O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Marco Aurélio Mello determinou, nesta quarta-feira (28), que a União e o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE) realizem o Censo ainda em 2021. O órgão já havia adiado a pesquisa para 2022, após seguidos cortes orçamentários promovidos pelo governo de Jair Bolsonaro (sem partido).
Em sua decisão, Mello evidencia a relevância do Censo para a implementação de políticas públicas. “O Executivo e o Legislativo elaboram, no âmbito do ente federado, políticas públicas visando implementar direitos fundamentais previstos na Constituição Federal. Como combater desigualdades, instituir programas de transferência de renda, construir escolas e hospitais sem prévio conhecimento das necessidades locais?”, pergunta o magistrado.
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O ministro lembrou que a União e o IBGE, ao cancelarem o Censo 2021, “descumprem o dever específico de organizar e manter os serviços oficiais de estatística e geografia de alcance nacional – artigo 21, inciso XV, da Constituição de 1988. Ameaçam, ao fim, a própria força normativa da Lei Maior.”
O Sindicato dos Trabalhadores do IBGE (ASSIBGE) não ficou satisfeito com a decisão do STF. Dione Oliveira, da Executiva Nacional do sindicato, criticou a falta de informações sobre o orçamento, na decisão.
“Defendemos a manutenção do Censo e a manutenção do Censo para ser realizado em 2022, em um momento de controle da pandemia. Esperamos que o STF ajude nisso”, afirmou a dirigente. Para a sindicalista, é possível que o levantamento seja prejudicado e que haja subnotificação dos dados se for realizado neste ano.
“Se houver a obrigatoriedade de realização do Censo durante a pandemia e sem orçamento necessário, corremos o risco de ir às ruas e realizar um Censo sem qualidade, com dados pouco consistentes, pois muita gente não receberá os trabalhadores em casa, com medo da doença. Além disso, os próprios trabalhadores terão suas vidas expostas”, lamenta Oliveira.
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Orçamento
Os servidores afirmam que o valor ideal para a realização do Censo no país é de R$ 3,1 bilhões. Na primeira versão do Orçamento 2021, o valor caiu para R$ 2 bilhões. Posteriormente, porém, o governo anunciou um novo corte, de 96%, reduzindo a verba para R$ 239 milhões e provocando o adiamento da pesquisa para 2022.
No dia 23 de abril, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) vetou R$ 29,1 bilhões do orçamento 2021. Para o IBGE, sobrou R$ 53 milhões, valor considerado “irrisório” pelo ASSIBGE. Oliveira explica que o orçamento mínimo para 2021, para garantir a realização do Censo em 2022, é de R$ 239 milhões.
“Esse valor é para garantir a manutenção de todos os servidores contratados e treinados desde 2019 para a realização do Censo. É o pessoal que está envolvido no treinamento da coleta, no planejamento da operação, o pessoal que está envolvido na logística e infraestrutura, os trabalhadores da informática e da manutenção do cadastro de dados e cadastro de endereço”, enumera Oliveira.
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Caso não haja orçamento para pagar os salários dos temporários, os trabalhadores seriam demitidos e outros teriam que ser contratados em seguida. Porém, explica Oliveira, não há tempo suficiente para cumprir a burocracia.
“É um volume de pessoas significativo, que já foi treinado. Seria um desperdício de recurso, se tiver que demitir todo mundo, que é o que vai acontecer, se ficar esse valor. A instituição vai demitir todo mundo, fazer outro processo seletivo e treinar outro contingente de pessoas, sendo que não há tempo hábil para isso. A prioridade é manter todo o pessoal temporário.”
Oliveira explica que parte da preparação do Censo, que deve ser feita ainda em 2021, é o cadastramento dos endereços dos domicílios. “Para isso, usamos imagens de satélite, que dependem de contratos para que sejam fornecidas. Sem essa base de endereços, não temos como ir à rua".
No calendário do Censo 2021, cujo início está marcado para agosto, estava prevista a realização do Teste de Homologação de Equipamentos e Sistema, no município de Engenheiro Paulo de Frontim, no Rio de Janeiro, que treinaria uma delegação do IBGE e também experimentaria os equipamentos utilizados pelos recenseadores.
Porém, o evento foi cancelado pelo órgão, após solicitação da prefeitura local, que fechou a cidade, com receio da pandemia do coronavírus.
Os sindicalistas alegam que com o orçamento previsto para 2021, a realização dos testes fica inviabilizada.
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Outro lado
Em entrevista ao site da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), publicada na última terça-feira (27), o novo presidente do IBGE, Eduardo Rios Neto, não confirmou a realização do Censo em 2022.
"Meu maior desafio é realizar o Censo Demográfico com qualidade e boa cobertura, agora sabendo que será, provavelmente, em 2022, a depender das circunstâncias sanitárias e orçamentárias. Vamos lutar pela integralidade do orçamento para o Censo 2022 e para mitigar as perdas operacionais em 2021." Até o fechamento desta matéria, o IBGE não havia respondido os questionamentos da reportagem. Se o órgão enviar uma nota, o texto será atualizado.
Censo
O Censo Demográfico é realizado desde 1872 no Brasil e, desde 1920, acontece decenalmente, sempre em datas fechadas. Antes de 2020, por conta da pandemia, a pesquisa foi adiada outras duas vezes: em 1930, por conta do levante daquele ano, que permitiu a chegada de Getúlio Vargas ao poder; e em 1990, quando foi prorrogado para 1991, por atraso do governo de Fernando Collor, que tentou evitar a contratação dos recenseadores. O então presidente queria recrutar os servidores federais para a função, mas foi impedido pela Justiça.
Edição: Vinícius Segalla