"O Fundeb [Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação] quase foi vítima da insanidade bolsonarista." O relato do dirigente da Campanha Nacional Pelo Direito à Educação, Daniel Cara, nesta sexta-feira (18), tem um tom de alívio. Um dia antes, a Câmara dos Deputados aprovou o principal mecanismo de financiamento da educação básica no país sem os trechos que tirariam R$ 16 bilhões da rede pública para escolas filantrópicas e ligadas a igrejas.
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"O resultado disso, concretamente, é que a gente vence em um debate parlamentar, pela primeira vez na história da educação brasileira, de que para ensino fundamental e ensino médio não pode ter conveniamento", explica Cara. "A Constituição veda o conveniamento quando tem oferta de vagas públicas, mas não é tão incisiva quanto o resultado da votação dos dias 15 e 17 desta semana. Então, de certa forma, a gente faz jus à luta de Florestan Fernandes, que tentou essa aprovação em 1961, na LDB [Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional], e não conseguiu."
Considerado o patrono da sociologia brasileira, Florestan Fernandes (1920-1995) foi deputado constituinte e um defensor incansável do direito à educação.
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Mobilização histórica
"A terceira versão do relatório do [deputado Felipe] Rigoni [PSB] era muito parecida com o absurdo privatista que a Câmara dos Deputados aprovou, mas ele fez um acordo com a oposição que retirou os mecanismos privatistas na quarta versão", lembra o dirigente da Campanha.
"Porém, esses absurdos foram recolocados pelo bolsonarismo e por parte dos aliados do [deputado] Rodrigo Maia [DEM]. Então, nós vivemos a maior mobilização de rede social da história da educação brasileira".
Daniel Cara conta que, entre sexta (11) e terça-feira (15), quando ocorreu a votação no Senado, foram enviadas mais de três mil mensagens para cada senador pelo Whatsapp. Nas redes sociais, foram mais de 90 mil citações à matéria e à #FundebÉPúblico. "Assim, a gente conseguiu que o Senado retomasse o texto original do quarto relatório do Rigoni, e a Câmara aprovou ontem [17]", celebra.
Nós vivemos a maior mobilização de rede social da história da educação brasileira
Promulgado em agosto pelo Congresso Nacional, o novo Fundeb passa a fazer parte da Constituição e torna-se um fundo permanente a partir de janeiro. Antes, o fundo tinha prazo de validade e acabaria no fim de 2020.
A aprovação do novo Fundeb, embora importante, não retira a necessidade de revogação do "Teto de Gastos" para diminuir a desigualdade no acesso ao conhecimento. "O Paulo Guedes [ministro da Economia] muitas vezes tentou colocar a pauta do Fundeb contra a pauta da revogação da Emenda Constitucional 95/2016 [que instituiu o Teto]. Não faz sentido", analisa Cara.
"Porque, em um bairro cheio de vulnerabilidades, mesmo que o estudante esteja em sala de aula, o aprendizado vai ser menor. A educação sozinha não consegue resolver os problemas da sociedade, e nós vamos seguir na luta pela revogação dessa emenda", finaliza.
O novo Fundeb ainda depende da sanção presidencial.
Edição: Rodrigo Chagas