Um dia após o vazamento de gás tóxico de uma fábrica da LG matar 12 pessoas, a Índia amanheceu nesta sexta-feira (8) com outra notícia trágica. Às 5h22, um trem que transportava mercadorias atropelou e matou 16 trabalhadores migrantes. Eles pegaram no sono sobre os trilhos enquanto caminhavam de volta para suas casas, devido ao lockdown – bloqueio de atividades econômicas e da circulação de pessoas para impedir a disseminação do coronavírus.
O incidente ocorreu no distrito de Aurangabad, região oeste, a 260 km de Mumbai, uma das maiores cidades do país. A hipótese mais provável é que as vítimas não tenham sido informadas sobre a autorização para circulação de trens de carga. O transporte de passageiros está suspenso desde o final de março.
Os migrantes estavam a 850 km dos vilarejos de destino – em Umariya e Shahdol, no estado de Madhya Pradesh. Eles haviam percorrido 157 km a pé desde a última terça-feira (5), após serem demitidos no distrito de Jalna, estado de Maharashtra.
O Ministério das Ferrovias informou que o maquinista viu os trabalhadores deitados sobre os trilhos, mas não conseguiu frear o comboio a tempo. Os nomes e as profissões das vítimas não foram divulgados até o momento.
O primeiro-ministro Narendra Modi lamentou as mortes e disse que as famílias das vítimas serão indenizadas.
Problema crônico
Desde o início da quarentena, partidos e organizações sociais vêm denunciando o abandono do governo da Índia aos trabalhadores migrantes. Eles não foram avisados com antecedência de que o transporte entre municípios seria suspenso. Por isso, tiveram que voltar para casa caminhando, dormindo a céu aberto, expostos ao vírus e à fome e dependendo de doações para sobreviver.
A Rede por Direito à Terra e Moradia publicou na última terça-feira (5) um relatório de 25 páginas sobre as violações ocorridas na Índia durante o período de isolamento social. A expressão “migrantes” aparece 90 vezes no documento.
“Trabalhadores migrantes, devido à baixa renda, às proteções trabalhistas insuficientes e às condições de vida inadequadas, estão entre os mais severamente afetados pelo bloqueio repentino e prolongado. Na ausência de políticas sociais, a maioria morava improvisada em seus locais de trabalho, inclusive em fábricas, lojas, canteiros de obras e restaurantes. Portanto, ficavam desabrigadas quando o bloqueio foi anunciado”, relata a entidade.
Em 29 de abril e 1º de maio, o governo central publicou dois decretos com medidas de apoio para garantir o retorno dos migrantes às suas casas. “As medidas possuem inúmeras ressalvas e lacunas, que impedem a sua efetividade”, aponta o documento. Depois da publicação dos decretos, começaram a circular trens especiais gratuitos apenas para trabalhadores migrantes, mas o governo estima que levará semanas para transportar todos eles.
“Não há justificativa para os trabalhadores migrantes das cidades não terem sido avisados de que haveria bloqueios. Se eles precisavam voltar para seus vilarejos, eles deveriam poder fazer isso antes da quarentena”, afirmou Vikas Rawal, professor de Economia da Universidade Jawaharlal Nehru (JNU), na capital Nova Delhi, em entrevista ao canal indiano Newsclick.
A Índia tem 56,6 mil pacientes com o novo coronavírus e registrou 1,9 mil mortes por covid-19. O país segue em quarentena até o próximo dia 17, com regras diferenciadas para cada região conforme o número de casos.
Edição: Leandro Melito