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Que fim levará a insensibilidade de Bolsonaro?

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O Brasil começou tarde a vacinar e, num contexto de escassez de doses adquiridas pelo Governo Federal, a vacinação nos municípios ora anda a passos de tartaruga, ora foi interrompida - Jorge Araújo / Fotos Publicas
Desde o início da pandemia, o Brasil enfrentou a crise sanitária da pior forma possível

Por Alisson Lisboa*

Nas últimas semanas, o Brasil vivenciou os momentos mais dramáticos desde o início da pandemia de covid-19. Já são mais de 40 dias em que o número diário de mortes pela doença ultrapassa mil. Apenas na última quarta-feira (3), morreram 1.910 pessoas. Em 17 capitais, a taxa de ocupação das UTIs ultrapassa os 80%; entre os estados, são 12 nessa mesma situação.

No entanto, um grande contraste se deu pela reação do presidente Jair Bolsonaro: realizou um banquete em clima de festa em reunião presencial com governadores e deputados mais próximos, sem apresentar preocupação com a crise sanitária.

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A insensibilidade de Bolsonaro diante da dor das famílias que perderam seus entes queridos; da alta dos preços dos alimentos, dos combustíveis e do gás de cozinha; do desemprego é digna de comparação à nobreza francesa do século XVIII. É atribuído a Maria Antonieta, esposa do rei Luís XVI, uma fala diante das revoltas camponesas contra à carestia e à falta de alimentos: “Se eles não têm pão, que comam brioches!”, demonstrando total desconhecimento e despreocupação da nobreza com relação às condições de vida do povo. Anos depois, no transcurso da Revolução Francesa, rei e rainha foram decapitados em praça pública.

Desde o início da pandemia, o Brasil enfrentou a crise sanitária da pior forma possível: descoordenação das ações entre as esferas de governo; medidas de distanciamento social tímidas e insuficientes; baixa testagem; má condução das relações internacionais, o que tem dificultado até hoje a aquisição de vacinas. Apesar da visível incompetência do presidente e de seu ministro da saúde, o qual fez a proeza de trocar a quantidade de vacinas destinadas aos estados do Amapá e do Amazonas, há também um claro grau de intencionalidade na má condução do governo na pandemia.

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A pesquisa coordenada pela professora da Universidade de São Paulo (USP), Deisy Ventura, revelou que ao longo de 2020 foi conduzida uma estratégia institucional de disseminação consciente do coronavírus pelo país. A intenção, declarada diversas vezes por Bolsonaro, era infectar o maior número de pessoas para alcançar o quanto antes a “imunidade coletiva”.

Dessa forma, não seriam necessárias as medidas de isolamento social e interesses econômicos de empresários não seriam prejudicados. Os efeitos dessa estratégia são conhecidos: 260 mil mortos e o Brasil é o epicentro da pandemia global. Sendo ela conduzida de forma intencional, aliada ao estímulo do uso de medicações sem comprovação científica contra a Covid, haveria dolo nas ações de Bolsonaro e base legal para Impeachment.

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A vacinação contra a covid-19 é outro problema. O Brasil começou tarde a vacinar e, num contexto de escassez de doses adquiridas pelo Governo Federal, a vacinação nos municípios, ora anda a passos de tartaruga, ora foi interrompida pela falta de previsão de novos repasses. Em quase dois meses de início da vacinação, apenas 4,6% da população foi vacinada, correspondendo a 7,3 milhões de habitantes. Esse valor contrasta com a pandemia de H1N1 em 2008, em que o Brasil vacinou 80 milhões de pessoas em apenas 3 meses. De um lado, porque não possuíamos um governo neofascista como o de agora; de outro, por conta do nosso histórico Programa Nacional de Imunizações, o qual data de 1973.

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Na mesma semana em que a Anvisa concedeu registro definitivo à vacina da Pfeizer em nosso país, Bolsonaro vetou os artigos da lei 14.121, desobrigando o Governo Federal de adquirir as vacinas aprovadas pela agência reguladora. Assim, abre-se a possibilidade de o setor privado adquirir vacinas em paralelo ao setor público, instituindo um verdadeiro “fura-fila” empresarial, ou um “camarote da vacina”, não necessariamente respeitando os critérios de prioridade.

Como se não bastasse, o governo Bolsonaro não apresenta recursos suficientes para a saúde em 2021. O orçamento deste ano para a pasta é de R$ 123,8 bilhões, contrastando com os R$ 165 bi do ano passado, em que foram aprovados créditos extraordinários para furar o teto de gastos da EC 95. Assim, se o decreto de calamidade pública não for estendido para este ano, o sistema de saúde entrará em colapso. A proposta do Conselho Nacional de Saúde e da Frente pela Vida para que isso seja evitado é um piso de R$ 168,7 bi.

Por fim, faz-se necessária a instauração de um comitê de salvação nacional, com participação de entidades científicas da área da saúde, nas três esferas de governo, para mudarmos o rumo da política pública e evitarmos o pior da pandemia, que parece estar por vir. Mesmo que de forma tardia, corrermos atrás do prejuízo e contra o tempo para evitar a perda de mais vidas.

Por mais que a unidade das classes dominantes em torno de Bolsonaro pareça ser sólida e ainda haja uma boa taxa de aprovação popular ao seu governo, o pedido de Impeachment e a bandeira pelo “Fora Bolsonaro” permanece atual. A sua aposta alta no genocídio e no caos, na certeza de que não pagará pelo que faz, não fará com que a história o absolva: ela nos ensina que a insensibilidade dos tiranos sempre tem uma merecida reação.

*Alisson Lisboa. Membro da Rede Nacional de Médicas e Médicos Populares.

**Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Rebeca Cavalcante