As bonecas negras representam apenas 6% dos modelos fabricados pelas principais marcas no Brasil. O percentual é ainda menor do que o registrado há dois anos, apesar de mais de 56,1% da população brasileira ser formada por pessoas negras, segundo o IBGE.
As informações são do projeto "Cadê nossa Boneca" realizado pela organização "Avante-Educação e Mobilização Social". Eles refletem as informações coletadas no mês de agosto, em sites de comércio virtual de 14 dos 22 fabricantes ligados à Abrinq-Associação Brasileira de Fabricantes de Brinquedos. Dentre as empresas analisadas, apenas oito possuíam bonecas negras em seus catálogos. Em todas elas, a proporção de bonecas negras em relação às brancas é inferior a 20%.
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A organização lançou também um vídeo que está disponível no youtube sobre a realidade encontrada na pesquisa com depoimentos das pesquisadoras, lojistas e crianças negras. No vídeo, uma das idealizadoras do projeto, Mylene Alves, destaca a falta de visibilidade desses brinquedos nas estantes das lojas.
"Por que não mobilizar as pessoas, a sociedade a comprar, doar, vender bonecas negras? Porque hoje, por mais que existam empresas que produzem bonecas negras, a gente sabe que isso acontece, mas quando vamos nas lojas não conseguimos achar", relata.
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Mylene aponta como a ausência desses modelos se reflete na construção do imaginário e do preconceito.
"Hoje não há escolha. Quando você fala sobre a boneca que remete a enfermeira, noiva, médica, são todas brancas. Você não tem nessa possibilidade de dar oportunidade para as crianças brincarem com aqueles jogos de papéis sendo negras", reflete.
O levantamento foi feito em 2016, 2018 e 2020 e mostra que a situação mudou pouco. Na primeira pesquisa, a porcentagem de bonecas negras era de 6,3%, passando para 7% e, agora, para 6%.
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Uma alternativa são as fabricantes independentes e artesanais. Geórgia Nunes, idealizadora da marca Amora, que fabrica brinquedos focados na representatividade, aponta como a demanda é alta e a necessidade urgente de rever esses conceitos.
"Essa demanda aumentou muito. Agora em Salvador, onde mais de 80% da população é negra. Estamos no Brasil, onde 56% por cento da população se autodeclara negra. Então como é que temos 6% de bonecas produzidas? A pesquisa mostra isso. Não tem algo que justifique isso a não ser o racismo nessa discrepância entre os números. Porque o que a gente questiona, e aí é importante ficar claro, não é que a criança negra só pode brincar com boneca negra ou vice-versa. Na verdade queremos que todas as crianças acessebilizem todos as brinquedos", questiona.
O presidente da Abrinq, Synesio Batista da Costa, concorda que a demanda é crescente, mas defende que tem havido aumento da produção. Ele afirma que o percentual chega hoje a 12% e assegura que todas as fabricantes têm pelo menos um modelo negro.
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"O mercado de boneca negra que 0,1% cinco anos atrás estar entre 10 e 12%, isso é o maior sucesso de vendas, como a gente nunca teve. Você não tem noção da quantidade de empresas que estão lançando e apostando em bonecas negras para esse Natal. O bom de tudo é que todas as setenta fábricas têm na sua coleção bonecas negras. O consumidor pede e nós obedecemos o consumidor", defende.
Segundo a Abrinq, nem todos os modelos estão disponíveis nos sites, por isso não foram contabilizados no levantamento feito pela organização Avante e alguns ainda serão lançados neste ano.
Mais informações sobre a pesquisa podem ser encontradas nas redes sociais no perfil Cadê Nossa Boneca.