ELEIÇÕES 2020

Com 16 pré-candidatos na disputa, esquerda tenta vitória complicada em Porto Alegre

Desunidos, PT, PSol, PCdoB e PDT enfrentam a eleição cheia de incertezas da capital gaúcha

Brasil de Fato | Porto Alegre (RS) |
Com 16 nomes, fragmentação atinge esquerda e direita, embora esta esteja ainda mais dividida - Reprodução

A batalha eleitoral pela capital gaúcha entra em setembro com 16 pré-candidaturas brigando pelos 1,1 milhão de votos de Porto Alegre. Trata-se de um recorde. Desde o final da ditadura civil-militar, quando foi permitido novamente aos eleitores das capitais escolherem seus governantes, não havia páreo tão disputado. A fragmentação é geral, atingindo esquerda e direita, embora esta esteja ainda mais dividida. O que não significa que as candidaturas à esquerda terão vida fácil em novembro.

É a opinião de dois cientistas políticos que conhecem bem o quadro partidário local, e as transformações que sofreu ao longo do século. “Suas chances (da esquerda) de vencer no primeiro turno são praticamente nulas, e de vencer no segundo turno são pequenas”, opina Paulo Peres, professor de Ciência Política na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). “Se as eleições fossem hoje, as maiores chances seriam para a direita e a centro-direita”, entende o também cientista político Benedito Tadeu César.

“Candidatos devem cair pela metade”

Para César, a profusão de concorrentes irá minguar com os acertos ainda pendentes entre os partidos. “A direita provavelmente irá se unificar em torno de uma única ou, no máximo, duas candidaturas”, arrisca. “A centro-direita, considerando-se nesse campo as candidaturas do MDB, com Sebastião Melo, e do PTB, com José Fortunati, manterá as duas”, avalia.

Na projeção do cientista político, a centro-esquerda continuaria com uma só chapa, a da deputada estadual Juliana Brizola, neta do ex-governador Leonel Brizola. E a esquerda se apresentaria dividida entre quatro candidaturas, com as principais sendo as de Manuela d’Ávila (PCdoB/PT) e de Fernanda Melchionna (PSol), mais as chapas do PSTU e da Unidade Popular (UP). Os 17 nomes cogitados até agora se reduziriam à metade.

César acredita que a fragmentação é o grande problema das esquerdas e que seria atenuado sensivelmente caso houvesse uma aliança das suas forças mais expressivas já no primeiro turno. Algo que, imagina, ainda pode ocorrer adiante, caso as pesquisas demonstrem claramente o risco de fracasso.

“'Conspiranóias' disparatadas favorecem a direita”

Peres tem outra convicção. Para ele, mesmo unidas, as esquerdas terão uma pedreira pela frente. E exemplifica com um comparativo dos últimos pleitos. No primeiro turno de 2004, o somatório de seus votos foi de 45%. Quatro anos depois, baixou para 38%; em 2012 ficou em 27,3% e, em 2016, alcançou 28,3%. Há uma perda continuada de eleitores, com uma pequena oscilação positiva na última eleição municipal. “A polarização radicalizada, que identifica a esquerda com o comunismo, Cuba, China e todas as conspiranóias mais disparatadas, favorece os partidos de centro e, principalmente, os de direita”, interpreta.

Em 2016, a esquerda ficou fora do 2º turno na capital pela primeira vez desde 1988. Isso aconteceu apesar de a soma dos votos das candidaturas do PT e do PSol ter sido superior a do candidato do MDB, que obteve a segunda posição. A desunião custou ainda caro em 2008 quando a soma de PT, PCdoB e PSol no 1º turno atingiu 373.682 votos. Maior votação do que o candidato vencedor, José Fogaça, do PMDB, obteria no 2º turno, concorrendo contra Maria do Rosário, do PT.

Como a ultra-direita ganhou corpo nos últimos anos, outra incógnita eleitoral se refere sobre quem Jair Bolsonaro, hoje sem partido, apoiará em Porto Alegre. Os palpites envolvem três nomes: o ex-sindicalista e ex-PT José Fortunati, hoje no PTB de Roberto Jefferson; o vice de Marchezan Jr, Gustavo Paim (PP), e o vereador Valter Nagelstein (PSD). Também se candidata ao apoio do Planalto um competidor oriundo dos quartéis: o ex-comandante da Brigada Militar, Mário Ikeda, que concorre pelo PRTB. 

No PTB de Jefferson, Fortunati pode ser o “ungido” de Bolsonaro

“Acredito que (o atual prefeito) Marchezan Jr. é o pré-candidato com maior chance de receber o apoio de Bolsonaro, por força do alinhamento ideológico existente entre eles”, indica César. Já Peres recorda que a aproximação de Bolsonaro do Centrão aumentou a afinidade com Jefferson e o PTB, o que poderia fazer de Fortunati o “ungido” da ultradireita. Lembra, porém, que Melo, do MDB, já se mostrou receptivo ao apoio dos bolsonaristas, o mesmo acontecendo com Paim, do PP. “Talvez tudo ocorra como na eleição para governador: todos – do centro e da direita – dirão que estão com Bolsonaro, enquanto Bolsonaro não diz com quem está”, prevê.

No interior dos partidos, a avaliação é um tanto diferente. “Os que apoiaram Bolsonaro e Marchezan estão destruindo a democracia, o nosso país, os empregos e os direitos do povo”, comenta Adalberto Frasson, presidente regional do PCdoB. Na sua visão, durante a disputa esse campo conservador, à direita, vai se defrontar com o outro, de corte democrático-popular, que vem propor justamente o oposto do que se vê no país e na cidade.

A incógnita do impeachment de Marchezan Jr.

O ex-deputado estadual Pedro Ruas, do PSol, também julga que a eleição será polarizada e prega que sua candidata, Fernanda Melchionna, seja “o polo mais duro” da oposição a Marchezan Jr., o candidato do PSDB. “Para a Fernanda, o duro será chegar no segundo turno”. Depois, na sua percepção, ficaria mais fácil. Ruas igualmente conclui que, na capital gaúcha, Bolsonaro irá apoiar o prefeito tucano.

Aliás, os acontecimentos em torno de Marchezan Jr. trouxeram mais um elemento de indefinição ao pleito. Além da pandemia que restringe os contatos pessoais na batalha pelo voto, impede os grandes comícios e direciona a campanha para as redes sociais, Porto Alegre acompanha o desenrolar do processo de impeachment de seu prefeito. Nelson Marchezan Jr. é acusado de desviar dinheiro do Fundo Municipal de Saúde para gastar em publicidade. Seu processo – hoje suspenso devido a uma liminar – foi aberto por goleada de votos na Câmara de Vereadores: 31x4. Para ser afastado, bastam 24 votos.  

O prefeito é considerado um forte candidato do campo conservador, mas o processo pode recomeçar e correr paralelamente à campanha. Há quem diga que irá jogá-lo fora da corrida, mas há quem imagine, ao contrário, que pode favorecê-lo pela exposição na mídia. Como o processo de impeachment foi impulsionado por seus antigos apoiadores, permitirá que Marchezan Jr. se apresente como vítima de traição.     

Quem são os pré-candidatos

Em ordem alfabética esta é a relação dos pré-candidatos à prefeitura de Porto Alegre no momento:

André Cechinni – Médico neurologista, é o nome escolhido pelo Patriota.

Carmen Flores – Empresária lojista, ex-PSL, concorre pelo PSC, após aval do presidente nacional do partido, Pastor Everaldo.

Fernanda Melchionna – Deputada federal, é a candidata pelo Psol. O partido busca o apoio da Unidade Popular, do PCB e da Rede.

Gustavo Paim – Vice de Marchezan Jr., rompeu com o prefeito durante a gestão. Concorre pelo PP.

João Derly – Ex-judoca, foi deputado federal pelo PCdoB, trocou o partido pela Rede Sustentabilidade e hoje está no Republicanos. É o partido pelo qual disputa.

José Fortunati – Ex-deputado e ex-prefeito, Fortunati começou no PT, passou para o PDT, seguiu para o PSB e hoje está no PTB.

Juliana Brizola – Deputada estadual, neta do ex-governador Leonel Brizola, é a escolha do PDT. Deve receber o respaldo do PSB, que indicará seu vice.

Júlio Flores – Professor, várias vezes candidato, é o nome do PSTU.

Manuela d´Avila – Ex-vereadora e ex-deputada estadual e federal, foi vice de Fernando Haddad nas eleições de 2018. Concorre pela aliança PCdoB/PT.

Mário Ikeda – Ex-comandante da Brigada Militar, comparece pelo PTRB, sigla que abriga o vice de Bolsonaro, Hamilton Mourão.

MontSerrat Martins – Médico, concorre pelo PV.

Nelson Marchezan Jr – O atual prefeito concorre pelo PSDB e obteve o respaldo do PSL e do PL.

Rodrigo Maroni – Deputado estadual, é o candidato do PROS.

Sebastião Melo – Ex-prefeito da cidade, foi derrotado por Marchezan Jr. em 2016. Tenta voltar ao cargo pelo MDB, com o apoio do Cidadania.

Valter Nagelstein – Vereador, deixou o MDB e se filiou ao PSD para concorrer à prefeitura.

OBS. – O 16º pré-candidato é o do PCB que hesita entre dois nomes. Pode, ainda, desistir da candidatura e apoiar a chapa do Psol.

 

A Capital que está em jogo

População - 1.483.351 (estimada)

Prefeito - Nelson Marchezan Jr. (PSDB)

PIB per capita - R$ 49.740,90

Receita - R$ 6,4 bilhões

Índice de Desenvolvimento Humano (IDHM) - 0,805

Expectativa de vida – 76,4 anos

Mortalidade infantil - 8,98 por mil nascidos vivos

Área - 495,3 km2

Serviço de esgoto - 93%

Arborização - 82,7%

Praças - 667

Parques - 9

Urbanização - 69,4 %

Hospitais - 34

Postos de saúde - 140

Ensino médio - 143 escolas

Ensino fundamental - 374 escolas

Universidades públicas - 4

Escolarização de 6 a 14 anos - 96,6%

 

(*) Colaborou Wálmaro Paz 

Fonte: BdF Rio Grande do Sul

Edição: Katia Marko