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Espertezas do Dunduca

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Um novo morador de Brasília queria um sítio para passar fins de semana. Tinha de ter um rio, pra pescar com os amigos. O Dunduca mostrou-lhe o seu sítio com um riacho correndo no fundo - Foto: Thiago Facchini
Eu só falo a verdade. Se os outros não sabem entender, não é culpa minha

Dunduca, apesar do apelido infantil, já estava meio velho quando resolveu ir arriscar a vida na região de Brasília, na época da construção da capital. Foi com a família toda, pra uma cidade ali perto, sabendo que as terras iam valorizar muito, e começou a criar gado ao mesmo tempo em que comprava fazendas dos antigos moradores, para dividir e vender como sítios e chácaras aos que chegavam.

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Comprava terras por alqueire e, às vezes, vendia por metro quadrado, aos novos moradores.

Logo que chegou à região, tinha um valentão que não gostava de quem vinha de fora. Viu o Dunduca num bar e já entrou provocando. Pegou uma garrafa de cachaça e começou a beber no gargalo, enquanto duvidava da macheza do recém-chegado. Deu-se um duelo no velho estilo dos filmes de bangue-bangue e, antes que o tal valentão engatilhasse o revólver, o Dunduca quebrou a garrafa em que ele bebia, com um tiro certeiro. Ou melhor, certeiro não. Casual. Os irmãos diziam que o Dunduca era péssimo de pontaria. Que tentou acertar o sujeito, errou e pegou a garrafa. Mas ficou com a fama.

Outra fama que tinha era a de esperto. Jamais era enganado nos negócios. E enganava muita gente, mas falava que nunca mentia:

— Eu só falo a verdade. Se os outros não sabem entender, não é culpa minha.

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Um dia, acharam que Dunduca entrou pelo cano, afinal. Tinha comprado um sítio horrível que jamais conseguiria passar pra frente. Terra bem ruim, não dava nada. Ele mesmo já achava que dessa vez tinham lhe passado a perna, mas não dava o braço a torcer. Dizia que não gastou dinheiro, só deu em troca do sítio umas armas e um monte de bodes, e justificava:

— A maior parte das armas estava com defeito, e bode só dá prejuízo.

Eis que um dia apareceu a salvação: um novo morador de Brasília queria um sítio para passar fins de semana. Tinha de ter um rio, pra pescar com os amigos. O Dunduca mostrou-lhe o seu sítio com um riacho correndo no fundo, sem nem uma árvore na margem. Mas o comprador não entendia de terra nem de rio. Só perguntava se tinha peixe naquele "rio". E o Dunduca respondia:

— Já comi muito peixe na beira desse rio.

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Feito o negócio, passada a escritura, o Dunduca, já com o dinheiro depositado no banco, falou pro comprador:

— Já comi umas duzentas latas de sardinha na beira daquele rio!

*Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Daniel Lamir