Na manhã desta sexta-feira (19), o ministro da Saúde, Eduardo Pazzuelo, se reuniu virtualmente com prefeitos e prometeu o envio de mais 4,7 milhões de doses de vacinas contra a covid-19 até o início de março - destas, 2 milhões são da vacina AstraZeneca/Oxford importadas da Índia, e 2,7 milhões são do imunizante produzido no Brasil pelo Instituto Butantan.
O anúncio aconteceu um dia depois de uma polêmica envolvendo a pasta e o instituto.
O diretor do Instituto Butantan, Dimas Covas, afirmou nesta sexta-feira (19) que o Ministério da Saúde ignorou ofícios enviados pelo instituto em julho, agosto e outubro do ano passado oferecendo doses de vacina contra covid-19 ao governo federal.
Na quinta-feira (18), o secretário executivo do Ministério da Saúde, Elcio Franco, informou que o governo não conseguirá entregar as vacinas previstas para fevereiro, conforme anunciado na quarta-feira. Ele acusou o Instituto Butantan pelo atraso na entrega de doses.
“Até o início dessa tarde, tínhamos a previsão de 9,3 milhões de doses de vacinas a serem fornecidas pelo instituto Butantan. Infelizmente, recebemos a notícia de que eles vão nos entregar apenas 30% dessas doses. Serão apenas 2,7 milhões”, declarou o secretário por meio de vídeo publicado no YouTube do Ministério da Saúde.
Em resposta, o Butantan afirmou que o “governo ignora os fatos” e atribui a responsabilidade aos problemas diplomáticos entre o Brasil e a China. Também destacou considerar “inacreditável que o Ministério da Saúde queira atribuir ao Butantan a responsabilidade pela sua completa falta de planejamento”
No Twitter, o Butantan informou que vai entregar entre 3,4 milhões de doses entre 23 de fevereiro e 2 de março.
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Para a epidemiologista Carla Domingues, que coordenou o Programa Nacional de Imunização entre 2011 e 2019, todos os países estão sofrendo com escassez de vacina.
Mas, no caso do Brasil, a situação se agrava devido, principalmente, à negligência do governo, que negou a gravidade da epidemia e demorou para buscar buscar parcerias com fabricantes dos imunizantes.
Ela lembra do caso de dois laboratórios que ofereceram vacinas para o governo federal, mas que até agora não conseguiram firmar contratos de fornecimento.
“A própria Pfizer tentou vender para o governo federal e até hoje não conseguiu. A Johnson também havia afirmado que daria prioridade para venda no Brasil, e até hoje não tem um acordo firmado com esse laboratório”, afirmou a especialista.
Além da escassez de doses, a distribuição dos imunizantes não está acontecendo de forma homogênea. Estados como o Pará, por exemplo, reclamam de desproporcionalidade no repasse dos imunizantes.
O estado é o que menos recebeu vacinas, proporcionalmente, até agora. Maurício Bezerra, secretário de Saúde de Belém (PA), conta que os estados e municípios estão tendo que tomar todas as iniciativas e providências para que a imunização ocorra.
"A verdade é que os estados e municípios têm trabalhado incansavelmente, mas todo mundo trabalhando de forma muito ruim, porque você não encontra o respaldo do ente federativo que deveria ser o grande líder desse processo, que é o governo federal, o Ministério da Saúde", afirma.
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Mas os problemas não param por aí. A definição dos grupos prioritários tem gerado muita confusão. Para Carla Domingues, o calendário de vacinação deveria ser unificado e não variar conforme a localidade, como acontece atualmente.
Isso evitaria o fenômeno de um “turismo da vacina”, em que pessoas têm ido se vacinar em cidades onde a campanha está mais avançada.
“A gente viu a questão dos fura-filas justamente porque você não tinha um Cadastro Nacional que garantisse efetivamente a vacinação. É preciso que o Ministério da Saúde organize e se cadastre no Plano Nacional. É preciso que a gente tenha essa clareza de quem é vai ser vacinado. O que não pode é isso, locais vacinando um grupo e o outro não sendo vacinado, porque isso confunde a população, dificulta a comunicação”, conclui a especialista.
Edição: Raquel Setz