Há alguns anos, as Forças Armadas brasileiras, vêm passando por uma lenta e silenciosa transformação. O motivo é o crescente número de pessoas transexuais reivindicando seu direito de existir e seguir carreira militar.
Um exemplo é de Bruna Benevides. Nascida em Fortaleza, Benevides viu nas Forças Armadas a possibilidade de fugir das violências que sofria durante a infância. Ingressou na Marinha do Brasil e lá ficou durante mais de vinte anos, servindo sob uma identidade de gênero que não era dela.
Foi quando, em 2012, ela decide assumir publicamente sua identidade como mulher. O resultado foi imediato, afastamento por questões de saúde (justificada por um laudo médico com diagnóstico de transexualismo, termo discriminatório já proibido pela Organização Mundial de Saúde), e aposentaria compulsória.
Bruna entrou então com um processo contra a instituição, que até agora não conseguiu provar sua incapacidade de voltar às suas funções.
“Antes que a reforma fosse efetivada, eu tive um parecer favorável da Justiça que determinou que fosse cancelado o processo de reforma, e que fosse dada a continuidade da minha carreira.”
Limbo jurídico
Em 2016, a então presidenta Dilma assinou decreto assinou um decreto autorizando o uso do nome social e o reconhecimento da identidade de gênero de pessoas travestis e transexuais no âmbito da administração pública federal.
Desde então, o caso de Benevides está num limbo jurídico. Ela ainda está impossibilitada de desempenhar as funções, mas oficialmente não está de licença médica e em nenhum tipo de licença prevista em qualquer uma normativa da Força.
“É um paradoxo, e ao meu ver, um absurdo. Porque eu sou uma mulher extremamente capaz, extremamente saudável, profissional, dedicada, que quer continuar trabalhando, mas que ao mesmo tempo está sendo proibida de trabalhar pelo fato de ser quem ela é.” diz a segunda-sargenta.
Outro caso conhecido, que também teve que ir à justiça, é da capitã Bianca Figueira. Depois de se assumir, ela também recebeu o diagnóstico de transexualismo e foi imediatamente afastada da Marinha do Brasil.
“Quando eu decidi contar para meus superiores, eu tive que passar minhas funções em um dia. E em princípio era para eu dizer que estava entrando de férias, mas não eram férias, eles me colocaram em licença para tratamento de saúde, por 90 dias. Para eles darem um laudo que eu era transexual, que tinha um problema mental. Isso no hospital psiquiátrico da Marinha.” afirma Figueira.
Após os processos de rejeição Biana se formou em advocacia e Bruna tornou-se liderança de movimento trans no Brasil, sendo atualmente presidente do Conselho Municipal dos Direitos da População LGBT de Niterói e membro da diretoria da Associação Nacional dos Travestis e Transsexuais (ANTRA).
Conquistas recentes
Casos recentes de conquistas de outras mulheres trans dentro das Forças Armadas têm mostrado que a luta de ambas tem dado resultado.
Um exemplo é o de Maria Luiza da Silva, subtenente da Aeronáutica que teve a aposentadoria garantida após decisão do STF. Outro é de Renata Gracin, major do exército que ganhou o direito de permanecer na Força sem precisar entrar na justiça.
“A nossa resposta frente a esse cenário de violência, de transfobia é cada vez mais estarmos organizada para fazermos o enfrentamento daquilo que a gente acha importante.” afirma Benevides.
Bianca concorda e acredita que casos casos positivos como esse podem ajudar as próximas pessoas que passarem pela mesma situação. “Graças à toda nossa exposição, à da Bruna, nossa luta, perseverança.”
O caso de Bruna está aguardando data para que a sustentação possa ser feita. E Bianca, após conseguir defender ela mesma a reabertura do seu processo, batalha agora para levar o caso para o Supremo Tribunal Federal.
Edição: Rodrigo Durão Coelho