A demanda dos pacientes de covid-19 por oxigênio (O2) hospitalar em Manaus (AM) é maior do que a atual capacidade de fornecimento do produto. Não se trata apenas da disponibilidade, mas da dificuldade de logística. Essa é a avaliação de Leandro Tessler, professor do Instituto de Física da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
“Precisaríamos de uma ponte aérea contínua de aviões cargueiros, para levar oxigênio a Manaus. Não tem outro jeito, porque não dá para conseguir esse oxigênio localmente. A capacidade de produção deles é de só um terço da demanda”, ressalta.
Na interpretação do físico, se a covid-19 continuar avançando, o Brasil todo pode viver um colapso semelhante ao de Manaus, em que uma ala hospitalar inteira ficou sem oxigênio e pacientes estão sendo transportados para outros estados.
“Esse caos em Manaus vai chegar no resto do Brasil. A gente não tem como aumentar nossa capacidade de produção de oxigênio hospitalar e, daqui a pouco, isso vai se expandir. É o colapso do sistema. As pessoas vão começar a morrer [por falta de oxigênio] pelo país, como em Manaus.”
Explicação técnica
Um paciente internado precisa de cerca de 22m³, ou 22 mil litros de oxigênio, a cada 24 horas. “Ou seja, cada paciente consome dois cilindros verdes por dia”, explica Tessler.
O oxigênio está sendo transportado a Manaus em estado líquido, a cerca de -200°C. “Foi o que fizeram no Hércules [avião da Força Aérea Brasileira]: carregaram 6 garrafas térmicas, cada uma com mil litros de oxigênio líquido”, lembra Tessler.
“A vantagem de transportá-lo líquido é que rende muito: 1 litro de O2 líquido corresponde a quase mil litros de gás", explica
Além do risco de explosão, que pode ser mitigado com protocolos de segurança, o físico ressalta que os 6 mil litros de oxigênio líquido transportado pelo Hércules não fizeram “nem cócegas”, tamanha a demanda dos pacientes de covid-19 no Amazonas.
Em média, foram consumidos entre 55 e 60 mil litros de oxigênio por dia no estado. Na última quarta-feira (13), a demanda chegou ao auge e beirou os 70 mil.
Tessler lembra que o transporte de gases perigosos não pode ser feito em avião de passageiros, conforme norma internacional, o que dificulta ainda mais o cenário.
Na visão do especialista, não há como remediar o problema apenas do ponto de vista logístico.
“A melhor saída era ter implementado regras de isolamento, não permitir que tanta gente adoecesse ao mesmo tempo. Mas o governo se recusa a fazer isso”, lamenta o físico.
Desde o início da pandemia, o Brasil registrou 8,5 milhões de infectados com o novo coronavírus e mais de 209 mil mortes.
* Entrevista realizada por Caroline Oliveira. Colaborou Daniel Giovanaz
Edição: Leandro Melito