A gente trabalha com as pessoas que vêm para cá. Trabalhamos e dividimos a renda
O território da cidade de Campinas (SP) mantém apenas 2% da Mata Atlântica remanescente. O dado reflete a realidade de muitos centros urbanos pelo país em que o excesso de concreto sustenta uma urbanidade de desequilíbrios sociais e ambientais.
Mas, no periférico bairro do Conjunto Habitacional Parque de Itajaí, a assistente social Isabel Barbosa identifica uma área de 10 mil m² como um ponto fora da curva no cenário campineiro. Ela cita que a horta urbana do bairro cravada no meio das moradias populares traz diferentes sensações.
“Quando se anda na região percebe que aquela horta parece um oásis. É muito nítida a sensação térmica que se tem ao estar na calçada, fora da horta e adentrar o espaço do cultivo”, enfatiza.
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Para além de ser agradável, Isabel Barbosa faz questão de lembrar que todas as pessoas no local respeitam e preservam o espaço, delimitado apenas por uma cerca simples. O sentimento de pertencimento com a Horta Comunitária do Itajaí pode ser relacionado com sua própria história.
Em 2004, Seu João Novais passou a cultivar no local como uma proposta de atividade terapêutica. O exemplo fez brotar de forma espontânea um grupo de produtores, que passou a acompanhar a iniciativa. O trabalho se destacou e foi reconhecido para além da comunidade.
No ano de 2009, o trabalho na Horta do Itajaí ganhou o Prêmio de Responsabilidade Ambiental RAC e Sanasa. A congratulação afirmou a sustentabilidade ambiental feita diariamente pela ação comunitária.
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Em 2010, a Prefeitura de Campinas cedeu o terreno para a experiência. O território também é reconhecido como um projeto de assentamento urbano, organizado enquanto Associação Cio da Terra.
“A gente trabalha com as pessoas que vêm para cá. Trabalhamos e dividimos a renda. Fazemos a venda coletiva”, define.
Com o passar dos anos, Seu João Novais passou a ser conhecido como João da Horta. O que ele considerava como trabalho terapêutico passou ser visto também como educativo, social e ambiental com a inserção da Agroecologia no processo.
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Ao todo, são 12 famílias assentadas no território. Mas o trabalho de plantio, comercialização e doação de alimentos se estende entre 25 famílias participantes direta e indiretamente. Parte dos produtos são vendidos sem atravessador para um restaurante vegetariano de Campinas.
Seu João explica que ao longo dos anos o processo de troca de conhecimentos agroecológicos foi feito de forma aberta e com diferentes pessoas que "deixaram uma semente" no local. Agricultoras e agricultores urbanos dialogam com academia, centros de pesquisas, escolas e outras pessoas do campo. Esse acúmulo de saberes sugere propostas para os espaços urbanos.
“Nós devemos ocupar espaços públicos. Além dessa horta que é oficializada, está documentada enquanto pessoas assentadas, vem várias pessoas me procurar para saber da experiência, que dá renda, ajuda na saúde”, salienta.
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Além de frutas, verduras e hortaliças de cada estação, o espaço também é referência como uma farmácia popular, por cultivar plantas medicinais. Não há cadastro formal para participação nas atividades na Horta. Muitas famílias procuram o espaço por conta da situação financeira apertada ou mesmo como uma terapia ocupacional, como o próprio motivo embrionário do espaço coletivo.
Edição: Douglas Matos