Brasil agroecológico

Conheça a história do professor canadense que viajou 9 mil km para conhecer o MST

"A natureza não é um sistema mecânico, é um sistema de autodeterminação como nós"

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Pesquisador destaca a relação entre humanos e o meio ambiente - Gabriel Bicho/MST
"A natureza não é um sistema mecânico, é um sistema de autodeterminação como nós"

O professor canadense Bruce Gilbert leciona no Departamento de Filosofia da Bishop’s University, localizada próxima à cidade de Montreal. As suas áreas de pesquisas são filosofia dialética, sociedade, política, ecologia e religião. São variadas, mas nada além que muitos dos seus colegas também se envolvem. O que realmente chama atenção no currículo de Bruce são seus trabalhos acadêmicos com o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e a Comissão Pastoral da Terra (CPT).

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A conexão Canadá-Brasil aconteceu por conta de estudar os direitos da natureza e os conceitos sobre propriedades rurais. Foi assim que Bruce visitou assentamentos brasileiros, conheceu a Escola Latino-americana de Agroecologia, no Assentamento Contestado, no município paranaense da Lapa, e até participou de formação do MST na Escola Nacional Florestan Fernandes, em Guararema, no Estado de São Paulo.

Diferente do Brasil, aqui no Canadá não temos esses grandes movimentos sociais que têm esse compromisso. É por isso que os movimentos sociais no Brasil são uma inspiração não somente para mim, mas também para todo o mundo

Para o professor, os desafios que envolvem uma efetivação dos direitos da natureza ou um conceito mais adequado sobre uso de propriedades rurais encontram propostas na Agroecologia e pela cosmovisão dos povos indígenas e comunidades tradicionais. Ele explica que é preciso darmos alguns passos para superar a agricultura clássica que explora tantos as pessoas quanto o meio ambiente.      

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“Para mostrarmos que a natureza não é um sistema mecânico, é um sistema de autodeterminação como nós. Tem diferenças, claro, entre a natureza e os seres humanos. Mas essas diferenças não são tão grandes como um dualismo. Pior ainda é que esse dualismo entre nós, seres humanos livres, e a natureza mecânica, nos dá o direito de explorar a natureza por ser algo mecânico”, analisa.   

Esse dualismo que relata Bruce pode ser responsável por gerar pensamentos extremamente preconceituosos pela sociedade. Por exemplo, a visão que povos mais próximos à natureza são erroneamente vistos como inferiores, mesmo que seus saberes sirvam de lição para todo o planeta. 

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Bruce Gilbert ressalta que tanto no Canadá quanto no Brasil ainda se comete o equívoco de uma visão romantizada da preservação da natureza sem a inclusão os povos que tradicionalmente vivem nos seus ambientes. É como se esse dualismo apagasse nossa importante relação com as outras formas de natureza.  

É defendendo essa visão mais integrada entre humanos e meio ambiente que Bruce questiona também o uso da terra no Brasil e em outros lugares do mundo. As experiências coletivas de assentamentos no Brasil, na perspectiva agroecológica, apontam uma relação mais próxima com os direitos da natureza e com a justiça social. O professor também ressalta como positivos os casos da Bolívia e do Equador, que inseriram a importância da "mãe terra" em suas constituições federais. 

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“Para mim, os movimentos sociais no Brasil que usam Agroecologia estão tentando eliminar as duas formas de dominação e  exploração. A exploração dos seres humanos sobre os outros e também a exploração e dominação da natureza. Aqui no Canadá não é difícil encontrar pessoas que também querem confrontar essas duas formas de dominação, que têm o compromisso de trabalhar de trabalhar pela justiça nos dois sentidos. Mas diferente do Brasil, aqui no Canadá não temos esses grandes movimentos sociais que têm esse compromisso. É por isso que os movimentos sociais no Brasil são uma inspiração não somente para mim, mas também para todo o mundo”, ressalta.

É neste cenário de desafios que os movimentos populares do campo no Brasil permanecem suas lutas, ligando um passado de opressão colonial com uma esperança de futuro, livre das destruições e explorações apontadas por Bruce Gilbert. 

 

Edição: Lucas Weber