"Projeto de morte"

Camponesas denunciam: povo passa fome e Bolsonaro nega auxílio à produção de comida

Segundo nota do MMC, campesinato quer produzir alimentos, mas governo federal segue ignorando apelos da classe

Brasil de Fato | Porto Alegre (RS) |
Agricultora em feira com alimentos produzidos pelo assentamento Dom Helder, no município de Murici, em Alagoas - Edcleide da Rocha Silva/MMC

O Movimento de Mulheres Camponesas (MMC) divulgou nota, pública na tarde de terça-feira (22), denunciando a situação de fome a que o povo brasileiro está sendo sujeito e o descaso do governo Bolsonaro que segue negando qualquer tipo de auxílio ao campesinato.

Saiba mais: Com a volta da fome no país, ONGs e movimentos populares alimentam o povo no Natal

As famílias agricultoras, responsáveis pela produção de mais de 70% dos alimentos que chegam às casas brasileiras, viram o presidente vetar os principais dispositivos do PL 735/2020, aprovado pelo Congresso, que possibilitava acesso dos camponeses a auxílios para manter sua produção.

"Nós, camponesas organizadas no MMC, estamos em luta permanente pela derrubada dos vetos, pois entendemos que vetar as ações que potencializam a produção de alimentos amplia a fome", diz um trecho da nota.

As camponesas questionam, ainda, a postura do Congresso Nacional, que votou a previsão orçamentária de 2021 sem, no entanto, analisar os vetos de Jair Bolsonaro (sem partido) – desde o fim de agosto deste ano – e restituir as medidas de socorro à agricultura familiar.

Relembre: Bolsonaro veta socorro para pequenos produtores, mas libera benesses para o 'agro'

"Com essa manobra que em si já é um absurdo, mas quando no meio desses vetos estão políticas públicas que podem ampliar a produção de alimentos em um país que além de uma pandemia sanitária enfrenta um mal histórico, que é a FOME, o Congresso Brasileiro se torna cúmplice e sócio do governo Bolsonaro no financiamento da barbárie", denunciam. 

Confira a íntegra da nota do MMC:

Movimento de Mulheres Camponesas denuncia: O povo brasileiro passa fome e Bolsonaro nega auxílio ao Campesinato para produzir alimentos

“A tontura da fome é pior do que a do álcool. A tontura do álcool nos impele a cantar. Mas a da fome nos faz tremer. Percebi que é horrível ter só ar dentro do estômago”. Carolina de Jesus

Nós, mulheres camponesas, queremos chamar a atenção da sociedade sobre o que estamos passando no nosso país. Não é novidade para ninguém que no Brasil há uma enorme desigualdade social e que o mínimo de demandas sociais implantados pelos governos progressistas levou a uma construção de um discurso de ódio contra as pessoas pobres. Se alguém ainda acreditava que o racismo, o machismo e o elitismo à brasileira eram cordiais, agora não consegue mais se iludir. A violência tem se expressado de forma ainda mais contundente todos os dias e agora conta com uma grande identificação entre essas pautas e quem está no governo federal.

Queremos denunciar o projeto de morte que amplia a fome no Brasil, dia após dia. Antes da pandemia da COVID-19 chegar ao nosso país, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) já apresentava um quadro de ampliação da fome no Brasil muito preocupante. Os dados coletados em 2017 e 2018 e apresentados em 2019, revelam que havia 10,3 milhões de pessoas sem acesso regular à alimentação básica, 5% das famílias brasileiras em situação de insegurança alimentar grave, e que mais da metade dessas famílias eram chefiadas por mulheres e vivem no Nordeste brasileiro.

Quando a pandemia chegou, rapidamente os partidos de esquerda se articularam com objetivo de garantir um auxílio para que as famílias pudessem se isolar e não passar fome. O governo federal disse que só poderia pagar R$ 200,00, os partidos de esquerda propuseram R$1.200,00, o Congresso aprovou R$ 500,00 e o governo pagou R$ 600,00 por três meses, mas logo reduziu pela metade. Essa ação foi importante e teve um impacto muito positivo em um país com tamanha desigualdade social, mas sem incentivo a produção e distribuição de alimentos, sabíamos que ia faltar comida e com certeza os produtos da cesta básica brasileira iriam ficar muito caros. Quem faz da comida um negócio e não um modo de vida como fazemos nós, camponesas, iria buscar lucrar com esse cenário.

Na busca por ter alimentos para todos e todas, o campesinato brasileiro fez muitas ações de solidariedade, mas sabendo dos limites dessa ação, se organizou e os diversos movimentos sociais do campo, das florestas e das águas elaboraram um projeto de Lei que visava se antecipar para o enfrentamento ao risco de desabastecimento, alta no preço dos alimentos e ampliação ainda maior da fome. Iniciativa ágil e muito importante, porém, faz-se necessário salientar que antes das mulheres desses movimentos e os movimentos de mulheres entrarem no debate, não foi pensado nenhuma ação específica para as mulheres mesmo sendo elas as principais produtoras de alimentos que vão para a mesa do povo brasileiro. Mas nós mulheres nos organizamos, avaliamos a proposta e a ampliamos garantindo políticas públicas especificas para mulheres e para povos e comunidades tradicionais. Lutamos até o último momento para que a Lei deixasse estabelecido que os recursos destinados pela mesma deveriam produzir apenas alimentos saudáveis.

O Projeto de Lei (PL 735/2020) não ficou como nós camponeses e camponesas queríamos, mesmo assim apresentou propostas muito importantes para o enfrentamento dessa crise alimentar causada pelo abandono das políticas públicas voltadas a agricultura familiar por parte do governo federal. O PL 735/2020 foi aprovado na Câmara e no Senado Federal, virou Lei Assis Carvalho (deputado que sempre lutou pela agricultura familiar em especial do Nordeste). Ela instituiu que os agricultores familiares em toda sua diversidade (assentados/as; indígenas; quilombolas; fundos de pasto; extrativistas, pescadores etc) pudessem acessar o auxílio emergencial que foi concedido apenas para quem estava na extrema pobreza ou era profissional autônomo; fomento produtivo para ampliar a produção de alimentos e evitar o desabastecimento dos mercados locais; concessão automática do garantia-safra; Programa de Aquisição de Alimentos emergencial para levar os alimentos produzidos a quem mais precisa; apoio específico para as camponesas; prorrogação, rebates e suspensão das dívidas e uma linha emergencial de crédito.

Contudo, Bolsonaro VETOU praticamente todos esses dispositivos da lei, impedindo o socorro às famílias camponesas e a própria sociedade. Quando ouvimos falar que a necropolítica era uma política que a partir do neoliberalismo colocava a vida em último plano nas demandas do Estado, não imaginávamos que chegaríamos no que o Brasil passa hoje.

É PRECISO DENUNCIAR PARA O MUNDO TODO: o governo Bolsonaro, em um país com quase 200 mil mortos pela COVID-19, com uma ampliação da violência contra as mulheres jamais vista, um quadro de desemprego e subemprego que aumenta a cada dia, e com a volta da fome, da qual ainda não sabemos o tamanho pois os órgãos de governo não apresentam dados, IMPEDE que as camponesas e camponeses possam ampliar sua produção e consigam contribuir na diminuição da fome. IMPEDE que indígenas e quilombolas sejam protegidos e tenham seus territórios preservados.

Nós, camponesas organizadas no MMC, estamos em luta permanente pela derrubada dos vetos, pois entendemos que vetar as ações que potencializam a produção de alimentos amplia a fome. Vimos com preocupação, mas infelizmente não com surpresa, o Congresso passar por cima da Constituição brasileira e votar a Lei de Diretrizes Orçamentarias (LDO) para o próximo ano sem que os vetos do presidente fossem apreciados. Com essa manobra que em si já é um absurdo, mas quando no meio desses vetos estão políticas públicas que podem ampliar a produção de alimentos em um país que além de uma pandemia sanitária enfrenta um mal histórico, que é a FOME, o Congresso Brasileiro se torna cúmplice e sócio do governo Bolsonaro no financiamento da barbárie.

Estamos em luta permanente pela construção da soberania alimentar, da agroecologia, da liberdade e autonomia das mulheres. Queremos conclamar toda a sociedade para se somar nessa luta. Vem com a gente, pois quando alguém passa fome, todos os seus outros direitos já lhe foram negados e, pode ter certeza, quem não passa fome também está com seus direitos ameaçados.

#CongressoDerrubeVetos735 #SemVetosSemFome #ProBrasilNãoPassarFome #FomeEInflaçãoTemSolução


:: Clique aqui para receber notícias do Brasil de Fato RS no seu Whatsapp ::

SEJA UM AMIGO DO BRASIL DE FATO RS

Você já percebeu que o Brasil de Fato RS disponibiliza todas as notícias gratuitamente? Não cobramos nenhum tipo de assinatura de nossos leitores, pois compreendemos que a democratização dos meios de comunicação é fundamental para uma sociedade mais justa.

Precisamos do seu apoio para seguir adiante com o debate de ideias, clique aqui e contribua.

Fonte: BdF Rio Grande do Sul

Edição: Marcos Corbari