Precariedade

Covid: metade dos municípios da Ilha de Marajó estão próximos do colapso hospitalar

Região soma quase 200 mortos e mais de 3 mil contaminados por covid; dos 16 municípios somente cinco têm respiradores

Belém (PA) | Brasil de Fato |

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Paciente com covid-19 sendo transportado de helicóptero de Breves, no Marajó, para ser tratado em Belém. - Tarso Sarraf/AFP

O aumento dos casos de contaminação e mortes por covid-19 no arquipélago de Marajó (PA) durante o mês de maio acendeu o alerta em organizações locais sobre a capacidade do sistema de saúde dos municípios da ilha em atender a população.

Estudo coordenado pela pesquisadora Ima Célia Guimarães Vieira trouxe um panorama da covid-19 nos municípios do Marajó.

Segundo levantamento até o final de maio foram registrados mais de 3 mil casos confirmados da doença na ilha e 200 mortes."O atual cenário no Marajó em relação á covid-19 é muito preocupante. O número de pessoas infectadas nos municípios aumentou muito no mês de maio e já são 3 mil pessoas com casos confirmados e morreram cerca de 200 pessoas. A estrutura hospitalar no Marajó é muito precária e 50% do municípios marajoaras estão desta próximo do limite hospitalar. A taxa de letalidade pelo coronavírus tem aumentado muito nessa região e em alguns municípios chega a 16% como em Cachoeira do Arari, onde não há respiradores e o número de mortes é 17 vezes maior do que o mesmo período do ano passado", aponta a pesquisadora.

Dos 16 municípios, Breves e Portel são os que têm portos muito ativos e por consequência foram os que registraram maior número de casos da covid-19 e também de óbitos. Segundos dados da Secretaria de Estado de Saúde (Sespa), até esta sexta-feira, (12), Breves registra 769 casos confirmados e 64 óbitos e Portel, 531 casos confirmados e 32 óbitos.

O arquipélago do Marajó, no Pará, tem 10,4 milhões de hectares e uma população de 564 mil habitantes, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2019. Considerado o maior arquipélago fluviomarinho do mundo, a região é formada por 16 municípios paraenses.

Apesar de ser rico em recursos hídricos e biológicos, a população enfrenta uma série de dificuldades, como baixos índices de desenvolvimento humano e a falta de acesso à água de qualidade e saneamento básico. Com o avanço do coronavírus na região, a preocupação é com a falta de estrutura para lidar com a covid-19. Dos 16 municípios, apenas, cinco têm respiradores de acordo com dados do Sistema de Informações do Sistema Único de Saúde (Datasus). 

Ainda segundo o Datasus, a região possui apenas 50 médicos. Entre os 16 municípios, apenas cinco possuem respiradores (Breves, Soure, Gurupá, Bagre e Melgaço) e há apenas sete UTIs em toda a região, localizadas em Breves.

São 176 leitos disponíveis no total, distribuídos entre os 16 municípios .Diante do cenário, várias instituições, entre elas, o Museu Paraense Emílio Goeldi demonstram preocupação com a precariedade das autoridades em oferecer cuidado adequado para as pessoas que moram na região.


Até 31 de maio foram registrados 2.233 casos da covid-19, no Marajó. Até esta sexta-feira, 12, 3.264, ou seja, mais de mil casos a mais. / Reprodução/Museu Paraense Emílio Goeldi

Para agir no enfrentamento à doença, pesquisadores do Museu lançaram a campanha chamada Marajó Vivo, uma rede de solidariedade para ajudar no enfrentamento à pandemia. Por meio da ação é possível doar alimentos, produtos de higiene, materiais para confecção de máscaras, EPIs (Equipamentos de Proteção Individual), que serão entregues para quem vive na região.

Além do Museu Goeldi participam da campanha o Museu do Marajó, a Prelazia do Marajó, a Diocese de Ponta de Pedras, a Irmandade do Glorioso São Sebastião, a Fundação pela Inclusão do Marajó, o Observatório de Direitos Humanos e Justiça Social do Marajó, vinculado à Universidade Federal do Pará (UFPA), e o Instituto Iacitata Amazônia Viva.

A pesquisadora diz ainda que estudos realizados no Amazonas, constataram que as viagens de barco – comuns na região do Marajó – podem aumentar consideravelmente a difusão da doença para o interior da Amazônia e que é necessário que haja a suspensão das atividades portuárias e maior fiscalização do transporte fluvial para proteger as pessoas.

"Nós temos recomendado fortemente que haja garantia de renda emergencial básica para segurar o distanciamento social, a melhoria da infraestrutura hospitalar nos vários municípios. A suspensão imediata das atividades portuárias e maior fiscalização do transporte fluvial. A longo prazo recomenda-se o tratamento de esgoto sanitária para evitar o aumento das contaminações por rios e igarapés da região como já foi evidenciado ocorrerem em outras regiões do Brasil e da China", afirma. 

Precariedade e enfrentamento

O Pará chegou a 4.132 mortes em decorrência do novo coronavírus nesta sexta-feira, (12), e mais de 66 mil casos confirmados. O primeiro caso da doença, na região, foi registrado no dia 14 de abril, no município de Afuá, que atualmente tem 301 casos confirmados de covid-19.

Segundo a Sespa e o governo do Pará, agora a doença segue em direção aos municípios distantes da capital paraense, Belém, locais que sofrem com as distâncias geográficas dos centros urbanos e a precariedade de acesso à saúde. 

Aquisição de respiradores no Pará é alvo de investigação

Os respiradores são fundamentais para garantir que pacientes em estado grave, acometidos pela covid-19, possam ter a chance de viver. Contudo, o Pará enfrenta uma crise pela aquisição de ventiladores pulmonares que não funcionavam. O governador do Pará, Helder Barbalho, inclusive, foi alvo de uma ação da Polícia Federal (PF) por suspeita de fraude na aquisição dos aparelhos. 

O governo do Estado, por sua vez, afirma que os R$ 25 milhões, pagos antecipadamente ao empresário pela compra dos equipamentos, já foram devolvidos aos cofres públicos, mas muitos municípios, como Cachoeira do Arari, citado pela pesquisadora, não contam com nenhum equipamento.

O alerta dos pesquisadores do Museu analisou dados até 31 de maio. Cachoeira do Arari registrou até esta sexta-feira, (12), 92 casos da doença e 9 mortes em decorrência da covid-19, isso sem contar as subnotificações, uma vez que o Brasil é um dos países que menos realiza testes para o novo coronavírus no mundo. 

A Secretaria de Estado de Saúde Pública (Sespa) disse, em nota, que na região do Marajó há um Hospital de Campanha em Breves com 60 leitos, sendo 18 Unidades de Terapia Intensiva (UTI) e que o Hospital Regional de Breves está com nove leitos exclusivos para atendimento da covid-19. A Sespa disse ainda que parte dos moradores desta região é assistida pelos hospitais da Região Metropolitana de Belém, mas não esclareceu quantos respiradores há em casa município da região e se algum será enviado para Cachoeira do Arari.

Edição: Leandro Melito