Recentemente, a partir da interpretação de um gráfico do livro “Mitigating the covid economic crisis: act fast and do whatever it takes”, o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, defendeu a tese de que o isolamento social irá aprofundar a recessão. O pensamento difere do que preconiza um dos autores da obra, o economista americano Richard Baldwin.
Em entrevista à BBC, Baldwin afirmou que “se você não implementa quarentena porque quer economizar dinheiro, isso é uma questão moral, não econômica.” E foi assim, em meio ao escandaloso conflito entre salvar vidas ou a economia, que o então Ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta foi demitido nesta última quinta-feira, 16 de abril. Sua saída da pasta deixou o país sob tensão.
Diante da maior pandemia vivida desde 1918 – quando se proliferou a chamada gripe espanhola -, a população se encontra, literalmente, desorientada. Não bastasse o desconhecimento sobre a jovem doença, agora também não sabemos quais medidas de combate à Covid-19 serão adotadas daqui em diante, tampouco sabemos os interesses de quem está atualmente a frente das políticas de enfrentamento à doença.
Sim, temos muitas razões para nos preocupar, lembremo-nos que Mandetta foi deputado federal do DEM. Enquanto congressista, entre suas bandeiras de luta estavam a PEC do Teto dos Gastos, que retirou R$ 22,5 bilhões da saúde nos últimos 3 anos, e o fim do programa "Mais Médicos".
Percebam: Mandetta, atuando como deputado, defendeu os interesses da PEC da morte. Outrora, o médico no papel de Ministro, reivindicou verbas e mais profissionais de saúde para salvar vidas, visto que, com a aprovação da mesmíssima PEC, o SUS sofreu um desmonte brutal e apenas com tais medidas teríamos condições de enfrentar a pandemia.
A nova retórica não foi bem aceita. Ao que parece, não foi para agir tecnicamente que o representante dos interesses das corporações médicas e dos grupos privados de seguro de saúde foi indicado para o Ministério.
Todavia, Mandetta insistiu na orientação de isolamento horizontal, conforme a Organização Mundial de Saúde (OMS), o que contrariou os interesses econômicos do Governo. Resultado? Substituição do ator político por Nelson Teich, lobista do setor privado com total de zero experiência em saúde pública. Tamanho paradoxo evidencia o quão fantasioso e contraditório é o tal do capitalismo mais humano.
Teich, em seu primeiro discurso como novo chefe da pasta, demonstrou completo alinhamento com Bolsonaro: frisou que saúde e economia se complementam, justificando a corrida pelo retorno à normalidade. O presidente, por sua vez, chegou a falar em reabrir o comércio e em criação de projeto de lei para redefinir os considerados “serviços essenciais”, setores econômicos que não podem parar durante a pandemia.
E é no meio da cultura do obscurantismo que o Bolsonavírus age: apropriando-se do senso comum e multiplicando pós-verdades apoiadas nas necessidades mais básicas das pessoas, provocando, assim, cegueira e confusão mental.
Lamentavelmente, nosso país sofre com duas doenças nesse momento. Ambas, atingirão as camadas sociais de formas diferentes, segundo um recorte de gênero, raça e classe. No Brasil, em diversas comunidades – rurais e urbanas – os desafios vão desde a falta de abastecimento d’água até a impossibilidade de isolamento social, em decorrência da aglomeração característica das condições de moradia de muitos brasileiros.
Diante disso, torna-se ainda mais nítido o caráter neofascista do pior líder mundial no combate ao coronavírus, segundo o jornal americano Washington Post, um dos principais do mundo. Afinal de contas, quem envia seu povo para uma guerra perdida?
É imprescindível entender que se estamos em guerra pela vida (não pela morte), algumas táticas precisam ser tomadas, e adivinhem: elas não virão pelo bom senso do represente máximo do Estado.
Em contrapartida, me parece um momento oportuno para frisar o brilhante trabalho que as Universidades Públicas estão fazendo nessa pandemia, através de parcerias com as Secretarias de Saúde. As Universidades Federais estão realizando testes, produzindo EPI’s e desenvolvendo pesquisas para auxiliar a mesma sociedade, que até pouco tempo, apoiava o corte de milhares de bolsas de pesquisa e o do orçamento destinado a manter essas instituições de ensino.
Esse cenário nos afirma que diante das incertezas que o futuro reserva, principalmente, para nós, da classe trabalhadora, devemos enfrentar ambos os vírus com as armas que temos: ciência, solidariedade, saúde e educação públicas, organização popular. Foquemos nas nossas bandeiras de luta, elas são as mesmas de sempre. Passou da hora do Governo Bolsonaro ter limites. Todos esses que aí estão atravancando nosso caminho, eles passarão… e a história há de contar que, o povo salvou a si mesmo de uma pandemia e do primeiro presidente populicida¹ do Brasil. FIQUE EM CASA!
¹ O termo foi trazido da coluna Tribuna do jornal francês Libération, populicida é aquele que gera o homicídio em massa de forma voluntária e premeditada.
*Helena Antunes é engenheira, socióloga em formação e militante das Amélias: mulheres do projeto popular.