A dor que fica

"É difícil entender que ele morreu", diz jovem que perdeu pai para covid no Amazonas

Aos 54 anos, ele faleceu em 8 de janeiro, data em que o Ministério da Saúde foi informado sobre falta de oxigênio

Belém (PA) | Brasil de Fato |

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O jovem, de 24 anos, conta que ainda não conseguiu entender que o pai morreu - Gabriel Achão/Arquivo Pessoal

Mais de 6 mil pessoas perderam um ente querido para a covid-19 no estado do Amazonas desde o início da pandemia de coronavírus, segundo o último boletim do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) divulgado às 18h desta segunda-feira (18).

Um deles é o pai do jovem manauara Gabriel Achão, de 24 anos, que há pouco tempo se formou em psicologia. "Não acredito que ele morreu, é como se ele ainda estivesse internado", diz.

Ricardo Mauro Moura Achão faleceu aos 54 anos, vítima de complicações da covid-19, no dia 8 de janeiro, data em que o Ministério da Saúde foi informado sobre o desabastecimento de oxigênio no estado por meio de um ofício.

A mortalidade no Amazonas é a mais letal do Norte do Brasil, com número superior a 149 mortes para cada 100 mil habitantes. Por mais que o estado tenha vivenciado momentos difíceis no ápice da pandemia, em maio e abril, a situação saiu do controle em janeiro. 

 "As notícias aqui em Manaus vêm piorando desde novembro e a gente fica com medo, porque tudo o que vem para cá sejam insumos, produtos ou serviços chega por último", relata Gabriel. 

O trabalho que não pode parar 

Gabriel diz que o pai, Ricardo Mauro Moura Achão, trabalhava como cargueiro e não conseguiu fazer isolamento social, porque o trabalho não permitia.

Da família, ele foi o último a ser contaminado pelo novo coronavírus e apresentou febre e tosse, dois dias antes do Natal e, como os sintomas pioraram,  precisou ser internado no Hospital Delphina Rinaldi Abdel Aziz, onde foi entubado para poder respirar.   

"A gente recebeu essa notícia [da morte dele] no dia 8. Por volta da meia-noite ligaram para a minha mãe. Eu não estava com ela na hora. Eram 4h quando ela falou para mim que meu pai tinha falecido. Na hora, como eu estava sonolento, demorou um pouco para eu entender. Na verdade, ainda está demorando. É difícil entender que ele faleceu", admite.

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Na casa de Gabriel o único que não apresentou sintomas da covid-19 foi ele. Assim, ele acredita que seja assintomático. Atualmente, o jovem tem uma tia e um tio que atuam na linha de frente da covid-19 em hospitais de Manaus, o que causa preocupação em todos os familiares devido às atuais condições no estado.

Gabriel, que concedeu a entrevista do Brasil de Fato por videochamada, em diversos momentos ficou com a voz embargada e os olhos cheios de lágrimas. Sobretudo, quando lembra que o pai passou dias difíceis antes de falecer.

Antes de ser internado no Hospital Delphina Rinaldi Abdel Aziz, Ricardo foi atendido na Unidade de Pronto-Atendimento Danilo Corrêa.

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"Meu pai ficou em um colchão sem lençol e tinham mais três pessoas na sala e era um lugar que fazia muito calor para eles. Depois, conseguimos mudar ele de local. A verdade é que sinto como se ele estivesse no hospital ou trabalhando. Às vezes eu choro e consigo lembrar dele, dos momentos que passei com ele", diz o rapaz ainda sem acreditar na morte do pai.

Quanto às medidas das autoridades, Gabriel acredita que houve omissão por parte do governo do estado e do governo federal e teme pela vida de quem precisa hoje de atendimento, porque a probabilidade dessas pessoas ficarem desassistidas é grande.

Medida emergenciais

Como forma de enfrentamento à pandemia no Amazonas, o governo do estado informou que "na manhã desta segunda-feira (18), a Universidade do Estado do Amazonas (UEA) antecipou a colação de 15 alunos dos cursos de Medicina. A antecipação é amparada na Lei Federal n. 14.040, de 18 de agosto de 2020, que orienta as instituições de Ensino Superior a abreviarem a duração dos cursos".

Os alunos da UEA que aceitaram colar grau antecipadamente, complementarão por 180 dias as suas atividades no Sistema Único de Saúde (SUS).

Além disso, informaram que "com a entrega das primeiras 256 mil doses de vacina contra a covid-19, do governo federal, e mais 50 mil doses do governo de São Paulo, o Amazonas dará início à execução do Plano Operacional da Campanha de Vacinação somando 306 mil doses da Coronavac, que serão destinadas a grupos prioritários conforme as diretrizes do Plano Nacional de Imunização (PNI).

Edição: Leandro Melito