Democracia

Joanna Maranhão: “O esporte é uma coisa política querendo ou não”

Em entrevista, nadadora comenta mobilização política entre os atletas em defesa da democracia

Brasil de Fato | Recife (PE) |
Nadadora assina manifesto junto com mais 50 atletas e trabalhadores da área do esporte - CBDA

O grupo Esporte pela Democracia, formado por atletas, ex-atletas, jornalistas esportivos, comentaristas e árbitros lançou nessa semana um manifesto  em defesa dos direitos humanos, da liberdade de imprensa, da diversidade e de outros valores democráticos. Em entrevista ao Brasil de Fato PE, uma das organizadoras do movimento, a nadadora e medalhista olímpica Joanna Maranhão, atual gerente da Secretaria de Turismo, Esportes e Lazer da Prefeitura de Recife destacou que é impossível dissociar o esporte da luta política.

"Está na Constituição, esporte é uma coisa política querendo ou não, por mais que se tente dissociar", aponta Joanna.

Confira na íntegra.

Brasil de Fato PE - Qual foi o objetivo do grupo "Esporte pela Democracia" em publicar um manifesto em defesa dos Direitos Humanos, Liberdade de Imprensa, diversidade e valores democráticos?

Joanna Maranhão - É um movimento em defesa da democracia que iniciou pelo esporte. Isso é muito significativo. Começou por um grupo de atletas, ex atletas e se expandiu e começou a ter adesão de pessoas de outras áreas da cultura - arte, música, cinema - jornalistas esportivos, políticos. Existe um denominador comum que é a defesa da democracia. O manifesto é o denominador comum. A gente não estava esperando que teria uma adesão tão grande assim. Acho que mostra muito desse descontentamento geral e como é importante esse tipo de mobilização. Todas as mobilizações são importantes, bem-vindas e é isso que faz a democracia.

Qual a importância de atletas que são referências nacionais e internacionais como vocês se posicionarem nesse momento, especialmente diante dos movimentos que tem exigido a valorização das vidas pretas no Brasil e no mundo?

Quando alguma pessoa pública se coloca, ela mobiliza de alguma maneira. Todo mundo influencia em menor ou em maior grau, mas as pessoas que são públicas conseguem influenciar numa numa escala maior e essa é a importância em relação à negritude.

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Não é o meu lugar de fala, o máximo que eu posso dizer no lugar enquanto pessoa mestiça que não sofre racismo é que eu preciso repensar as minhas atitudes. Todas elas. Dentro do meu trabalho, quantas pessoas pretas estão ali no mesmo lugar, no mesmo ambiente? E no meu cotidiano? Eu penso muito no meu filho, quais são as referências de pessoas pretas que ele vai ter? Ele vai ter o pai, o avô paterno, que mais? Na literatura, nas coisas que a gente consome. Estamos consumindo produtos de empresas de pessoas pretas? Isso é algo que eu estou começando a refletir já há alguns anos.

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Venho pensando também na questão da terminologia. Eu achava o termo mulata lindo. Eu achava que era elogio quando alguém me chamava de mulata, achava bonito, suave. E aí quando você vai ver a origem daquele termo, entre outros, como criado mudo, meia tigela, descobrimos que constantemente os termos que a gente usa, as piadas que a gente faz são de apagamento histórico e de ofensa.

Como você entende o papel do esporte na luta pela democracia?

Tenho repetido que são coisas indissociáveis. Não tem como você dissociar esporte de democracia. Em um país que tem uma cultura esportiva, não necessariamente sendo uma potência olímpica, você precisa de políticas públicas pra chegar nesse lugar. Está na Constituição, esporte é uma coisa política querendo ou não, por mais que se tente dissociar.

Isso acontece muito porque existe essa falsa impressão de que o esporte é o rendimento ou os atletas - porque esse espaço é muito voltado para atletas. E aí a gente resume o que é esporte a esse grupo de pessoas que é muito importante. Como é que você vai quantificar o alcance da medalha de ouro olímpica da Rafaela Silva? Você não consegue. Tem um alcance gigantesco, mas só que o judô não se resume à Rafa. Ela tem uma importância crucial enquanto atleta de rendimento, enquanto mulher preta. Mas o esporte existe para além disso. E eu acho que é essa a questão que a gente precisa pensar dentro do nosso país.

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Tudo que foi feito de política pública de esporte foi voltado para alto rendimento, pouco ou quase nada é pensado em relação ao esporte escolar, ao debate do que é a educação física na escola e sua importância, de lazer também. A gente fala muito pouco sobre isso. Então esse debate precisa ser feito também.

Fonte: BdF Pernambuco

Edição: Vanessa Gonzaga e Raquel Júnia