O genocídio da população negra e o assassinato de Beto Freitas, 40, homem que foi espancado até a morte por seguranças de uma unidade do Carrefour em Porto Alegre (RS), foram lembrados novamente neste domingo (20), em um ato ecumênico e virtual. Religiosos e lideranças de organizações de direitos humanos deram as mãos para bradar contra o racismo no país.
A data marca o aniversário de um mês da morte de Freitas, rememorada no sábado (19), e reforça o chamado para a luta contra a desigualdade racial e o genocídio da população negra.
“Convocamos toda a sociedade para fazer o debate, pois não há possibilidade de uma superação efetiva do racismo sem organização política de negras e negros”, disseram os organizadores em um texto lido no início do evento.
A militante Winnie Bueno, da Coalizão Negra por Direitos, destacou que as mortes de pessoas negras causadas por violência física saltaram 59% nos últimos oitos anos no país. A estatística é 45 vezes maior que os índices desse tipo de morte entre a população branca.
“Esses números são resultado do cotidiano do racismo, da naturalização da morte de pessoas negras, da desumanização de homens, jovens, mulheres e crianças negras. Isso precisa parar. É hora de darmos um basta no genocídio da população negra”, convocou a ativista.
A budista Monja Coen lembrou que casos como o de Beto Freitas se multiplicam e constituem uma faceta de destaque da cultura do racismo que marca o Brasil.
“O que aconteceu com Beto não é desculpável. É preciso que isso não aconteça mais. Ele é símbolo de inúmeros afrodescendentes exterminados diariamente. O racismo existe e temos que combatê-lo. A única forma é nos manifestando pacificamente pela inclusão, pelo respeito à vida em sua pluralidade”, disse, ao lembrar o preconceito contra negros e indígenas.
Dom Zanoni Demttino Castro, da Pastoral Afro-Brasileira, que integra a Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), afirmou que “não se pode tolerar nem fechar os olhos diante de nenhuma forma de racismo e exclusão”.
O caso de Beto Freitas impulsionou uma série de protestos antirracistas pelo país no ultimo mês, com manifestações nas diferentes regiões. Ao todo, seis pessoas envolvidas na morte foram indiciadas e os dois seguranças que espancaram a vítima no estacionamento do Carrefour foram presos preventivamente. O caso segue em análise por parte do Ministério Público e do Judiciário.
“Por isso somente a nossa pressão e a mobilização social podem impedir que esse caso do Beto Freitas se transforme em apenas mais um”, bradou Matheus Gomes, vereador eleito pelo Psol em Porto Alegre (RS), durante a mobilização deste domingo (20).
São Bernardo do Campo
Uma outra manifestação, desta vez pelas ruas de São Bernardo do Campo, na Grande São Paulo, lembrou outro caso de assassinato, o do motorista de aplicativo Flavio Santos de Amorim, de 30 anos, também negro. Morto no ultimo dia 12, ele foi alvo de tiros por parte de agentes da Guarda Civil Municipal (GCM) e da Polícia Militar dos quais teria tentado fugir durante uma blitz pelas ruas da cidade.
O motorista faria 31 anos neste domingo, data que familiares e amigos escolheram para fazer um protesto nas imediações da prefeitura local. Eles tratam o caso como racismo e pediram paz nas comunidades. O caso envolve a participação de cinco guardas municipais e um policial militar, que chegaram a ser presos e estão sob investigação.
Em entrevista ao Brasil de Fato, Fernando Santos de Amorim, irmão da vítima, condenou a atitude dos agentes, afirmando ainda que os acusados seriam despreparados para a função. “Houve varias versões – falaram que ele estava armado, que o carro era roubado, aí depois falaram que achavam que estava armado. E fizeram o quê? Executaram meu irmão”, contou, emocionado.
A família rechaça as narrativas que os agentes teriam tentado emplacar a respeito da vítima. “Nós vendíamos coxinha com 9 anos de idade. Minha mãe, sempre lutando, criou todos nós sozinha. Todos nós nunca precisamos roubar. Ele [Flávio] sempre trabalhou e nunca teve passagem pela polícia, não andava armado e não tinha arma”, contrapôs o familiar.
“Os agentes foram presos e depois soltos. Isso não é justiça. Nós queremos justiça, todos na cadeia”, afirmou outro irmão da vítima, Fábio Santos de Amorim.
Sobre o caso, a Prefeitura de São Bernardo disse, após o assassinato, que “não compactua com nenhuma forma de abuso cometido pelos guardas e instaurou procedimento interno para apurar a conduta dos envolvidos, por meio da Corregedoria da Guarda Civil Municipal”.
*Com colaboração de Douglas Matos.
Edição: Marina Duarte de Souza