A 104 quilômetros de distância da capital Recife, o município de Tamandaré, no litoral sul de Pernambuco, é conhecido principalmente por suas praias de águas claras, em que se destaca a Praia dos Carneiros. Mas a localidade de cerca 25 mil habitantes ganhou destaque na mídia por outro motivo em 2020. O prefeito Sérgio Hacker (PSB), que tenta reeleição este ano, era o patrão de Mirtes Souza e Marta Santana, respectivamente mãe e avó do menino Miguel Otávio, de cinco anos, que morreu ao cair do 9º andar do condomínio de luxo Pier Maurício de Nassau em junho deste ano. Miguel fora deixado por alguns minutos aos cuidados de Sarí Côrte Real, esposa do prefeito de Tamandaré, mas esta foi negligente e colocou a criança sozinha dentro do elevador.
Entre os desdobramentos da tragédia, ficou evidente que os patrões estavam colocando as trabalhadoras domésticas para trabalhar durante a pandemia, em desacordo com o decreto estadual. Também foi revelado que ambas eram pagas pelos cofres públicos da prefeitura para prestarem serviços particulares na residência do prefeito Sérgio Hacker e da esposa. Um pedido de impeachment contra o prefeito foi protocolado na Câmara de Vereadores, mas por sete votos a três, o pedido foi rejeitado pelos vereadores.
A família Hacker entrou na política de cabeça em 1992. Na ocasião o casal José Hildo Hacker e a esposa Graça Hacker venceram a disputa pela prefeitura de Rio Formoso como prefeito e vice. Na época, ainda era proibida a reeleição. Mas, no pleito seguinte, em 1996, José Hildo se candidatou no município vizinho, Sirinhaém, também saindo vitorioso. Com a mudança de regras que passou a permitir reeleição, ele foi reeleito em Sirinhaém no ano 2000. Neste mesmo ano sua esposa se candidatou em Rio Formoso. Ambos venceram suas eleições. Graça Hacker ainda seria reeleita, ficando na prefeitura até 2008.
O casal teve quatro filhos, dos quais três entraram na política. Franz Hacker é o atual prefeito de Sirinhaém, desde 2013 e já foi vice-prefeito de Barreiros por dois mandatos (2005-2012). Isabel Hacker é a atual prefeita de Rio Formoso, desde 2017, candidata à reeleição. E Hildo Hacker Júnior foi prefeito de Tamandaré por dois mandatos (2009- 2016). Ao fim do segundo mandato, ele indicou seu único irmão que ainda não havia ingressado na política Berg Hacker. Essa conduta é vedada por lei e o grupo mudou de candidato, colocando o sobrinho Sérgio Hacker (PSB), recém-chegado do Rio de Janeiro e então com 26 anos. O jovem foi eleito e agora disputa a reeleição. Ele é filho de Isabel, atual prefeita de Rio Formoso.
A família sempre foi ligada à direita, liderada no estado pelo ex-governador e hoje senador Jarbas Vasconcelos (MDB), mas migrou para o PSB após 2014. Os Hackers são os maiores proprietários de terras rurais e urbanas na soma dos três municípios (Tamandaré, Rio Formoso e Sirinhaém) e também possui empresas do ramo automotivo (venda, revenda e compra de automóveis) no Recife e em São Paulo (SP).
Tamandaré foi distrito de Rio Formoso até 1995, quando o então governador Miguel Arraes emancipou o município, que teve eleições próprias a partir de 1996. O município de aproximadamente 25 mil habitantes tem 17 mil eleitores. As principais atividades econômicas são a monocultura da cana-de-açúcar, o turismo e os pequenos comércios e serviços, além da pesca artesanal. A maior parte (cerca de 75%) da população vive na área urbana, enquanto o restante vive na zona rural. Aproximadamente 75% da população se reconhece enquanto negra (pretos e pardos). As praias do município estiveram entre as atingidas pelo derramamento de óleo no litoral do Nordeste há um ano.
Conheça os pré-candidatos que devem disputar a prefeitura em 2020:
Sérgio Hacker (PSB)
Apesar do escândalo relacionado à morte do menino Miguel, Sérgio Hacker avaliou que conseguiria manter a candidatura. Desde meados de julho o prefeito tem visitado residências, especialmente na zona rural, para fazer refeições e saber se as famílias “estão precisando de algo”. Com muitas terras rurais e urbanas no município, a família influência e tem robustez financeira para investir na campanha. Do ponto de vista da gestão, Sérgio não conseguiu imprimir uma marca como fez seu tio. O prefeito de 31 anos também perdeu o apoio de uma das figuras mais influentes de seu partido na região, o deputado estadual Aluísio Lessa (PSB), que decidiu apoiar o candidato do PCdoB. Há quatro anos, Sérgio Hacker foi eleito com 57% dos votos (7,4 mil), contra 42% de Carrapicho e 1% de Bebeto (PMN).
Paulo Guimarães (PCdoB)
Pescador artesanal, Paulo Guimarães foi fundador e primeiro presidente da Colônia de Pescadores de Tamandaré, quando esta ainda era distrito de Rio Formoso. Em 1992, foi eleito vereador e, na luta pela emancipação de Tamandaré, conquistou a simpatia e o apoio do então governador Miguel Arraes (PSB) para a causa. O município foi emancipado em 1995 e no ano seguinte Paulo Guimarães foi eleito pelo PSB o primeiro prefeito da história da cidade, sendo reeleito em 2000 pelo PT. Sua gestão foi marcada pela construção de moradias populares, um centro de artesanato e um estádio de futebol.
Carrapicho (REP)
Isaías Honorato da Silva, ou simplesmente “Carrapicho”, é também pescador e cria política de Paulo Guimarães. Foi eleito vereador pelo PCdoB em 2008, reeleito em 2012 como mais votado, o que o motivou para disputar, pelo PDT, a prefeitura de Tamandaré numa frente de esquerda com apoio do PT de Paulo Guimarães e do PCdoB. Mas sua chapa teve 42% dos votos, sendo derrotado pelo atual prefeito Sérgio Hacker (PSB). Carrapicho hoje está no REP, partido ligado à Igreja Universal. O vice da chapa deve ser Raimundo Nonato Lopes, o “Mundinho” (PTB), vereador por cinco mandatos e atual vice-prefeito, mas que rompeu com Hacker, se desfiliou do PSB e ingressou no PTB.
Um ex-futuro candidato
No auge da crise do caso Miguel, o partido PP lançou como pré-candidato à prefeitura o empresário Marcos Vilar. Um mês depois ele acabaria preso pela Polícia Civil acusado de chefiar um esquema de contrabando de cigarros. Na operação, além da carga ilegal, foi apreendido R$ 1,2 milhão em espécie, armas de fogo e munições. É comum que lideranças políticas locais andem armadas ou cercadas de seguranças armados, inclusive nas visitas às residências da população.
Fonte: BdF Pernambuco
Edição: Monyse Ravena