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O inquérito das fake news: o xadrez entre o STF e Bolsonaro

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Alexandre de Moraes tem dito que as provas apontam para a real possibilidade de associação criminosa envolvendo o chamado gabinete do ódio - José Cruz/Agência Brasil
As peças se movem no tabuleiro e por ora os homens de toga seguem avançando no território do Rei

Em meio ao pandemônio que se estabelece nas relações entre o Poder Executivo e o Poder Judiciário, o Supremo Tribunal Federal (STF)  julga nesta quarta-feira a Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental – ADPF 572, ajuizada pelo partido Rede Sustentabilidade, em que contesta a portaria do Supremo Tribunal Federal (STF), que determinou a abertura de inquérito para investigar notícias fraudulentas (fake news), falsas comunicações de crimes, denunciações caluniosas, ofensas e ameaças a ministros da Corte.

Na dinâmica da judicialização da política, como polos opostos do mesmo debate, os atores invertem os papéis.

O partido Rede Sustentabilidade, que tão efusivamente pediu a nulidade do Inquérito 4.781 em 2019, comparando-o ao Ato Institucional nº 5 - o mais pesado golpe da ditadura civil-militar às garantias constitucionais, que instaurou a censura, proibiu manifestações políticas e fechou o Congresso Nacional - agora pediu desistência do feito no último dia 29 de maio, asseverando que “se, em seu nascedouro, o inquérito, ao que indica a mídia, apresentava inquietantes indícios antidemocráticos, um ano depois ele se converteu em um dos principais instrumentos de defesa da Democracia e da lisura do processo eleitoral”.

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O ministro Edson Fachin negou o pedido fundamentando não ser possível desistência de ação de controle concentrado.

Por seu turno, Augusto Aras, o Procurador-Geral da República que, em outubro de 2019 havia afirmado que o presidente do STF, Dias Toffoli, “exerceu regularmente as atribuições que lhe foram concedidas pelo Regimento Interno da Corte”, agora pede a suspensão da investigação, feita no curso da ADPF 572, após as buscas e apreensões determinadas pelo ministro Alexandre de Moraes e cumpridas pela Polícia Federal no dia 27 de maio, que atingiu vários aliados de Jair Bolsonaro, incluindo empresários, blogueiros e oito deputados intimados a depor.

O Inquérito 4.781 teve início em março de 2019, de ofício, pelo presidente do STF, Dias Toffoli, que designou como relator o ministro Alexandre de Moraes, com base no art. 43, do Regimento Interno do STF.

“Ocorrendo infração à lei penal na sede ou dependência do Tribunal, o presidente instaurará inquérito, se envolver autoridade ou pessoa sujeita à sua jurisdição, ou delegará esta atribuição a outro ministro.

§ 1º Nos demais casos, o presidente poderá proceder na forma deste artigo ou requisitar a instauração de inquérito à autoridade competente.”

Desde o primeiro momento houve um grande debate acerca da competência do STF para instaurar inquérito de ofício. O parecer da então Procuradora-Geral da República, Raquel Dodge, afirmava a ilegalidade do procedimento, por não ter sido provocado por instituições como a Polícia Federal ou o Ministério Público. Houve, ainda, questionamentos quanto à designação de relator sem sorteio. O inquérito, contudo, prosseguiu.

No mês de março de 2020, técnicos do STF identificaram perfis em redes sociais que atuam na disseminação de informações de forma padronizada contra ministros do Tribunal.

No julgamento desta quarta, os ministros devem decidir se o inquérito tem validade, mas podem fazer algumas ponderações sobre a participação do Ministério Público. O ministro Alexandre de Moraes tem dito que as provas apontam para a real possibilidade de associação criminosa envolvendo o chamado gabinete do ódio.

Após a suspensão, com o pedido de vista de Alexandre de Moraes, da votação de duas Ações de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE) no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) nesta terça-feira (09), a chapa de Bolsonaro com o Judiciário esquenta ainda mais e indica que não haverá facilidade para escapar das investigações e julgamentos.

Foram contabilizados três votos para que seja produzida nova perícia criminal no caso de fraude virtual, com a invasão e apropriação de uma página do Facebook durante as eleições de 2018, nos termos do voto do ministro Edson Fachin, e dois contrários. 

O compartilhamento de provas do Inquérito 4.781, com as demais ações no TSE que acusam a campanha do presidente de uso indevido de meios de comunicação digitais no disparo em massa de mensagens no WhatsApp, que já conta com parecer favorável do Ministério Público Eleitoral (MPE), caso aceito pelo relator, possui combustível explosivo, com consequências difíceis de prever no plano político.

Se forem provas suficientes no Inquérito conduzido no STF para caracterizar crimes, demonstrando a origem do financiamento das práticas abusivas e ilegais imputadas à campanha de Bolsonaro e Mourão, acarretam a nulidade da eleição pelo TSE.

As peças se movem no tabuleiro e por ora os homens de toga seguem avançando no território do Rei. O julgamento da validade do Inquérito 4.781 no plenário do STF será um momento importante para observação da estratégia e do sentimento do coletivo. Fundamental para saber se seu objetivo, de fato, é um “xeque mate”, quando a hora chegar.

Edição: Leandro Melito