Coluna

O Brasil das eleições municipais de 2020

Imagem de perfil do Colunistaesd
Esse debate haverá de ser protagonizado por todos que possuem compromisso com nosso desenvolvimento, a fim de nos livrar da condição subalterna - Marcelo Camargo / Fotos Públicas
O caminho para a esquerda brasileira ainda está por ser construído

Por Martonio Mont’Alverne Barreto Lima*

As eleições municipais são uma de nossas mais marcantes características, principalmente em razão de termos a única Constituição onde o poder local integra a Federação, sem distinção hierárquica, porém com competências diferentes.

Reflexões clássicas como a de Victor Nunes Leal, Francisco José de Oliveira Vianna, e Maria Isaura Pereira de Queiroz dedicaram-se ao estudo do poder local e seus impactos na vida nacional.

No cenário do poder da comunicação atual, não parece que estas eleições municipais tenham a capacidade de determinar o que acontecerá com as próximas eleições nacionais de 2022. Mas o que se deu no panorama eleitoral municipal de 2020 oferece pistas do que está por vir.

Diante das significativas perdas eleitorais e políticas da esquerda e da centro-esquerda brasileiras de 2018, o que se viu em 2020 foi um alerta: se sinalizou o fim das perdas da esquerda em geral, por outro lado o que se viu foi o crescimento da direita.

Não me parece acertado crer que uma “direita fascista” tenha perdido espaço para uma direita liberal. O crescimento de partidos como DEM e PSD revelam que o velho PFL, egresso da antiga Arena do regime militar, se fortaleceu. Dizer que tais origens culturais e políticas possuem compromisso com a manutenção da democracia e sua ampliação é outra conversa.

Leia também: Ataques hackers ao TSE têm características da extrema direita, afirma pesquisador

Por esta razão, é que o caminho para a esquerda brasileira ainda está por ser construído, e é razoável compreender que as eleições municipais de 2020 fizeram soar o sinal de que algo necessita ser realizado, de forma urgente, sem perder a visão de que o enfrentamento deve começar agora.

A vitória desta velha direita encoraja, por exemplo, o avanço da reforma administrativa na pauta do Congresso Nacional, cuja direção a determinar o compasso da reforma se acha nas mãos do DEM; detentor das presidências do Senado Federal e da Câmara dos Deputados.

Todos sabemos que o centro da reforma administrativa é a diminuição do poder do Estado, ou seja do poder público, para que se fortaleça o poder político privado sobre o interesse público. Em outras palavras: a reforma administrativa pretende vender o interesse privado como se fosse interesse e bem de todos, enquanto na verdade é o enriquecimento privado, destituído de qualquer noção de soberania nacional.

Leia também: Vereadoras negras e trans estão entre as candidaturas mais votadas em 13 capitais

Óbvio que o crescimento do setor da velha direita não encontrará obstáculos significativos para se recompor com a moderna direita que se apresenta até como social-democrata. O lado progressista da política nacional precisa compreender que a pausa no seu descenso eleitoral e político desde 2018 poderá continuar em 2022.

O que se mostra como alternativa real haverá necessariamente de enfrentar, mais que a união de toda a esquerda, o retorno aos sindicatos, às organizações populares, às lutas cotidianas dos centos urbanos e pela compreensão do funcionamento do complexo poder do Estado brasileiro, capturado por correntes de pensamentos antissoberania e contrárias ao desenvolvimento nacional, seja ele político ou econômico.

Já parece evidente a disposição dos setores conservadores brasileiros em violar as regras do pacto que eles mesmo celebraram em nome do bloqueio aos interesses econômicos e sociais mais amplos.

Leia também: Eleições 2020: 58 quilombolas são eleitos em diferentes estados brasileiros

É aqui que a abertura constante de debates desempenhará um papel crucial. Esse debate haverá de ser protagonizado por todos que possuem compromisso com nosso desenvolvimento, a fim de nos livrar da condição subalterna em que nos encontramos hoje e reafirmar a capacidade do Brasil e de seu povo de atingir outro nível de organização política.

*Martonio Mont’Alverne Barreto Lima é Professor Titular da Universidade de Fortaleza e Procurador do Município de Fortaleza. Jurista membro da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia.

** Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Leandro Melito