O presidente Jair Bolsonaro vetou o repasse de R$ 8,6 bilhões de um fundo administrado pelo Banco Central que, pelo projeto aprovado no Congresso Nacional, seriam repassados aos estados e municípios e seriam usados no combate à pandemia de coronavírus.
A sanção da lei e o veto foram publicados no Diário Oficial da União desta quarta-feira (3). A justificativa para o veto é que a verba deve ser utilizada como previsto na medida provisória originária para financiar a dívida pública.
Para o economista Guilherme Mello, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), o veto “não faz o menor sentido”. Como a Emenda Constitucional 10, chamada PEC do Orçamento de Guerra, promulgada pelo Congresso no início do mês, “acabou” com a meta fiscal, não deveria haver preocupação com aumento do déficit primário de 2020.
Mas, principalmente, o veto “não faz o menor sentido durante uma pandemia, quando a prioridade deveria ser o combate à doença e o reforço aos gastos em saúde, assistenciais, e uma série de outros gastos”.
O deputado Luís Miranda (DEM-DF), relator do texto na Câmara, acusou Bolsonaro de quebrar acordo assumido pelo governo.
“Houve acordo com o governo, a gente consultou o Ministério da Economia e o Banco Central. O líder do governo no Senado foi o relator da matéria quando chegou ao Senado”, disse ao site Congresso em Foco.
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), também comentou: “A informação que eu tinha dos deputados é que havia ocorrido um acordo para a destinação desse recurso”.
Base do Centrão
Do ponto de vista político, a derrubada do veto pelo Congresso, no atual cenário, é improvável. Para Antônio Augusto de Queiroz, diretor do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), o governo tem hoje no centrão uma base para lhe dar sustentação.
“Quando essa matéria for votada, dificilmente o Centrão vai acompanhar a posição da oposição de derrubada desse veto de Bolsonaro. Ao fazer isso, esses deputados estariam contrariando a política governamental e, em consequência, beneficiando uma visão de oposição”, analisa.
Outro motivo para duvidar da derrubada do veto é que o tema não tem grande apelo popular, já que esses R$ 8,6 bilhões seriam um recurso usado “difusamente” no enfrentamento da pandemia, por estados e municípios.
Para o analista do Diap, é mais fácil que o Congresso derrube o veto de Bolsonaro que congelou o reajuste de funcionários públicos, como professores, policiais e outras categorias, no contexto da proposta que criou a ajuda a estados e municípios no combate à covid-19.
“Esse veto tem mais chance de ser derrubado porque tem um apelo eleitoral muito forte. O centrão quer ocupar o mais rapidamente possível os cargos estratégicos. Ele vai se mostrar fiel em todo tema que não caracterize um prejuízo eleitoral irreversível, como pode ser o caso dos professores e policiais.”
O tema do veto desta quarta-feira, na avaliação de Queiroz, é mais técnico e não tem esse apelo eleitoral. “Até porque ele será apreciado mais para a frente, e quando isso for votado, esperamos, a pandemia já estará em fase mais descendente.”
Seja como for, para Guilherme Mello, o veto dos R$ 8,6 bilhões a estados e municípios tem “claramente um viés fiscalista” e o dedo do ministro da Economia, Paulo Guedes.
“No momento de uma pandemia, em que a gente está assumindo a liderança de mortes, com estados à beira da calamidade, empresas quebrando, ao invés de se preocupar em combater a pandemia, estão preocupados em recomprar a dívida pública, mesmo que isso signifique quase nenhuma redução da dívida”, diz o economista da Unicamp.