Desde o dia 31 de março, empregados da Amazon estão em greve para reivindicar melhores condições de trabalho durante a pandemia causada pelo novo coronavírus. De propriedade do homem mais rico do mundo, Jeff Bezos, a companhia é a vigésima oitava maior do planeta.
Os Estados Unidos são agora o epicentro do surto global com mais de 800 mil casos e 43 mil mortes confirmadas. Como ocorre na maioria dos países afetados, a falta de testes e o fato de as mortes não terem a causa identificada apontam para uma subnotificação da doença.
Duas empresas subsidiárias da multinacional, Instacart e Whole Foods, também foram afetadas por paralisações. Os trabalhadores estão pedindo mais equipamentos de proteção pessoal, assim como um aumento salarial por prestarem serviços de risco, além de quarentenas remuneradas para aqueles que eventualmente contraírem o vírus. Mais de 150 mil funcionários estão parados.
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Um dos organizadores da greve, Christopher Smalls, era o subgerente do centro de processamento da Amazon em Staten Island, na cidade de Nova Iorque, que reúne o maior número de casos no país. Ele foi demitido dias após o primeiro protesto. “Nem o setor de saúde tem equipamentos de proteção pessoal suficientes. O que te faz pensar que nós do varejo vamos ter? Nós não temos máscaras, nós não temos luvas, as pessoas estão com medo de vir trabalhar”, relata.
Smalls também afirma que, quando o primeiro caso confirmado surgiu no local de trabalho, o gerente do galpão pediu para que ele e outros administradores não contassem “nada aos empregados para não causar pânico”. Incrédulo diante do pedido, Christopher fez exatamente o oposto e alertou a todos que podia. "Eles têm o direito de saber”. Em sua carta anual aos acionistas publicada na última quinta feira (16) em formato de vídeo, a empresa contradiz esses relatos e insiste que todos seus trabalhadores estão com equipamentos de proteção pessoal adequados.
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Na visão de Kevin Gustafson, advogado e dirigente do movimento Democracy at Work, a pandemia da covid-19 é um bom momento para a classe trabalhadora se organizar e exercer seu poder na sociedade. Gustafson acredita que o que está ocorrendo na Amazon pode se espalhar para outros setores do mercado.
“O grande poder que um movimento de trabalhadores possui é mostrar o quão importantes são para o mercado financeiro através de paralisações, nas quais fica claro o impacto que a remoção [deles] tem na economia”.
Para o advogado, em uma situação atípica como uma pandemia global, essa força trabalhista fica ainda mais evidente. “Estamos num momento interessante no qual quase conseguimos visualizar como seria uma greve geral nos Estados Unidos”, aponta o advogado. A última greve geral estadunidense ocorreu em 1919, logo após a Primeira Guerra Mundial e, coincidentemente, durante a última grande pandemia da história recente.
Embora mais de um século tenha se passado desde a gripe espanhola e da última paralisação em massa, pouco foi feito em termos de preparo para eventualidades como uma epidemia em nível mundial. “Nós sabemos há mais de cem anos que uma pandemia como a da gripe espanhola aconteceria de novo. Devíamos ter nos preparado para isso”, afirma Kevin Gustafson.
Apesar das tentativas do governo estadunidense de mitigar os danos causados pelo surto de coronavírus – recentemente um pacote de estímulo econômico de US$ 2 trilhões de dólares foi aprovado – a crise financeira decorrente expõe a fragilidade da economia do país. “O coronavírus está expondo a fragilidade e a fraqueza da nossa economia, especialmente a economia pós 2008”, aponta Gustafson.
Ironicamente, a Amazon desfruta de lucros recordes em meio a pandemia, devido ao crescimento do comércio on-line. O dono da empresa, Jeff Bezos, aumentou sua fortuna em US$ 24 bilhões de dólares desde o início do surto. Trabalhadores como os do centro de processamento em Nova Iorque estão arriscando suas vidas para que isso aconteça.
Diante da visível injustiça, sentimentos de urgência e solidariedade naturalmente florescem entre os funcionários, que não têm outra opção a não ser entrar em greve. Questionado os motivos que o fizeram decidir pela paralisação no seu galpão em Staten Island, o ex-subgerente Chris Smalls declarou: “Por causa das pessoas".
"Eu vi pessoas adoecendo semanalmente e eles são minha família, passamos de 40 a 50 horas por semana juntos. Queria dar a eles uma voz, uma plataforma onde possam ser ouvidos. Isso foi um grito por ajuda”. Procurada pelo Brasil de Fato, a Amazon não respondeu aos questionamentos até a publicação desta reportagem.
*Com informações do The Grayzone.
Edição: Camila Maciel