Renato Roseno (PSOL) teve no movimento estudantil secundarista a sua entrada para a vida política, filiado ao PSOL desde 2005 irá disputar pela terceira vez a Prefeitura de Fortaleza, as outras duas vezes foram em 2008 e 2012. Também foi candidato ao governo estadual do Ceará em 2010.
Atualmente, Renato Roseno é deputado estadual pelo segundo mandato, além de advogado e militante dos direitos humanos. Na última pesquisa eleitoral o candidato à Prefeitura de Fortaleza teve 3% das intenções de voto.
Esta é a segunda, de uma série de quatro entrevistas que o Brasil de Fato realiza com os candidatos à Prefeitura de Fortaleza. O candidato respondeu perguntas sobre emprego e renda, meio ambiente, segurança pública, educação e saúde.
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Renato Roseno afirma que é preciso ter uma política permanente de recuperação econômica com promoção de trabalho e renda, “a crise só não está mais exposta neste momento por conta do auxílio emergencial, pelo qual o PSOL lutou arduamente na Câmara Federal. Por isso, nossa primeira resposta será a garantia de renda básica”.
“O lugar do município é o da prevenção social, não de repressão. Se os homicídios dos jovens negros da periferia são uma realidade previsível, como indicam todos os dados que há anos o Comitê tem produzido, ela é, portanto, prevenível”, afirmou Renato Roseno sobre a questão da violência na Capital.
O candidato acredita que a saúde da população é resultado de vários determinantes, como moradia, segurança alimentar, acesso a água e saneamento, entre outros, “a pandemia do novo coronavírus provou mais uma vez que esses fatores são determinantes, a mortalidade em bairros da periferia foi bem maior do que nos bairros mais ricos da cidade".
"Por isso, precisamos reforçar que saúde é um direito e não uma mercadoria, e, sobretudo, defender o Sistema Único de Saúde, combatendo o subfinanciamento, a precarização das relações trabalhistas e a privatização, que tem se dado também por meio da contratação das chamadas Organizações Sociais”, acrescentou.
Confira a entrevista na íntegra
Brasil de Fato - Fortaleza teve uma retração no emprego de 7,3% em um ano. Com a pandemia de coronavírus houve um acréscimo ainda maior no número de desempregados na capital. Como você enxerga a forma de recuperar esses postos de trabalho em Fortaleza?
Renato Roseno - O aumento na pobreza e a permanência da crise mostram que é preciso ter uma política permanente de recuperação econômica e promoção de trabalho e renda. A crise só não está mais exposta neste momento por conta do auxílio emergencial, pelo qual o PSOL lutou arduamente na Câmara Federal. Por isso, nossa primeira resposta será a garantia de renda básica. Vamos iniciar garantindo esse direito a mulheres em situação de pobreza e com filhos pequenos.
Fortaleza precisa ter um plano de economia solidária construído com participação popular
Além disso, precisamos de uma economia que reflita também os novos desafios, como o desemprego e a crise ambiental. Fortaleza precisa ter um plano de economia solidária construído com participação popular e que dê conta de aumentar o nível de atividade econômica, trazendo para a esfera produtiva centenas de milhares de trabalhadores e trabalhadoras que hoje se encontram desempregados ou em subempregos. Congregaremos, com isso, produtores e produtoras em torno dos nossos territórios, fomentando a criação de cooperativas capazes de gerar renda para nossas comunidades.
Vamos incentivar a reconversão de empregos precários para papéis sociais fundamentais no combate à crise sanitária, econômica, humanitária e ambiental, bem como de construção de transição energética, de formulação e implementação de energias renováveis, com foco na solarização dos bairros, e de proteção ambiental. Regulamentar as empresas de aplicativos, conferindo direitos a trabalhadores e utilizando recursos para construir fundo municipal de apoio a eles. Também faremos apps públicos de transporte e hospedagem.
Fortaleza é uma cidade inteligente, que pode desenvolver softwares e outros serviços vinculados à economia digital. Por isso, queremos criar centros tecnológicos nas periferias para a formação de jovens. Para obter recursos, é preciso inverter prioridades e também cobrar dívidas das grandes empresas, ampliando a capacidade de investimento da Prefeitura. A mudança passa ainda pela tributação, com redução da carga para os mais pobres.
Um dos interesses que vem crescendo entre os eleitores é pauta ambiental. Neste ano houve uma tentativa de destruir uma área verde localizada no bairro da Sabiaguaba, no local seria construído um empreendimento imobiliário. Após pressão popular o poder público retrocedeu na sua decisão, mas outras demandas ainda seguem pertinentes, como a preservação das dunas e dos parques, como o do Cocó. Como você pretende, caso eleito, mediar a preservação da natureza e o desenvolvimento em Fortaleza?
Como deputado estadual, realizei várias audiências sobre o Parque do Cocó, que se estende também para a área da Sabiaguaba, lutando para que o decreto de criação do parque abrangesse essa e outras áreas que deveriam ser protegidas, mas que o governo estadual optou por deixar de fora do parque. Há anos, a pauta ambiental é um das áreas de atuação do nosso mandato.
Em julho, representamos junto ao Ministério Público pela suspensão imediata das autorizações concedidas para o loteamento anunciado para as Dunas da Sabiaguaba. Desde nosso primeiro mandato, lutamos contra o agronegócio, tendo conquistado, junto aos movimentos sociais, a lei que proibiu a pulverização aérea de venenos. Também garantimos reconhecimento da contribuição dos povos indígenas do Ceará, ressaltando, inclusive, a relação que possuem com a natureza. Como candidato a prefeito, a questão ambiental segue como um dos eixos norteadores.
Para encarar a emergência climática, social e ecológica, defendemos um plano de descarbonização de Fortaleza, bem como a conservação de ecossistemas e do patrimônio natural da cidade. Por isso, vamos atuar para a preservação de dunas fixas e móveis, impedindo o acelerado avanço da impermeabilização e verticalização das dunas da Praia do Futuro e as margens dos rios Cocó, Pacoti e Ceará.
A perspectiva ambientalista e do bem viver deve se expressar também no planejamento da cidade
A perspectiva ambientalista e do bem viver deve se expressar também no planejamento da cidade, priorizando a construção de uma Fortaleza que contribua no combate às mudanças climáticas, ao fortalecimento de sistemas de economia circula e local e a implementação de sistemas de energia descentralizados, como por meio de cooperativas de energia solar, já orçadas e plenamente viáveis.
Nossa proposta é ainda incentivar investidores a priorizar o transporte público elétrico nas cidades, garantindo ainda que novos projetos habitacionais não sejam construídos em detrimento de ecossistemas como nossos manguezais. Um programa de descarbonização pode implementar medidas de alto impacto social no clima que alcancem benefícios ambientais, sociais, econômicos e de saúde significativos, principalmente em comunidades vulneráveis e de baixa renda. Precisamos renaturalizar os corpos hídricos. Em vez de encaixotá-los, aterrando lagoas e rios, como Fortaleza tem feito, temos que renaturalizar.
Uma cidade mais saudável para si própria é uma cidade mais saudável para o habitante da cidade. Um processo de recuperação do Maranguapinho e do Siqueira pode devolver lugares de usufruto que vão ser importantes pra melhoria social. Vamos solarizar a cidade e ampliar as áreas verdes. Temos que estimular também os microparques, que são pequenas áreas verdes, em todas as regionais. Para tudo isso, é preciso ter também política de educação ambiental que nos leve a superar a ideia de que sociedade e natureza não são uma coisa só.
Os assassinatos de adolescentes em Fortaleza tiveram um aumento de 163% só no primeiro semestre de 2020, segundo o Comitê Cearense pela Prevenção de Homicídios na Adolescência, além de aumento em mortes violentas, no geral. Um dos principais motivos da escalada da violência é a disputa entre as facções, que aliciam a juventude das periferias. Quais proposições sua candidatura tem para enfrentar a violência e o aliciamento da juventude em Fortaleza?
Somente este ano, 180 crianças e adolescentes de 10 a 19 anos foram assassinados. A situação é alarmante. Os dados são do Comitê Cearense pela Prevenção de Homicídios na Adolescência, do qual sou presidente. O lugar do município é da prevenção social, não de repressão. Se os homicídios dos jovens negros da periferia é uma realidade previsível, como indicam todos os dados que há anos o Comitê tem produzido, ela é, portanto, prevenível.
O lugar do município é da prevenção social, não de repressão
O que salta aos olhos é que o Estado camburão chega antes do Estado promoção. Nosso compromisso é chegar com cultura, lazer, esporte, políticas de prevenção social nos territórios mais vulnerabilizados. Hoje, a prefeitura tem gastado muito dinheiro em repressão, orçamento que cresce em uma velocidade muito maior do que a dos investimentos em educação. Vamos focar em prevenção, construindo uma ação combinada entre as políticas de assistência social e de trabalho.
A gestão municipal precisa fortalecer os espaços de participação social, adotando uma relação mais horizontalizada com a sociedade. O primeiro passo nesse sentido é a constituição de Redes de Proteção Social (RPS) nas periferias de Fortaleza, visando à integração da atuação do poder público, da sociedade civil e da população.
Outras propostas são: criação do Plano Municipal de Prevenção às Violências e Promoção da Segurança Cidadã, com transparência das rubricas na Lei Orçamentária Anual; criação de coordenação especial de projetos de prevenção à violência dentro do gabinete do Prefeito para facilitar a coordenação com a Secretaria Municipal de Segurança Cidadã; implementação das recomendações do Comitê Cearense de Prevenção dos Homicídios na Adolescência, que têm como foco medidas de prevenção à violência; desmilitarização da Guarda Municipal, ampliando seu papel de Guarda Civil para a cidadania e para a prevenção à violência.
No início de 2020 a Justiça Estadual, a pedido do Centro de Defesa da Criança e do Adolescente (Cedeca) em parceria com o Ministério Público do Ceará, determinou a ampliação das vagas em creches. No início de 2019, segundo levantamento do Cedeca, mais de cinco mil crianças não conseguiram vagas em creches. Como conseguir zerar o déficit de vagas na educação infantil na capital?
Foi acertada a determinação da ampliação de vagas em creches pelo Cedeca. A medida busca zerar a fila de sete mil crianças por creche. Para isso, temos apresentado constantemente como uma de nossas principais frentes de atuação a ampliação da rede de educação infantil, a fim de atender a demanda reprimida em quatro anos, por meio da construção e manutenção de 80 Centros de Educação Infantil na rede municipal, com profissionais qualificados.
Precisamos ampliar também matrículas em creches em tempo integral, de modo a atingirmos 50% de cobertura para essa sub etapa da educação básica. É fundamental garantir o funcionamento de creches e escolas nas regiões da cidade economicamente mais pobres para promover a segurança das crianças e a tranquilidade das mulheres que precisam trabalhar.
Durante a pandemia de covid-19 ficou claro a importância do Sistema Único de Saúde para a contenção da doença e o atendimento daqueles contaminados pela mesma. Uma das obrigações do município para com o SUS é a atenção primária, que é responsável pelos postos de saúde, programa de saúde da família, agentes comunitários de saúde, entre outras. Quais principais problemas você enxerga na gestão da saúde em Fortaleza e quais possíveis soluções você pode apresentar?
A saúde da população é o resultado de uma soma de vários determinantes. Não podemos falar de saúde sem considerar que moradia, segurança alimentar, acesso a água e saneamento, renda básica são fatores fundamentais no adoecimento da população. A pandemia do novo coronavírus provou mais uma vez que esses fatores são determinantes, a mortalidade em bairros da periferia foi bem maior do que nos bairros mais ricos da cidade.
Por isso, precisamos reforçar que saúde é um direito e não uma mercadoria, e, sobretudo, defender o Sistema Único de Saúde, combatendo o subfinanciamento, a precarização das relações trabalhistas e a privatização, que tem se dado também por meio da contratação das chamadas Organizações Sociais.
Precisamos reforçar que saúde é um direito e não uma mercadoria
No nosso mandato de deputado estadual, aprovamos o Projeto de Lei que criou o Programa de diretrizes de atenção às populações vulneráveis durante epidemias. Estabelecimentos privados ficaram proibidos de praticar preços abusivos para materiais de proteção. Foram garantidos produtos de higienização. Na prefeitura, vamos fortalecer o SUS e atender quem mais precisa.
Nosso foco será efetivamente a atenção básica em saúde, apoio à saúde da família, com o propósito de desenvolver ações integradas de clínica e saúde coletiva. Por isso, precisamos ampliar as equipes de saúde da família, buscando fortalecer o diálogo da atenção básica em saúde com as outras redes de atenção à saúde e as políticas sociais.
Outras propostas são: valorizar profissionais de saúde, promovendo concurso público para todas as áreas, a começar por equipes de saúde da família; criar rede sanitária capaz de mapear problemas; ampliar o atendimento multidisciplinar nos postos de saúde e investir em tecnologia de informática para melhorar prontuário eletrônico. Por fim, saúde mental é coisa séria. O tratamento privado é caro. Priorizaremos ampliação da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS), com financiamento municipal.
Fonte: BdF Ceará
Edição: Monyse Ravena e Rebeca Cavalcante