O agravamento do descontrole da pandemia no Brasil e as críticas multilaterais ao governo Bolsonaro têm ampliado a articulação de partidos de oposição em torno da pauta do impeachment do presidente da República. A ideia é aumentar a pressão sobre a Câmara dos Deputados, responsável pela tramitação inicial desse tipo de processo, para destravar as mais de 115 petições das quais Jair Bolsonaro é alvo.
Nesta sexta-feira (23) à tarde, uma reunião virtual deverá unir as siglas PT, PSB, PDT, PSOL, PCdoB, Rede, PV, UP e Cidadania e representantes dos diferentes pedidos já apresentados. O grupo de partidos, todos eles signatários de documentos com esse teor, tenta construir pontes para pressionar o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), a tirar as petições da gaveta.
::"A base constitucional para o impeachment de Bolsonaro está criada", por Gladstone Leonel Júnior::
O presidente nacional do PSOL, Juliano Medeiros, afirma que a ideia é também mostrar a adesão de atores de fora do campo da esquerda à pauta:
“Se trata de dar uma sinalização pra sociedade de que o impeachment não é só uma pauta da esquerda, da centro-esquerda, dos partidos ou movimentos sociais do campo popular, mas interessa a todos aqueles que defendem a democracia no Brasil e querem virar o jogo pra política voltar ao leito da normalidade democrática, o que não é possível com Bolsonaro governando o país", argumenta o dirigente político.
O psolista pontua que as diferenças entre os partidos envolvidos seguem presentes, e que a aglutinação de forças em torno da deposição do chefe do Executivo não significa aproximação programática ou eleitoral entre as legendas.
“Cada um tem trabalhado no seu quadrado pelo impeachment, então, queremos agora iniciativas comuns. De um lado, você tem o Alexandre Frota, o Kim Kataguiri e até o João Amoedo se manifestando e, de outro, você tem os movimentos sociais, os partidos de oposição, etc. A ideia agora é buscar apenas uma unidade tática para fazer os pedidos andarem.”
Os nove partidos são uníssonos no entendimento de que a pauta carece de maior mobilização e pressão popular sobre o Legislativo. As legendas deverão discutir com os signatários dos pedidos a possibilidade de convocação de atos pró-impeachment.
“Cada região, cada estado do país precisava se organizar pra pressionar os deputados que representam aquele estado. E os parlamentares precisam entender que há na sociedade, sim, uma vontade de que Bolsonaro seja afastado. A crise é muito grande. Temos um objetivo comum pra pensar ações de curto e médio prazo”, destaca a presidenta do PT, Gleisi Hoffmann.
Eventos
O leque de assinantes de pedidos de deposição já ultrapassa a marca de 1.480 pessoas e mais de 500 organizações envolvidas. O grupo esbarra, no entanto, na dificuldade de promover grandes manifestações presenciais, por conta dos riscos de maior alastramento do coronavírus.
“Há um certo paradoxo: a pandemia, por todos os títulos, justifica o impeachment e, ao mesmo tempo, impede que se tenha ampla mobilização, o que poderia viabilizar exatamente o impeachment. Esse paradoxo está aí, mas nós precisamos manter acesa a luta, até pra que, num dado momento, não existindo mais paradoxo, se possa viabilizar”, diz o presidente do Cidadania, Roberto Freire.
O dirigente está entre os diferentes atores que hoje pressionam a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) para se somar ao grupo dos pró-deposição de Bolsonaro. A entidade pediu impeachment de Fernando Collor, Dilma Rousseff e Michel Temer. Em carta aberta endereçada no último dia 16 ao presidente da instituição, Felipe Santa Cruz, Roberto Freire pediu que a ordem “cumpra seu papel histórico”.
Um relatório produzido pela comissão especial de juristas da OAB que se debruça sobre questões relacionadas à pandemia chegou a recomendar, na semana passada, que a ordem protocole pedido de impeachment por conta de uma série de crimes atribuídos a Bolsonaro. Mas a pauta ainda divide o conselho federal da entidade e por isso está longe de um consenso interno.
Paralelamente, a oposição vê a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid como um elemento que ajudará a criar terreno mais fértil para o impeachment por conta da tendência de maior desgaste político de Bolsonaro, que enfrenta atualmente aumento de rejeição popular. O colegiado será instalado na próxima terça (27).
Para Roberto Freire, a CPI vai ajudar a “consolidar o clima” de impedimento e o momento é de “agitação e propaganda” nas redes sociais em torno da bandeira. “Não tenho ceticismo em relação ao impeachment. O processo político é muito dinâmico e o governo a cada dia fica mais isolado, cada vez mais perdendo apoio de setores que lhe deram sustentação na eleição e também até bem pouco tempo atrás.”
Edição: Vinícius Segalla