A reestruturação do Banco do Brasil, anunciada essa semana pela direção da empresa, prevê o fechamento de agências em pequenos municípios do interior do país, que terão atendimento presencial reduzido ou encerrado, incluindo localidades que contam com uma incipiente cobertura bancária.
No comunicado enviado aos agentes de mercado e à imprensa, na última segunda-feira (11), o banco estatal não informa oficialmente os detalhes de onde ocorrerão as mudanças. Pelo que foi divulgado, serão encerradas 361 unidades, sendo 112 agências. Outras 243 agências serão rebaixadas à categoria de postos de atendimento.
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"As mudanças acontecem a partir de 22/02 e serão precedidas de ampla comunicação aos clientes dessas agências em canais diversificados, como SMS, aplicativo para celular, Internet Banking, terminais de autoatendimento, além de correspondências, e-mail marketing e cartazes nas agências", informou a assessoria do BB.
No Pará, um dos estados que mais sofrem com a baixa cobertura bancária, o Brasil de Fato apurou que ao menos 12 agências serão fechadas, incluindo em municípios que só contam com uma unidade do BB e, no máximo, a presença de outro banco concorrente.
"Se for olhar o mapa do Pará, algumas são localidades mais isoladas mesmo, como Monte Dourado [região noroeste]. Para a população se deslocar para ser atendida em outro município é um transforno muito grande", aponta Tatiana Oliveira, presidente do Sindicato dos Bancários do Pará.
Além da agência em Monte Dourado, o BB deve encerrar as únicas agências nos municípios de Ourém, Ourilândia do Norte, Água Azul do Norte e Curuça. Em Curionópolis, região centro-leste do estado, a única agência do banco público será transformada em posto de antedimento, com redução drástica na prestação de serviços, segundo informações extraoficiais repassadas por funcionários do BB.
As maiores cidades do estado, como Belém, Ananindeua, Marabá, Santarém, Paraupebas, Altamira e Castanhal também terão agências desativadas. Na capital, uma das agências mais antigas da cidade, localizada na Rua 15 de Novembro, próxima ao tradicional Mercado Ver-o-Peso, deve ter suas atividades encerradas ou reduzidas nos próximos meses. A decisão deve causar um forte impacto principalmente para os pequenos comerciantes e ribeirinhos que se deslocam todo o dia para vender seus produtos no mercado público.
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"Normalmente, essa agência atende comunidades ribeirinhas que atracam no Ver-o-Peso para vender seus produtos e muitas têm contas ali. O fechamento dessa unidade vai dificultar o acesso dessas comunidades, vai gerar um transtorno. São pessoas que já tem uma certa dificuldade de lidar com a bancarização, porque a lógica do banco é sempre expulsar para os caixas eletrônicos, e são pessoas também com nível de escolarização baixa, muitas são analfabetas. Quem trabalha na agência que atende esse públco rotineiramente conhece suas especificidades, sabe atender esse público e tem um relacionamento", afirma Oliveira.
Transparência
Para representantes dos empregados do Banco do Brasil, a empresa não está sendo transparente e os funcionários não estão sendo devidamente informados da mudança. "O banco não está cumprindo a lei de transparência. Eles dizem para os funcionários buscarem informações no sistema interno, mas essa resposta não acontece", critica Carlos Eduardo Bezerra, presidente do Sindicato dos Bancários do Ceará.
No estado, ainda não se sabe ao certo o número total de unidades que serão afetadas pela reeestruturação, mas em algumas delas já é certa a mudança, como a desativação da agência do banco em Santana do Cariri, única agência bancária da cidade. O posto de atendimento do BB em General Sampaio, também no Ceará, é outra unidade que deve encerrar suas atividades, um município de pouco mais de 7 mil habitantes e que praticamente já não contava com cobertura bancária.
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"O que representa não ter uma agência do BB é significativo, porque o crédito não vem do Bradesco, do Itaú, do Santander. As operações de crédito da farmácia, do mercadinho, da agricultura familiar vêm do Banco do Brasil, dos bancos públicos", aponta Bezerra.
Questionado pelo Brasil de Fato sobre os critérios adotados para a desativação e reestruturação de unidades, o BB informou que foram analisados temas como desempenho financeiro e potencial de negócios.
"O Banco avaliou suas unidades de negócios em relação ao desempenho financeiro de cada ponto, o potencial de negócios, o volume de utilização do ponto pelos clientes, a proximidade com outros pontos do BB e as características dos imóveis. O resultado do estudo levou ao encerramento de pontos, mudanças de tipologia e relocalizações de agências", diz, em nota, a assessoria de comunicação do banco.
O texto informa que as mudanças envolvem adaptações na rede de atendimento em 361 municípios.
"O BB manterá sua presença em todos eles, seja com outras unidades próprias já existentes, em 221 municípios, seja com correspondentes bancários 'Mais BB', nos demais. O objetivo foi trazer mais eficiência à rede de atendimento do Banco, propiciando recursos para abertura das unidades de atendimento especializado e buscando melhorar a experiência do cliente", afirmou a assessoria.
Desestruturação
O BB vem reduzindo sua presença física desde 2017, ainda no governo Temer, quando mais de 550 agências foram fechadas e 13 mil postos de trabalho desligados.
A nova reestruturação, agora sob o governo Bolsonaro, deve reduzir ainda mais a cobertura bancária nas regiões que mais precisam, como Norte e Nordeste.
Os bancos públicos, como BB e Caixa Econômica Federal, cumprem uma função social, por meio do fomento do desenvolvimento regional, por exemplo, que não se verifica nos bancos privados - cuja atuação se dá exclusivamente em áreas onde se pode lucrar. Isso explica, por exemplo, a baixa presença de bancos privados nas regiões mais pobres e menos desenvolvidas do país.
Em estados como Roraima, Pará, Acre, Tocantins e Piauí, os bancos públicos como Caixa e BB chegam a representar até 80% das agências. Dos 5.590 municípios brasileiros, 60% contam com agência bancária (3.365). Desse total, 950 são apenas de bancos públicos.
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"O Banco do Brasil está em todas as regiões porque tem um papel de integração nacional e potencialização da atividade econômica, independemtente de ter melhor performance. Diferentemente da iniciativa privada, que só vai onde dá lucro. O lucro do BB está na produção de riquezas efetivas, mas também nessa questão de ser um braço do Estado brasileiro a serviço da sociedade. Você tem ganhos de inclusão, desenvolvimento regional, outras variáveis de mensuração do resultado do banco", afirma Kleytton Guimarães Morais, presidente do Sindicato dos Bancários do Distrito Federal.
Em meio à pandemia do novo coronavírus e com o país amargando mais de 14 milhões de desempregados, o BB deve contribuir para a piora nessas estatísticas com seu plano de reestruturação, que prevê o desligamento de cerca de 5 mil funcionários, por meio de programas de demissão incentivada.
Além disso, o banco está promovendo um processo de "descomissionamento" em massa de empregados que atuam como caixas em agências e postos. Com isso, alguns funcionários do banco com menos tempo de contrato poderão ter redução de até 50% na renda mensal, com a perda da comissão. Já os clientes terão menos serviço de caixa presencial. Para a empresa pública, o foco será no atendimento digital.
"Desde 2016, a quantidade de transações em guichês de caixa no BB reduziu 42%, enquanto o uso do mobile praticamente dobrou no mesmo período e já responde por 86% das transações, junto com o internet banking.
Essa tendência não apenas continua como se acentuou fortemente durante a pandemia, antecipando em mais de um ano nossas projeções de uso dos canais digitais. Desde abril, o App do BB ganhou mais 4,7 milhões de usuários, totalizando 19,4 milhões, com uma média diária de crescimento 273% maior do que o período anterior à pandemia. O atendimento pelo WhatsApp também registrou crescimento expressivo chegando a quase 600 mil atendimentos por dia", informou a assessoria do BB.
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"O banco alega que, com essas transformações tecnológicas, houve um acesso maior aos canais alternativos de atendimento, mas aí você vai numa agência do BB, em São Paulo, e você tem fila de gente acima de 60 anos que não tem acesso à tecnologia ou não sabe mexer com a tecnologia.
Ou mesmo a população de baixa renda, que são pessoas que compram crédito para o celular e acessam wifi público, mas não tem recurso para acessar a internet do celular.
Não se justifica essa questão tecnológica para o banco fazer esse movimento, ainda mais em um momento de pandemia. Esse é o pior momento que o banco escolheu", critica João Fukunaga, diretor do Sindicato dos Bancários de São Paulo e coordenador da Comissão de Empresa dos Funcionários do Banco do Brasil (CEBB).
Edição: Rogério Jordão