Com a definição do nome de Rodrigo Pacheco (DEM-MG) na presidência do Senado Federal, os partidos com representantes eleitos realizaram uma negociação intensa para garantir seus escolhidos nas 13 comissões permanentes da Casa.
Ocupar a presidência de uma comissão permanente é estratégico para fazer avançar ou para barrar pautas consideradas prioritárias.
O Brasil de Fato conversou com parlamentares para entender a composição das presidências das comissões do Senado.
Apesar de não se declararem bolsonaristas, a maioria dos escolhidos apresenta atuação favorável à agenda neoliberal. Há também representantes do setor ruralista, além de donos de concessões de rádio e TV.
Representação por partido
Entre os dias 23 e 24 de fevereiro, o Senado instalou suas comissões permanentes e elegeu os respectivos presidentes e vices para o biênio 2021-2022. A única exceção é a Comissão Senado do Futuro (CSF), que ainda pode sofrer reformulações.
As comissões de Constituição e Justiça (CCJ) e de Assuntos Econômicos (CAE) são consideradas as mais sensíveis para a governabilidade de Bolsonaro. A CCJ tem a prerrogativa de analisar a constitucionalidade e a admissibilidade de todas as novas propostas.
Nove dos 16 partidos com representação no Senado presidem comissões permanentes. O PSD, o MDB e o PT presidirão duas comissões cada.
Se o critério de classificação for apenas a legenda partidária, a base do governo federal garantiu apenas quatro das 12 comissões com presidência definida.
A oposição garantiu a liderança de três comissões permanentes, a Comissão de Agricultura e Reforma Agrária (CAR) indicada pelo PDT, a de Meio Ambiente (CMA) e a de Direitos Humanos (CDH), ambas indicadas pelo PT. Pelo menos outras cinco serão presididas por senadores considerados independentes.
Entretanto, ser independente ou oposição ao governo Bolsonaro não significa não compartilhar nenhum dos eixos do seu projeto político, como a agenda de reformas neoliberais, impulsionadas, sobretudo, pelo Ministério da Economia.
Em 2019, sete presidentes de comissões, entre os 12 eleitos, se posicionaram de forma favorável à Reforma da Presidência.
Presidentes com tendência pró-reformas
Os presidentes das comissões de Constituição e Justiça (CCJ), Assuntos Sociais (CAS), Infraestrutura (CI), Educação (CE), Ciência e Tecnologia (CCT), Relações Exteriores (CRE) e Defesa do Consumidor (CTFC) votaram pela aprovação da Reforma da Previdência em 2019.
Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ)
A comissão, considerada a mais importante do Senado, é presidida por Davi Alcolumbre (DEM-AP), ex-presidente do Senado no último biênio, e tem como vice Antônio Anastasia (PSD-MG), que também compunha a chapa da presidência anterior.
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É considerada uma comissão controlada por aliados do governo, entretanto, setores da oposição, como o líder da bancada do PT no Senado Rogério Carvalho (PT-SE) em entrevista ao Brasil de Fato, destacam que há algum grau de independência em relação ao governo.
Em 2019, Alcolumbre foi eleito para a presidência da Casa com a articulação do governo. O senador tem mostrado uma tendência ao alinhamento com o governo federal, mediando atritos com o Congresso. Chegou a ser cotado para assumir um ministério.
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No Amapá, a família Alcolumbre possui concessões de radiodifusão, como a TV Macapá, retransmissora do SBT, e investimento imobiliários.
Algumas propriedades estão sob suspeita de terem sido adquiridas por meio de grilagem e de apropriação de áreas públicas. Josiel, seu irmão e suplente no Senado, é sócio da TV Amazônia, retransmissora da Bandeirantes.
Assuntos Sociais (CAS)
A Comissão de Assuntos Sociais é presidida por Sérgio Petecão (PSD/AC). A vice-presidência é ocupada por Zenaide Maia (PROS/RN).
Petecão foi 1º secretário da Mesa Diretora do Senado durante a gestão de Alcolumbre. Foi vice-líder do governo Bolsonaro na casa, além de coordenador da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) no Senado.
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O senador é favorável ao armamento promovido pelo governo Bolsonaro. Em 2016, votou pela aprovação da PEC do Teto de Gastos Públicos. Em 2017, foi favorável à Reforma Trabalhista. E, em 2019, foi favorável à Reforma da Previdência no Senado.
Seu posicionamento convergente com a política de austeridade fiscal leva a crer que não defenderá mais recursos para saúde e assistência social.
Por ser membro da Bancada Ruralista e defensor do armamento de proprietários rurais – o que pode agravar a violência causada por conflitos agrários – é possível que o senador ignore as demandas dos povos indígenas.
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Serviços de Infraestrutura (CI)
A comissão de Infraestrutura é presidida pelo Senador Dário Berger (MDB-SC), com a vice-presidência ocupada por Jayme Campos (DEM-MT).
Berger votou a favor da Reforma da Previdência no governo Bolsonaro, mas na votação da PEC, defendeu mudanças na cobrança de conglomerados empresariais que, para o senador, são os grandes responsáveis pelo rombo na Seguridade Social.
Em 2017, votou a favor da Reforma Trabalhista, mas contra a PEC do Teto dos Gastos Públicos.
Em 2020, propôs o PL 4021/20, que prevê medidas de estímulo ao setor de educação privada durante a pandemia. O projeto contou com o apoio de Elizabeth Guedes, irmã do ministro da Economia Paulo Guedes, e vice-presidente da Associação Nacional das Universidades Particulares (ANUP).
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Em relação à pauta de infraestrutura, foi relator da MP 852/18. Em seu relatório, incluiu o reconhecimento da validade de escrituras de imóveis em área de marinha e a redução de áreas de preservação localizadas em parques nacionais.
O fato de ter sido financiado pelo setor da construção civil, como a Construtora Triunfo S/A, indica que os interesses econômicos desse setor podem influenciar a atuação do senador na presidência da CI.
No Senado, Berger já demonstrou ser partidário da transferência de terras da União a proprietários privados.
Educação, Cultura e Esporte (CE)
A comissão de Educação, Cultura e Esporte é presidida por Marcelo Castro (MDB-PI). A vice-presidente é Leila Barros (PSB-DF).
Na eleição para Presidência de 2018, Castro defendeu a candidatura de Fernando Haddad (PT), e foi ministro da Saúde no segundo mandato do governo Dilma Rousseff (PT).
Votou contra o impeachment de Rousseff, mas, em 2017, posicionou-se pela aprovação da Reforma Trabalhista e da PEC dos Gastos Públicos.
O senador propôs a PEC 39/19, que destina, integralmente, à educação pública (75%) e à saúde (25%), os valores oriundos de royalties da exploração do petróleo de campos cuja declaração de comercialidade tenha se dado depois de 3 de dezembro de 2012.
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A tendência, apoiada na análise de sua atuação legislativa, é de que o senador enquanto presidente da CE busque ampliar os recursos para a educação, o que de alguma forma entra em choque com sua postura fiscalista e pró-reformas adotada nos últimos anos.
Ciência, Tecnologia, Inovação, Comunicação e Informática (CCT)
A Comissão de Ciência, Tecnologia, Comunicação e Informática é presidida por Rodrigo Cunha (PSDB/AL). O vice-presidente ainda não foi definido.
Cunha é associado ao grupo Livres. Inicialmente criado como uma tendência do Partido Social Liberal (PSL), a organização saiu da legenda em reação à filiação de Jair Bolsonaro (Sem partido), cujos princípios classificam como incompatíveis aos seus, sobretudo, em relação aos “costumes”.
A agenda econômica liberal é prioridade: são favoráveis às privatizações de modo geral, visando diminuir a influência do poder político no mercado.
O senador possui vínculo ideológico com startups com interesses no mercado financeiro e com o setor privado de tecnologia. Em contrapartida, Cunha tem atuado também na defesa dos direitos dos consumidores contra práticas consideradas lesivas.
A atuação do senador na presidência da CCT tende a valorizar a isenção de impostos aos empreendedores em detrimento do investimento em desenvolvimento tecnológico e inovação que costuma contar com fartos recursos estatais nos países mais tecnologicamente avançados, como aqueles que saíram na frente no lançamento de vacinas contra a covid-19.
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Relações Exteriores e Defesa Nacional (CRE)
A Comissão de Relações Exteriores é presidida pela senadora Kátia Abreu (PP-TO). A vice-presidência ainda está vaga.
Kátia Abreu (PP/TO) é uma liderança tradicional da bancada ruralista. Proprietária rural, já presidiu a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA).
A senadora defende o uso de sementes modificadas em laboratório e patenteadas por corporações de biotecnologia, e assumiu o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) no governo Dilma. Sua atuação gerou críticas de ambientalistas.
Em 2016, a senadora votou contrariamente ao impeachment de Dilma Rousseff. Na época filiada ao MDB, Abreu afirmou que Temer não tinha legitimidade para implementar reformas, mesmo que fossem necessárias.
Nesse sentido, já no primeiro ano do governo Bolsonaro, a senadora votou pela aprovação da Reforma da Previdência.
Apesar do compromisso da senadora com o agronegócio – uma das bases de sustentação do governo –, o senador Humberto Costa (PT-PE) considera a eleição de Abreu positiva.
“Não acho que a escolha da Kátia Abreu para a presidência da comissão seja uma escolha ruim. O agronegócio está sendo prejudicado pela política que o Brasil está adotando internacionalmente.”
Abreu é uma das principais críticas do ministro Ernesto Araújo, por considerar que os posicionamentos públicos de seu grupo ideológico prejudicam as relações com parceiros comerciais, como a China.
Entre os doadores de sua campanha em 2014 estão a Construtora Andrade Gutierrez, o Bradesco, a Agro Soja Comércio e Exportação de Cereais LTDA e a Fiagril LTDA, distribuidora de insumos agrícolas, controlada pela chinesa Dakang International desde 2016.
No ano de 2020, a população de baixa renda, que gasta uma maior parcela de sua renda com alimentos, sofreu com o inflacionamento de uma série de produtos básicos. Com a acentuada desvalorização da moeda nacional, a exportação de produtos agropecuários tornou-se muito mais vantajosa que sua venda no mercado interno.
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A senadora é também defensora das isenções e subsídios fiscais ao setor que podem consolidar a posição do país na divisão internacional do trabalho enquanto fornecedor de commodities. O agronegócio de exportação já figura entre os setores da economia menos tributados.
Transparência, Governança, Fiscalização e Controle e Defesa do Consumidor (CTFC)
A Comissão de Defesa do Consumidor é presidida por Reguffe (PODE/DF). O vice é Marcos do Val (PODE/ES).
Em fevereiro de 2016, Reguffe decidiu sair do PDT por discordar do apoio do partido ao governo da ex-presidente Dilma Rousseff, votando favoravelmente ao impeachment meses depois. Em 2019, votou pela aprovação da Reforma da Previdência.
É autor do PLS 261/15 que propõe a proibição do financiamento e da concessão de crédito a governos estrangeiros e projetos realizados em outros países pelo BNDES, o que demonstra uma convergência de Reguffe com bandeiras ligadas à direita brasileira que, nos últimos anos, estigmatiza os créditos fornecidos no exterior pelo BNDES.
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Após a sua eleição, o presidente se comprometeu a solicitar a realização de audiências públicas, com prioridade para dois primeiros temas: alta nos preços dos combustíveis e planos de saúde.
Reguffe é autor de alguns projetos associados à defesa do consumidor, como o PLS 153/17, que obriga as empresas de planos de saúde a oferecer e comercializar planos de saúde individuais.
O senador tem entre seus doadores de campanha a socióloga e banqueira Maria Alice Setubal, filha de Olavo Setubal do Itaú e do holding Itaúsa, e o empresário Guilherme Peirão Leal, co-presidente do Conselho de Administração e dono de parte das ações da Natura.
Presidentes ligados ao agronegócio
Um terço dos presidentes eleitos são ligados ao agronegócio. São eles: Kátia Abreu (CRE), Gurgacz (CAR), Petecão (CAS) e Alcolumbre (CCJ).
Agricultura e Reforma Agrária (CRA)
O senador Acir Gurgacz (PDT/RO) foi eleito presidente da Comissão de Agricultura e Reforma Agrária (CRA). A vice-presidência não está definida ainda.
Apesar de ser uma comissão considerada sob o controle da oposição, pelo fato de o senador ser filiado ao PDT, o perfil ruralista de Gurgacz converge com os interesses do agronegócio que segue na base governista em sua maioria.
Em 2012, o senador participou ativamente da aprovação do Novo Código Florestal. Em 2019, votou contra a Reforma da Previdência, mas declarou que uma reforma seria necessária.
Em 2018, Gurgacz foi candidato ao governo de Rondônia, mas teve sua candidatura indeferida com base na Lei da Ficha Limpa. O senador está cumprindo pena em regime semiaberto por desvio de finalidade na aplicação de financiamento obtido no Banco da Amazônia, quando era diretor da empresa de transporte Eucatur.
O senador é fundador do Sistema Gurgacz de Comunicação, integrado pelas empresas Diário da Amazônia, Rede TV! Rondônia, Rádio Alvorada e SGC TV a Cabo. Em 2013, uma das empresas da família, a empresa de transportes Eucatur, foi uma das mais citadas na Justiça do Trabalho.
Em 2018, Gurgacz declarou um patrimônio de R$ 11,3 milhões. Entre os bens, está uma sociedade com a esposa no grupo de comunicação Diário da Amazônia, além da posse de três grandes propriedades rurais. As três propriedades do latifundiário foram declaradas “terra nua”, ou seja, sem exploração comercial.
Donos da mídia
Um quarto das comissões são presididas por senadores ou familiares detentores de concessões de radiodifusão e proprietários de veículos de imprensa, o que indica uma sobrerrepresentação de oligarquias locais nas comissões, como a Comissão de Constituição e Justiça, a Comissão de Agricultura e a Comissão de Desenvolvimento Regional.
Um exemplo de propriedade cruzada de meios de comunicação é o senador Acir Gurgacz (PDT-RO), ligado organicamente à bancada ruralista – uma das bases do governo Bolsonaro –, que preside a CAR como representante da oposição.
Desenvolvimento Regional e Turismo (CDR)
A Comissão de Desenvolvimento Regional e Turismo é presidida pelo senador e ex-presidente Fernando Collor de Mello (PROS-AL), seu vice é o filho do presidente Jair Bolsonaro, Flávio Bolsonaro (REPUBLICANOS-RJ).
O senador Collor foi diretor da Gazeta de Alagoas e superintendente da Organização Arnon de Mello, grupo que congrega as empresas de comunicação de sua família.
Seu governo, interrompido pelo impeachment, foi responsável e pela abertura econômica que tirou as proteções à indústria na década de 1990, marcando a entrada do Brasil na globalização neoliberal de forma mais intensa.
Em 2017, o senador tornou-se réu pelos crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e comando de organização criminosa. Em 2019, votou contrariamente à Reforma da Previdência.
Recentemente, Collor se aproximou do governo federal, tornando-se um aliado do governa nas articulações com o Centrão.
Edição: Poliana Dallabrida