégias de redução de danos para pessoas em uso abusivo de drogas e com doenças infectocontagiosas já adquiridas.
Irresponsabilidade
O plano, que deverá ser acompanhado de informações sobre as medidas que estão sendo tomadas, deve ser apresentado em juízo no prazo de cinco dias, inclusive indicando fontes legislativas e bibliográficas relacionadas às medidas eleitas.
O objetivo é determinar que seja assegurado e intensificado o acesso à alimentação, equipamentos sanitários e de prevenção de doenças. E qualquer outra medida destinada à minoração dos riscos provenientes da pandemia para a população em situação de rua na região.
O vice-presidente do Conselho Nacional dos Direitos Humanos (CNDH), Leonardo Pinho, avalia como “irresponsabilidade” do poder público o fechamento do serviço. “O Atende II está em meio à ausência completa de serviços públicos e de estratégias de promoção dos direitos daquelas pessoas", afirma.
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Informalmente, chega ao CNDH a informação de que a gestão teme pela aglomeração nas imediações do Atende II e não o considera um serviço essencial.
“O serviço prestado é essencial. Quem conhece a região sabe que o Atende é fundamental e tem tudo para ser um serviço de prevenção, um local onde a população em situação de rua pode ter acesso à higiene, alimentação e orientações. Em vez de ser fechado, tinha de ser transformado em linha de frente para lidar com a pandemia que tem nessa população um grupo de risco”, disse Pinho.
Medida higienista
Para o médico psiquiatra Flávio Falcone, palhaço e ativista por direitos humanos no Coletivo A Craco Resiste, a intenção da gestão Bruno Covas é mais uma tentativa higienista na região.
“É obvio que essa aglomeração não vai se resolver com essa medida, que ao meu ver visa a pressionar a população a sair dali. É uma medida tomada por alguém que não conhece a realidade dali. Todas as tentativas anteriores de expulsar as pessoas dali falharam. E novamente vai ter violência, a PM e a GCM estarão lá”, afirma Falcone.
Segundo ele, o Recomeço vai ser o único equipamento público. “É mais redução da oferta de serviços. O número de banhos reduziu nesse começo de crise no Recomeço. Trata-se de mais uma medida higienista”, ressalta.
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Morador da região, o ativista considera “descabida” a atitude da prefeitura. “Do ponto de vista sanitário é um desserviço a uma população que não tem condições de fazer o isolamento social porque não tem casa. O Atende II tem problemas, que a gente sabe que tem, por todo o sucateamento do serviço que foi feito desde a entrada da gestão do PSDB, mas é ainda um recurso que as pessoas têm para lavar a mão, para lavar roupa, para abrigo, para alimentação. Então não são só as pessoas que dormem no Atende que serão prejudicadas – ali é também albergue. Serão prejudicados todos os usuários que frequentavam e usufruíam do serviço”.
Procurada pela reportagem, a prefeitura de São Paulo não se manifestou.