O Senado Federal pode votar nesta quarta-feira (24) o Projeto de Lei 4162/19 que facilita a privatização de estatais de saneamento básico em todos os estados. No entanto, diversos senadores da oposição disseram que sequer foram consultados sobre a urgência de se votar esse projeto em plena pandemia da covid-19. Na última segunda-feira (22), a Federação Nacional dos Urbanitários (FNU) realizou uma plenária virtual para marcar o Dia Nacional de Lutas em Defesa do Saneamento Público e para debater o tema com trabalhadores, especialistas, parlamentares e entidades de representação nacional e internacional.
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Para Sérgio Gonçalves, diretor da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental (Abes), o projeto, aprovado na Câmara e agora esperando votação no Senado, é "nefasto" porque desconsidera a construção coletiva de pelo menos outras seis leis de alcance nacional que foram sendo implementadas nos últimos 20 anos em nome da universalização da água. Ele destacou que algumas leis pela universalização da água sequer entraram em vigor plenamente.
"Não há problema algum em mexer nas leis. A questão é que o PL não foi debatido coletivamente e atropela todas as outras leis existentes. Essas leis só estão sendo mexidas porque existem interesses de um determinado grupo. Esse projeto de lei não aponta para a universalização do acesso à água e não informa de onde virá o dinheiro para investimentos", criticou Sérgio Gonçalves.
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Representante da Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional (Fase) no Rio de Janeiro, a educadora Caroline Rodrigues disse que o debate obrigatório que precisa ser realizado é sobre a estatização de 10% do setor de saneamento que já foram privatizados no Brasil. Ela afirmou que o PL, se aprovado, favorece não apenas empresários locais como também multinacionais como a Nestlé, Coca-Cola e a francesa Suez.
"Nos colocamos contra o discurso neoliberal de que a privatização vai melhorar, há muitos exemplos que mostram o contrário. Queremos debater a estatização de 10% do setor de saneamento que já está privatizado no Brasil. A gente entende a água como direito, como bem comum. A América Latina tem um histórico de defesa da água, a Bolívia é um dos exemplos, então não precisamos nos guiar por essa lógica privatista de Paulo Guedes", disse Caroline, lembrando que o Brasil tem muitos conflitos no campo pela disputa de água.
"Sem água não tem comida"
O encontro também teve a participação da apresentadora e chef de cozinha especializada em culinária natural Bela Gil. Ela disse que a água vem sendo alvo de um processo muito parecido com o que ocorre com os alimentos, a chamada "comoditização", ou seja, a comercialização de bens que deveriam ser públicos, mas estão sendo comercializados por grandes multinacionais.
"A gente já viu que isso não funciona. A 'comoditização' dos alimentos deu muito errado, produzimos comida para alimentar 10 bilhões de pessoas no mundo, mas temos 1 bilhão de pessoas passando fome. Entendemos que a financialização da água, como acontece com os alimentos, é muito danosa. A água é um direito básico e fundamental, não podemos abrir mão dela. Sem água não tem vida, não tem saúde e não tem alimento", defendeu a apresentadora.
O deputado federal Glauber Braga (Psol-RJ) convocou a população a pressionar os senadores com mensagens para que eles se posicionem contra o PL. O parlamentar disse, ainda, que o presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia (DEM), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM) precisam assumir o compromisso de não colocar na pauta de votação projetos que não sejam emergenciais e que não tenham relação direta com a covid-19.
"Temos que ampliar os esforços, é um momento de mobilização, queremos que essa matéria não seja pautada na quarta-feira, não existe motivo que possa minimamente justificar um processo de privatização a não ser a realização de negócio de natureza privada para privilegiar uns e outros em detrimento da defesa de milhões de brasileiros. Se essa matéria for pautada, o Congresso está fazendo o jogo da política de morte do governo federal", enfatizou o deputado do Psol.
Glauber também chamou a atenção para a reversão de privatizações que não deram certo em diversas partes do mundo. Natural de Nova Friburgo, ele disse que sua cidade teve o serviço de fornecimento de água e tratamento de esgoto privatizado. "Tivemos as maiores manifestações na história da cidade, com a população tendo que pagar contas de água altíssimas e a empresa sem cumprir as promessas de melhoria que havia prometido", concluiu.
Fonte: BdF Rio de Janeiro
Edição: Rodrigo Chagas e Mariana Pitasse