O Projeto de Lei (PL) 2630/2020, conhecido popularmente como “PL das Fake News”, deve ser votado nesta quinta-feira (25), no Senado, sob intensos protestos. Parlamentares e organizações civis reclamam a necessidade de mais debates sobre o tema antes que o texto seja colocado sob a avaliação do plenário. Apesar disso, o presidente da Casa, Davi Alcolumbre (DEM-AP), manteve a proposta na pauta de votações do dia.
A medida trata do combate à disseminação de conteúdos falsos na internet. De autoria do senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE), o PL é relatado pelo vice-líder do PSD na Casa Ângelo Coronel (BA), que entregou a última versão do parecer na quarta (24).
A coordenadora-geral do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), Renata Mielli, afirma que o tema envolve uma série de delicadezas e por isso precisaria de mais tempo de discussão e debates multilaterais. Com o atual esquema de realização de sessões remotas, o Congresso Nacional tem encaminhado as propostas direto para o plenário após acordo entre as bancadas. O trâmite enxuto faz com que as medidas não sejam avaliadas pelas comissões, que atualmente estão sem atividade e constituem os principais espaços de participação popular das casas legislativas.
“Dialogamos muito com os senadores Alessandro Vieira, Ângelo Coronel, outros senadores e assessores, mas num diálogo bilateral, que é muito precário. Um projeto como esse, que trata de um tema tão sensível, deveria ter um rito de tramitação que envolvesse um amplo debate da sociedade”, avalia Mielli.
Para a coordenadora-geral, a discussão deveria ser retomada somente quando o Legislativo recuperar os mecanismos de participação popular. “Ou seja, a partir do momento em que o Congresso estiver trabalhando de forma regular, quando as comissões tiverem o seu trabalho restituído, com audiências públicas funcionando, ainda que remotas. Do jeito como está agora, entendemos que não é uma forma democrática de se discutir um projeto de lei como esse”, argumenta Mielli.
As organizações civis críticas ao projeto apontam que, ao mirar a disseminação de conteúdos falsos na rede, o conteúdo do PL impõe balizas que trazem riscos à privacidade, à liberdade de expressão e, consequente, ao sistema democrático. Um dos pontos considerados mais controversos diz respeito à vinculação da abertura de contas em redes sociais à apresentação de documento e número de celular ativo, permitindo a identificação em massa dos usuários.
“O projeto, a meu ver, traz dispositivos que inclusive são inconstitucionais, como o rastreamento de mensagens privadas, que coloca em xeque o sigilo das comunicações interpessoais, e uma série de outras questões que não estão sendo consideradas no Senado”, exemplifica a coordenadora-geral do FNDC.
Parlamentares
Nos últimos dias, diferentes parlamentares também fizeram coro contra a votação. O líder do Podemos, Álvaro Dias (PR), por exemplo, apresentou um requerimento pedindo o adiamento da apreciação do texto pelo plenário.
“Um projeto tão polêmico como esse, que interfere na vida de mais de 170 milhões de brasileiros, não pode deixar de ser amplamente discutido na Comissão de Constituição e Justiça [CCJ]”, argumentou, ao fazer uma postagem pela internet. Ele também destacou que o PL trata de questões “sensíveis aos direitos individuais, como proteção da privacidade e da liberdade de expressão”, podendo acarretar “prejuízos irreparáveis”.
O senador Eduardo Girão (Podemos-CE) está entre os que se mobilizam contra o conteúdo e a votação do PL. “Temos que combater a indústria da falsa notícia sem intimidar o cidadão”, disse na quarta (24). Alguns parlamentares, entre eles o líder da oposição, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), sustentam que a proposta deveria ir à votação somente no período pós-pandemia.
Alcolumbre
Na contramão da resistência dos opositores, o presidente Davi Alcolumbre afirmou, nos últimos dias, que pretende fazer desta quinta-feira “um dia histórico”, em referência à possibilidade de aprovação da proposta. Constantemente atacados por adversários políticos e por grupos extremistas que pedem o fechamento do Congresso e disseminam conteúdos falsos nas redes, os defensores do PL estariam interessados em frear a máquina de propagação de fake news movidos pelo interesse pessoal e político que circunda a questão.
Nos bastidores, a leitura é de que a difusão desse tipo de conteúdo tende a atrapalhar ainda a corrida rumo às eleições municipais, ocasião em que os parlamentares tentam ampliar sua influência nos estados. No caso de Alcolumbre, em particular, o combate às fake news também estaria conectado ao interesse pela reeleição no próximo ano, quando o Senado deve escolher um novo presidente.
Edição: Rodrigo Durão Coelho