No dia 9 de abril, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) enviou ao Ministério da Saúde e ao Comitê de Crise para Supervisão e Monitoramento dos Impactos da Covid-19 uma nota informativa desaconselhando o uso de hidroxicloroquina no tratamento para coronavírus.
“Recomendamos ao Ministério da Saúde e Comitê de Crise para Supervisão e Monitoramento dos Impactos da Covid-19 que os comprimidos de hidroxicloroquina fabricados pelo Laboratório Químico e Farmacêutico do Exército e pelo Instituto de Tecnologia em Fármacos - Farmanguinhos, da Fundação Oswaldo Cruz, sejam destinados exclusivamente às indicações terapêuticas já aprovadas por esta Anvisa e que constam na bula do medicamento”, aponta a nota assinada pelo diretor da entidade, o almirante Antônio Barra Torres.
Ainda de acordo com a nota, a Anvisa demostrava preocupação com o atendimento das pessoas que realmente necessitam do medicamento. No documento, a agência afirma que o estoque de hidroxicloroquina à época, 8,8 milhões de comprimidos, “equivaleria a aproximadamente 3 (três) meses de tratamento dos pacientes malária, lúpus ou artrite reumatoide, ou seja, daquelas indicações terapêuticas aprovadas em bula.”
Dias antes, em 27 de março, o governo brasileiro havia anunciado que a hidroxicloroquina seria liberada para uso em pacientes com a covid-19, desde que apresentassem uma receita assinada por um médico. Em seu site, a Anvisa divulgou uma nota, no dia 31 de março, com as regras para o uso do medicamento.
“O Ministério da Saúde (MS) divulgou que disponibilizará os medicamentos cloroquina e hidroxicloroquina para uso em pacientes com formas graves da covid-19, a critério médico. A decisão foi baseada em estudos promissores que demonstram o potencial benefício do uso em pacientes graves”, afirma a Anvisa na nota, obtida pelo coletivo Fiquem Sabendo.
O Brasil de Fato entrou em contato com a Presidência da República mas não obteve resposta até a publicação dessa matéria.
Para o deputado federal Alexandre Padilha (PT-SP), ex-ministro da Saúde, o documento não poderia ser ignorado pela presidência da República.
“Mais um crime de responsabilidade de Bolsonaro: ignorou uma nota técnica da Anvisa que não recomendava o uso da hidroxicloroquina. O governo transforma o debate da cloroquina em um ato político, contudo é científico. Ao ignorar a Anvisa, o governo mostra que seu compromisso não é com a vida, mas sim, com a produção de fake news [notícias falsas]".
O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) é o principal defensor da hidroxicloroquina no país, mesmo sem comprovação científica da eficácia do medicamento. Pelo contrário, pesquisas no Brasil e em outros países mostram que o medicamento não deve ser utilizado no tratamento da covid-19.
No último dia 6 de agosto, Bolsonaro afirmou que, se for necessário, solicitará aos EUA mais unidades do medicamento.
"Aceitei do presidente Trump a doação de 1 milhão de comprimidos, que ainda não foram distribuídos porque a cartela deles tem 100 comprimidos. E se o Trump, nós tivermos necessidade aqui de mais comprimidos, pode ser que haja mais necessidade, eu não tenho problema nenhum de ligar para o presidente norte-americano, se tiver mais, manda para nós, a gente manda um avião buscar ou ele manda um avião para cá e a gente distribui esse material aí", disse.
Edição: Leandro Melito