Desde o dia 14 de agosto de 2020, um novo modelo de rodízio no fornecimento de água foi imposto à população de Curitiba e região metropolitana: um dia e meio sem água e um dia e meio com água. Em recente audiência pública, realizada na Assembleia Legislativa do Paraná, sobre a crise hídrica no estado, o diretor de Meio Ambiente e Ação Social da Companhia de Saneamento do Paraná (Sanepar), Julio Cesar Gonchorosky, informou que “antes dessa medida 750 mil pessoas ficavam sem água por um período de 12 horas. Agora serão1,2 milhões que ficarão sem abastecimento em um período de 36 horas”. Um problema grave que, segundo especialistas, estava previsto há anos, mas pouco foi feito para que o Paraná estivesse preparado.
A estiagem tem se alastrado devido às temperaturas elevadas e poucas chuvas. No mês de setembro, registrou-se um déficit de 70% nas precipitações reforçando a estiagem severa que afeta o Paraná, principalmente na Região Metropolitana de Curitiba. A pergunta que fica é o que os governos estaduais, historicamente, vêm fazendo para driblar este problema.
Falta de atenção à questão ambiental
Para o professor doutor em Física Estatística, Jefferson de Souza, dentre os vários fatores que causaram a atual crise hídrica no Paraná, destaca-se a má gestão dos recursos e da rede: “Podemos citar alguns problemas, como, por exemplo, desperdício de água sem que houvesse algum tipo de política pública para prevenir isso e um tipo de tarifação que não estimula a economia.”
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Jefferson explica que a Sanepar não deu conta de ajustar, por exemplo, a oferta em relação à região metropolitana, uma das áreas mais afetadas. “Temos hoje, nessa região, 3,6 mil habitantes e, ao longo do tempo, a oferta não foi ajustada. Em segundo lugar, não foi investido na questão ambiental. Só para ter uma ideia: nós despejamos metade do esgoto na bacia do Rio Iguaçu e isso afeta diretamente a oferta da água. Pois, se você polui os rios, não tem como usar aquele rio para captação de água”, acrescentou.
Um levantamento de 2019 da ONG SOS Mata Atlântica revelou que, entre 11 rios que passam por Curitiba e região, apenas um apresentava boas condições ambientais: o Rio Itaqui, em São José dos Pinhais. No Paraná, segundo a ONG, foram analisados rios que passam pela capital e pelas cidades de Campo Largo, Almirante Tamandaré e São José dos Pinhais. Ou seja, o não investimento na questão ambiental ocorre ao longo da história dos governos estaduais.
O economista e coordenador do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) no Paraná, Pablo Diaz, também concorda que o não cuidado com os rios tem afetado a oferta da água: “Temos só em Curitiba mais de 700 rios e riachos correndo pela cidade. Portanto, não há uma falta de estoque de água. O que você tem é uma má gestão desde o tratamento do esgoto, dos resíduos e a negligência histórica levando, por exemplo, à especulação imobiliária que matou parte dos rios.”
Diaz analisa as últimas gestões caracterizando-as de caráter privatista e voltadas aos interesses dos grupos econômicos e não da população. “Governos [Jaime] Lerner e [Beto] Richa alienaram a Sanepar, que é um patrimônio público, para grupos privados. O Ratinho Jr vai na mesma linha. É importante lembrar que ele, no mês de março, em plena pandemia, ele tentou emplacar um aumento de 9,62% na tarifa da água. Ou seja, para atender os investidores,” explica o economista.
Décadas esperando a construção de mais um reservatório
Já para o professor Cláudio Marchando Kruger, do Departamento de Hidráulica e Saneamento da Universidade Federal do Paraná (UFPR), é preocupante a atual situação do estado, e a demora para responder à crise poderá acarretar mais problemas. “Existe um projeto de décadas que é a construção do reservatório do Miringuava e que deveria estar construído há um bom tempo. Essa questão da urgência de se ter um reservatório a mais já existe faz tempo. Talvez se a gente tivesse essa reserva a mais, talvez estivessem passando com um pouco mais de folga nesta estiagem severa”, explica.Nos últimos anos, a obra foi interrompida por irregularidades licitatórias e até mesmo contestação de problemas na obra.
Em nota ao Brasil de Fato Paraná, a assessoria de comunicação da Sanepar informou que ainda há um conjunto de obras em andamento: “A Sanepar está investindo cerca de R$ 100 milhões em obras de reforço à distribuição integrada de água de Curitiba e região metropolitana. Estão sendo construídos mais quatro reservatórios que serão integrados a uma nova estrutura de rede de distribuição, com 107 quilômetros”.
Fonte: BdF Paraná
Edição: Frédi Vasconcelos