Imunização

Cinco dúvidas sobre a vacina contra a covid que você precisa tirar agora

Especialista responde às principais perguntas sobre os resultados, prazos e benefícios do imunizante

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |
Morador de comunidade no Rio Moju (PA) mostra frasco da dose que tomou; imunização precisa chegar ao maior número de pessoas possível para dar certo - João Paulo Guimarães/AFP

Quase três meses após o início do Plano Nacional de Imunização contra o coronavírus, o Brasil caminha a passos lentos na distribuição de doses, mas com avanço de informações mentirosas, as fake news.

Até esta sexta-feira (9), o país conseguiu imunizar pouco mais de 11% da população, segundo dados da plataforma Our World in Data (Nosso mundo em dados, na tradução).

O crescimento das fake news parece seguir na direção contrária, se aproveitando de casos reais para criar desinformação e colocar em dúvida a efetividade e a segurança das vacinas.

::Quem está por trás do "informe publicitário" negacionista e pró-cloroquina em jornais::

Um exemplo foi a morte do cantor Agnaldo Timóteo, no sábado passado (3). Ele foi internado com sintomas da covid dois dias depois de tomar a segunda dose do imunizante.

No mesmo dia, o presidente da Argentina, Alberto Fernández, comunicou que testou positivo para o coronavírus. Ele foi vacinado entre os meses de janeiro e fevereiro.

Esses são apenas dois casos usados por negacionistas e defensores do movimento antivacina para endossar as mentiras anticientíficas propagadas com frequência preocupante em redes sociais e aplicativos de mensagem.

Mas por que esses dois casos aconteceram mesmo após a imunização? Qual é o funcionamento esperado das vacinas no corpo humano? Que diferença faz o número total de imunizados na propagação?

A pesquisadora Karine Lima Lourenço, doutora em virologia e que atua no CT Vacinas da Universidade Federal de Minas Gerais, conversou com o Brasil de Fato sobre essas dúvidas e respondeu aos questionamentos.

Quanto tempo a vacina demora para fazer efeito?

Karine explica que existem pontos que precisam ser esclarecidos sobre o tempo entre a aplicação da vacina e a produção da resposta imune do corpo. Ela comenta o caso do cantor Agnaldo Timóteo.

"Ele havia acabado de tomar a segunda dose. Mesmo ele tomando as duas doses dentro do prazo estipulado, não significa que, automaticamente, ao aplicar a vacina no braço, ele já teria uma resposta pronta frente à covid-19", explica ela.

Ela relata que "Alguns estudos mostram que as células de defesa são produzidas depois de duas a quatro semanas após a segunda dose. É importante que as pessoas entendam que após receber a vacina, elas precisam continuar com as medidas de proteção"

A pesquisadora reafirma, "Infelizmente, o que aconteceu com o Agnaldo Timóteo, é que ele não tinha uma resposta totalmente pronta. As doses precisam de um tempo para que o corpo consiga montar uma resposta."

A vacina vai impedir que o vírus entre no meu corpo?

Não é dessa forma que as vacinas funcionam. O que elas fazem é criar mecanismos para enfraquecer o efeito das doenças no organismo. Nenhuma vacina cria um escudo de proteção que impede a contaminação. 

Ao comentar o caso do presidente da Argentina, Karine esclarece, "De fato ele pode ter contraído o vírus e manifestado a doença. Mas o que gente tem observado, nos casos das pessoas vacinadas, é que essas pessoas apresentam sintomas leves da doença".

Um dos principais efeitos das vacinas é justamente atuar para que o vírus não leve a casos médios, graves ou óbitos. Com isso, o impacto nas redes de saúde diminui amplamente, o que evita colapsos e crises sanitárias.

Quem tomou a vacina pode transmitir o vírus se for contaminado?

Segundo Karine Lima Lourenço, essa é a pergunta de "um milhão" na ciência atualmente, "Tudo na covid é muito novo. Isso ainda não foi de fato esclarecido, está sendo pesquisado."

A dúvida traz ainda mais importância à manutenção dos cuidados preventivos enquanto a vacina não chega a maior parte da população, já que ainda não foi descartada a possibilidade de transmissão.

"As pessoas que estão vacinadas podem ser infectadas e logo o vírus é neutralizado. Mas nenhuma vacina tem 100% de eficácia e essas poderiam não responder, contrair o vírus e transmitir", alerta a pesquisadora.

Ela explica ainda que "Com base na bagagem que a gente tem na virologia em relação a outras vacinas, se a pessoa recebeu a vacina e tem a forma leve da doença, sim, ela poderia transmitir o vírus. Mas ainda não há como afirmar com certeza". 

A gente vai ter que se vacinar todo ano?

Essa dúvida também ainda não foi totalmente respondida, mas já há indicativos de que será necessário garantir a vacinação posteriormente. 

"Algumas formulações já estão em adaptação no protocolo para novas variantes. Diversos estudos têm mostrado que as vacinas que utilizamos aqui no Brasil são eficazes frente às variantes que circulam aqui", afirma Karine Lima Lourenço.

A pesquisadora explica que "É importante a gente trabalhar, não só na produção de vacinas, mas na caracterização dessas novas variante. Porque nós conseguimos mudar o protocolo vacinal ao longo do tempo".

"Provavelmente, o que vai acontecer é que a vacina contra a covid-19 vai ser como da da gripe. Nós tomaríamos essa vacina por muito tempo, uma ou duas vezes no ano. É uma vacina que deve nos acompanhar durante um tempo ainda".

Precisa vacinar todo mundo mesmo?

Para a ciência, esse assunto não deveria nem mesmo ser objeto de dúvida. Na história da humanidade, todas as doenças que foram controladas com vacinação precisaram de adesão coletiva. 

"Não é possível que uma vacina funcione se meia dúzia de gatos pingados receberem e o restante não. É necessário que o maior número de pessoas possível seja vacinado", pontua Karine.

Ela explica que a adesão coletiva protege quem não pode receber o imunizante por alguma questão alérgica, por exemplo. No caso da covid, como ainda não há estudos finalizados em menores de 18 anos, esse publico também precisa de proteção coletiva.

"Para que uma vacina funcione é necessário que o maior número de pessoas tome essa vacina. Para que a gente tenha uma imunidade coletiva contra esse patógeno", finaliza a pesquisadora. 

 

Edição: Vinícius Segalla