É um verdadeiro desgoverno cuja punção de morte cresce a cada dia
Por Olímpio Rocha*
As intermináveis filas das agências da Caixa Econômica Federal têm sido notícia desde o início do pagamento do auxílio emergencial, ora suspenso pelo Governo Federal, realidade esta que expôs clientes e empregados do banco ao risco de contágio pela covid-19, fazendo, inclusive, aumentar o número de bancários infectados a cada dia, que compõem uma das categorias profissionais mais atingidas pelo coronavírus.
Leia mais: "Não sei se chego com saúde e renda": o ano novo de quem perde o auxílio emergencial
Ainda hoje, diuturnamente vemos pessoas se aglomerando sob o sol escaldante, na chuva e aguardando horas para ser atendidas por funcionários exaustos pela carga de trabalho imposta pelo ritmo de pagamento dos novos benefícios e pela pressão do banco para o atendimento das metas negociais (que foram revisadas pra cima em dezembro último, em alguns casos, em mais de três mil por cento).
Desde o início deste processo, diversos funcionários das agências propriamente ditas, como também das "áreas meio" da Caixa têm se perguntado por que o auxílio emergencial, assim como o saque emergencial do FGTS, por exemplo, estão sendo pagos somente através das famosas “contas digitais”, movimentadas através do aplicativo “Caixa Tem”. Esse, aliás, não suportou a demanda e obrigou a CEF a lotar as agências para liberar os pagamentos presencialmente e regularizar o acesso ao aplicativo, sem falar dos milhares de fraudes que já vitimaram os beneficiários do auxílio emergencial.
Muitos empregados da Caixa, com larga experiência em pagamentos e procedimentos anteriormente realizados, como a liberação das contas inativas do FGTS e das cotas do PIS, sustentam que o caminho mais fácil seria simplesmente vincular os pagamentos do auxílio emergencial a uma inscrição social como o próprio PIS, o PASEP, o NIS ou o NIT, pois praticamente toda a população brasileira tem pelo menos um desses registros, de modo que seria necessário apenas o cadastramento da “senha cidadã”, uma única vez, para que o beneficiário pudesse sacar seu benefício, mensalmente, nos caixas eletrônicos ou nas casas lotéricas.
Esse procedimento evitaria as gigantescas e mortais filas nas agências da Caixa, tornaria o processo muito mais automatizado e contribuiria para o distanciamento social que, até agora, é a principal forma de evitar o amplo contágio pelo novo coronavírus que, a esta altura, já matou mais de 200.000 brasileiros e brasileiras.
Leia também: Brasil é o país mais experiente do mundo para realizar vacinação, diz especialista
Para piorar, fato é que, recentemente, conforme noticiado em vários veículos de imprensa, o Presidente da CEF, Pedro Guimarães, aquele mesmo que ficou estupefato ao “descobrir” que, no Brasil, infelizmente, ainda há pessoas vivendo em lixões, anunciou que a sua intenção é criar uma nova instituição financeira, de capital aberto, com ações que serão vendidas dentro e fora do Brasil e que herdará aquelas mesmas contas digitais, assim como todos os pagamentos sociais que, hoje, são tocados pela empresa pública federal que ele administra.
Em outras palavras, o Governo Federal preferiu expor beneficiários e beneficiárias do auxílio emergencial, além de bancários e bancárias da CEF a aglomerações desumanas e fatais, com o mero intuito de faturar financeiramente com isto, atendendo ao único princípio que norteia a cabeça do Ministro Paulo Guedes e a de seu discípulo Pedro Guimarães: o lucro desenfreado e assassino, mesmo que literalmente às custas das vidas de cidadãos e cidadãs brasileiras.
Dizendo muito claramente: o governo federal optou deliberada e cruelmente por expor a vida de milhões de brasileiros e brasileiras em filas desnecessárias, cujo intuito era obter dados dos beneficiários e vender essas informações a um banco privado, que será criado em breve. É um torturante assassinato a conta gotas.
Leia ainda: Para economistas, dívida pública não é um problema, como defende o governo
O staff econômico do Governo Bolsonaro e o próprio Presidente da República desprezam totalmente as recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS), dos profissionais da área e fazem ouvidos moucos à experiência dos trabalhadores e trabalhadoras da Caixa, capitalizando o sofrimento dos milhões de brasileiros e brasileiras que precisaram recorrer ao auxílio emergencial.
É um verdadeiro desgoverno cuja punção de morte cresce a cada dia e não surpreende que, em nome da vida das elites econômicas, donas do capital, que sempre se locupletaram da vida dos mais pobres, continue lançando desta necropolítica, literalmente trabalhando pela morte de pessoas sem condições econômicas mínimas e que, portanto, precisam desesperadamente ter acesso a uma renda mínima que, aliás, já foi vilmente suspensa por Brasília.
*Olímpio Rocha é Advogado, Professor, Membro do Conselho Estadual de Direitos Humanos da Paraíba e foi Candidato pelo PSOL a Prefeito de Campina Grande em 2020.
**Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.
Edição: Rogério Jordão