As populações em situação de vulnerabilidade são as mais atingidas pela pandemia do novo coronavírus. Sabendo disso, o projeto "Perpetuar - Identidades, Ancestralidades e Territorialidades Quilombolas” está realizando a ação "Projeta o Quilombo", com distribuição de kits de higiene e informações para 120 famílias de uma comunidade quilombola do Moju, município do Pará.
Coordenadora do projeto Perpetuar, a quilombola e psicóloga Samilly Valadares explica que o cronograma de atividades regulares montado para o primeiro semestre de 2020 foi interrompido pela crise do novo coronavírus, o que fez surgir a campanha, em caráter emergencial. Para ela, a invisibilidade que tanto atinge as comunidades quilombolas apenas se tornou mais evidente com a pandemia.
"Nós enquanto projeto, enquanto quilombolas, voluntários nos sentimos na responsabilidade social de agir, de fazer alguma coisa pelas nossas comunidades e demarcar que vidas quilombolas importam. Então, com o apoio emergencial do Fundo Baobá e do grupo de Pesquisa em Desenvolvimento Rural e Inovação Sociotécnica, da Universidade Federal do Pará, nós lançamos a campanha Projeta o Quilombo, distribuímos kits de higiene de cuidado e prevenção para 120 famílias da comunidade. Construímos e distribuímos material informativo de forma contextualizada sobre a pandemia para que as nossas comunidades possam se defender".
Entre as ações, foram construídos kits de educação em saúde para as crianças da comunidade, contendo livrinho de colorir com historinhas, brincadeiras e explicação lúdica sobre a covid-19. O projeto também oferece atendimento psicológico gratuito para quem precisar. Esse atendimento é feito por ligação telefônica ou via chamada de vídeo.
A coordenadora denuncia que há um abandono do poder público e uma série de violações de direitos aos quilombolas, não apenas os que moram na comunidade Oxalá de Jacunday – beneficiada com o projeto, mas todas as 15 comunidades que compõem o Território Quilombola de Jambuaçu, em Moju.
"Há uma grande dificuldade de acesso à informação. Nós só temos internet, na comunidade, no wifi da escola e em algumas casas, e não tem assistência médica. O território quilombola é composto por 15 comunidades e tem apenas um posto de saúde, que fica na Comunidade das Graças, que não dá conta de atender a demanda do território todo. O médico vai apenas duas vezes por semana", diz ela.
Se, porventura, uma pessoa adoecer na comunidade, é preciso se deslocar ou para o município de Moju, a 40 quilômetros da comunidade; ou para Belém, a 80 quilômetros do território. Isso corresponde a mais ou menos uma hora e meia, por estrada, para chegar até Moju e até duas horas para chegar a Belém.
As distâncias não parecem tão grandes, mas há um agravante: o acesso é feito por meio da chamada Rodovia dos Quilombolas, que há tempos pede melhorias, porque é feita de piçarra (chão de terra batida). Quando chove, o tempo de deslocamento pode duplicar ou até triplicar.
Além disso, Samilly denuncia que a população do quilombo não está sendo testada. O quilombo de Jacunday possui cerca de 400 habitantes, com uma média de 120 famílias. Ele foi demarcado em 2002, ano em que a associação também foi fundada. Após muita luta, a titulação do território foi concedida em 2006.
Quem quiser colaborar com o projeto pode encontrar mais informações no perfil do grupo no Instagram ou entrar em contato pelo telefone (91) 98395-1076. "Quem quiser colaborar. Vidas quilombolas importam e nós estamos aqui na resistência. E cuidado é resistência, principalmente neste momento", diz ela.
Moju tem uma população estimada em mais de 82 mil pessoas. Segundo dados do Ministério da Saúde, até esta segunda-feira, 1º, o município tem 325 casos do novo coronavírus e 14 óbitos. Segundo a coordenadora do projeto várias pessoas na comunidade já tiveram os sintomas da doença, mas nenhuma foi testada.
As doações integram a primeira etapa da campanha, a próxima será de distribuição de cestas básicas. O coletivo visa o fortalecimento da identidade, territorialidade quilombola e ancestralidade negra e atua não só no Quilombo Oxalá de Jacunday, mas também nas periferias da capital paraense.
Edição: Camila Maciel