No dia 8 de maio deste ano, Alexandre Modonezi de Andrade, chefe da Secretaria Municipal das Subprefeituras, solicitou à Prefeitura de São Paulo que nomeasse 138 profissionais aprovados em edital para os cargos de engenharia (71), arquitetura (35) e agronomia (32). O pedido do secretário foi ignorado pelo prefeito Bruno Covas (PSDB), que não fez nenhuma contratação.
Em seu ofício, Modonezi alerta a prefeitura de que a escassez desses trabalhadores concursados “tem promovido a morosidade na análise e conclusão dos procedimentos administrativos de competência destas unidades [subprefeituras]”.
“Atualmente encontramos muitas dificuldades na prestação de serviços técnicos de serviços de zeladoria e obras por falta desses profissionais", ressalta.
O secretário também destaca no ofício que a convocação dos técnicos "traria a estes órgãos melhores condições de trabalho para atendimento das diversas demandas decorrentes dessas áreas específicas”.
"As subprefeituras especificamente necessitam de engenheiros civis e arquitetos, pois desenvolvem serviços de análise de processos de aprovação de plantas, de certificado de conclusão, de auto de licença de funcionamento, de certificado de acessibilidade e outros", diz o documento.
"Além disso, são responsáveis por vistorias técnicas, a fim de verificar a execução da obra de acordo com o projeto aprovado e verificação da estabilidade dos imóveis", ressalta Modonezi no ofício encaminhado à prefeitura.
O secretário lembra o governo municipal que “tais serviços, por lei, são de competência exclusiva destes profissionais”, afastando a possibilidade de que a prefeitura envie terceirizados para cumprir as funções, prática adotada por Covas e denunciada pelo Brasil de Fato.
Modonezi explica à prefeitura que os técnicos são os “responsáveis diretos ao atendimento das metas do Plano de Metas da Prefeitura do Município de São Paulo.”
Entre as metas estabelecidas pela prefeitura para a gestão de Bruno Covas (2016-2020), está construir e recuperar 1, 5 milhão de metros quadrados de calçadas, recapear 3, 6 milhões de metros quadrados de vias públicas, tapar 540 mil buracos, liberar 5 áreas críticas com concentração histórica de ambulantes, limpar 2,8 milhões de metros quadrados de margens de córregos, entre outros. Os objetivos listados dependem de arquitetos, engenheiros e agrônomos.
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O edital 00/2018, anunciado em 9 de outubro de 2018 e homologado no dia 27 de agosto de 2019, resultou na aprovação de 563 profissionais, sendo 183 engenheiros civis, 216 arquitetos, 96 agrônomos, 10 engenheiros do trabalho e 63 engenheiros florestais. Nenhum foi nomeado pelo prefeito Bruno Covas até o momento e aguardam há dois anos na fila.
Em entrevista ao Brasil de Fato, uma arquiteta que ocupa um alto cargo na Prefeitura de São Paulo, e que preferiu não se identificar, explicou a relevância desses técnicos para o município.
“Apesar de ser considerada uma profissão duplamente elitista [servidor público e arquiteto/engenheiro], nossa categoria é fundamental para as bases mais sólidas do desenvolvimento da cidade", avalia.
A arquiteta explica que a atribuição desses cargos prevê "desde a tão comentada atualização do Plano Diretor Estratégico, aprovações de alvarás para construção (sejam de interesse social ou imobiliário), fiscalização e defesa civil, avaliação de bens tombados, avaliação de impactos urbanísticos na mobilidade e na sustentabilidade da cidade”.
Déficit
A Lei Municipal 16.414, de 2016, determina que a prefeitura mantenha em seus quadros 2.034 engenheiros, arquitetos e geólogos. Porém, hoje o governo mantém apenas 1.032 desses profissionais sob contratação e 1.002 vagas abertas, de acordo com dados disponibilizados pela gestão de Covas, via Lei de Acesso à Informação (LAI).
O déficit da Secretaria Municipal de Subprefeituras não é o único ignorado por Bruno Covas. Outras sete secretarias solicitaram esses profissionais à Prefeitura de São Paulo, mas não tiveram sucesso.
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A Secretaria Municipais de Habitação (Sehab), solicitou 50 profissionais, em setembro de 2019; a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano (SMDU), pediu 30, em outubro 2019, a Secretaria do Verde e Meio Ambiente (SVMA), anunciou que precisava de 16, em novembro de 2019; a Secretaria Municipal de Segurança Urbana (SMSU), declarou que precisava de seis técnicos, em janeiro de 2020; a Secretaria Municipal de Cultura (SMC), pleiteou 12, em fevereiro de 2020; a Secretaria Municipal de Infraestrutura Urbana (Siurb), requisitou 16, em março de 2020; e a Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social (SMADS), reivindicou seis, em setembro de 2020. Não foram atendidas e a fila do edital 00/2018 seguiu intacta.
Desigualdade
Hoje, a Secretaria Municipal de Subprefeituras conta 173 engenheiros civis. A distribuição dessa mão de obra, feita pela prefeitura, mostra uma desigualdade no atendimento das áreas ricas e pobres no município.
Em Ermelino Matarazzo e Sapopemba, na periferia da zona leste de São Paulo, não há engenheiros para atender a população local. Na outra ponta, as Subprefeituras da Vila Mariana e Lapa, áreas ricas na zona sul e oeste da capital paulista, possuem 11 e 6 engenheiros, respectivamente.
Um engenheiro que trabalha na Prefeitura de São Paulo, e que também preferiu não se identificar, explicou os prejuízos causados pela ausência desses técnicos.
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“A subprefeitura de Sapopemba não tem dinheiro, mas ela administra um território que não tem engenheiros para aprovar obras ou fazer despacho de projetos. Pode ser que você fique anos sem ter obra na região”, explica.
Ele cita, a título de exemplo que, "se você está em Guaianases e precisa aprovar um projeto, hoje não tem um arquiteto responsável para receber o projeto e dar seguimento. Ou mesmo para receber a população e tirar dúvidas sobre obras".
"Como você vai expedir um alvará se você não tem um engenheiro naquela localidade? Fica muito complicado fazer a gestão desse território, fica um local sem regularidade urbana”, lamenta o engenheiro.
Outro lado
Em nota, a Prefeitura de São Paulo afirmou que a solicitação feita pelo secretário Alexandre Modonezi de Andrade, em maio deste ano, "está em análise".
Sobre não ter empossado nenhum dos concursados do edital 00/2018, o governo municipal respondeu que "as autorizações de nomeações dos candidatos aprovados em concurso público da Prefeitura de São Paulo ocorrem em número que atenda ao interesse e às necessidades do serviço, mediante solicitação das secretarias interessadas, no decurso do prazo de vigência de cada concurso, conforme estabelecido em edital."
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A Prefeitura informou que "a Secretaria Municipal das Subprefeituras possui 369 engenheiro e arquitetos. A Secretaria Municipal de Infraestrutura Urbana e Obras conta com 45 engenheiros, 10 arquitetos e 2 geólogos. A Secretaria Municipal de Segurança Urbana possui 19 servidores com certificação do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (CREA) da carreira de QEAG - (Quadro tecnico de profissionais de engenharia, arquitetura, agronomia e geologia) - na Coordenadoria Municipal de Defesa Civil são 2 engenheiros.
A Secretaria Municipal de Habitação possui 19 engenheiros, 45 arquitetos e 1 geólogo e afirma que "reduziu a mediana de tempo de aprovação de alvarás de obras na cidade de 532 dias, em dezembro de 2016, para 291 dias, em dezembro de 2019, uma queda de 45% em relação ao início da gestão."
O Brasil de Fato questionou o governo sobre o critério adotado para definir quais subprefeituras terão engenheiros em seu quadro de funcionários e também sobre a vacância de 1.032 engenheiros, arquitetos e agrônomos, o que descumpre a Lei 16.414. A Prefeitura não respondeu aos dois questionamentos.
Edição: Leandro Melito