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Entenda as origens e extensão dos ataques de Israel contra palestinos; veja vídeo

Breno Altman, fundador do Opera Mundi, explica também os objetivos das agressões aos palestinos na Faixa de Gaza

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Ataques de Israel contra os palestinos têm deixado mortos e feridos na Faixa de Gaza. - Ahmad al-Basha / AFP

No programa 20 MINUTOS ANÁLISE desta terça-feira (18), o jornalista e fundador de Opera Mundi, Breno Altman, falou sobre as origens e extensão dos ataques de Israel contra os palestinos, que têm deixado mortos e feridos na Faixa de Gaza.  

As agressões atuais foram desencadeadas há algumas semanas devido à situação no bairro de Sheikh Jarrah, localizado na parte oriental de Jerusalém, onde diversas famílias receberam uma ordem de despejo por parte do governo israelense. 

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Até 1967, Jerusalém Oriental formava parte da Cisjordânia e, assim como a Faixa de Gaza, era território palestino. Desde 1948, porém, a porção palestina da capital estava sob mandato da Jordânia, por determinação da Organização das Nações Unidas (ONU), por causa da política israelense de “desterrar os palestinos, expulsando-os de seus territórios e negando seus direitos legais”, segundo explicou o jornalista. 

Por conta dessa política de “remoção dos cidadãos palestinos”, aqueles que viviam em cidades do território determinado como pertencente a Israel pela ONU, por exemplo Yaffa e Haifa, eram obrigados a se refugiar em outras regiões, como Sheikh Jarrah, em Jerusalém Oriental.

Em 1967, porém, na chamada Guerra dos Seis Dias, o Estado sionista, “alegando ameaça à sua segurança, decidiu ocupar os territórios destinados à constituição de uma futura nação palestina”. A Jordânia perdeu o controle de Jerusalém Oriental, que passou ao comando de Israel.

“A partir de 1972, grupos de judeus começaram a entrar na Justiça para se apoderar das moradias de Sheikh Jarrah, apoiados pelo governo e financiados pelos Estados Unidos, em mais um capítulo da limpeza étnica comandada pelo sionismo”, argumentou Altman.

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O jornalista, que é de origem judaica, defendeu que o objetivo do governo colonial é manter o equilíbrio da população de Jerusalém em 70% de judeus e 30% de palestinos: “Cerca de 200 mil israelenses já vivem na parte oriental, protegidos pela polícia e pelo exército, e 140 mil palestinos nascidos na cidade foram expulsos para além das cercas coloniais que dividem o município da área controlada pela Autoridade Palestina”.

De acordo com o direito internacional, a Justiça israelense não tem qualquer autoridade sobre um território ilegalmente ocupado, como é o de Jerusalém Oriental. “Ainda por cima, os juízes sionistas têm tanta isenção quanto os magistrados brancos do sul norte-americano em processos contra negros”, ironizou o fundador de Opera Mundi. 

Diante desse cenário, a partir de 2002, várias dessas petições foram aceitas, despejando famílias palestinas e entregando suas residências aos reclamantes judeus. 

Assim, no final de abril de 2021, uma nova deliberação da Corte Distrital de Jerusalém ordenou o despejo de mais sete famílias palestinas, um total de 58 pessoas, incluindo 17 crianças, que deveriam abandonar suas casas até 1º de agosto, e cedê-las a colonos israelenses. 

“Essa sentença provocou uma reação generalizada dos palestinos nos territórios ocupados, mas também de árabes-israelenses, que constituem algo como 20% da população de Israel”, disse Altman. 

O primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, às voltas com problemas políticos para formar um novo governo, aproveitou a oportunidade para desencadear uma brutal onda repressiva contra os protestos e buscar alterar sua situação de isolamento.

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“Mais uma vez, colocando a política colonialista do Estado de Israel como sua grande bandeira, governando o país há doze anos contínuos, o Likud de Netanyahu volta a recuperar condições de governabilidade, unificando toda a direita sionista”, ressaltou o jornalista.

Repressão e reação
A repressão contra os protestos palestinos levou à reação do Hamas, a formação político-guerrilheira que governa a Faixa de Gaza. Mísseis foram lançados sobre cidades israelenses, como resposta às agressões do Estado colonizador. 

O Hamas é considerado como um grupo terrorista pelos sionistas e seus aliados. Para Altman, essa definição se trata de “um absurdo legal e moral: um povo submetido ao colonialismo tem todo o direito de exercer a violência em legítima defesa, como fizeram os próprios judeus contra o colonialismo britânico”.

Frente ao que os palestinos definem como uma nova e continuada Nakba (palavra árabe para catástrofe ou desastre, que designa o êxodo forçado dos palestinos a partir de 1948), as lideranças mais combativas chamam à Terceira Intifada – a primeira dessas rebeliões ocorreu entre 1987 e 1993, a segunda entre 2000 e 2005. 

A agressão de Netanyahu, estimulando o nacionalismo sionista ao limite para angariar apoio político interno, já matou 212 palestinos, incluindo 61 crianças, 36 mulheres e 16 idosos, até a última segunda-feira (17/05), segundo informações do Ministério de Saúde de Gaza.

“Hipocritamente grande parte da imprensa ocidental apelida essa agressão de ‘conflito’, quando se trata de puro e simples genocídio continuado, planejado por forças militares absurdamente superiores, especialmente força aérea, com o aval criminoso do senhor Joe Biden, o presidente dos EUA, que impede qualquer medida contra Israel no Conselho de Segurança das ONU”, defendeu Altman. 

Solução dos dois Estados
Para Altman, a nova onda de agressões faz parte da estratégia da direita sionista de matar qualquer possibilidade para a solução dos dois Estados, formalmente defendida até por Netanyahu e seus aliados. 

“O clima chauvinista e ultranacionalista serve para o governo continuar a expansão da colonização nos territórios ocupados, para os quais vão principalmente judeus ortodoxos, religiosos, formando famílias com alta taxa de natalidade, com o objetivo de tornar irreversível o cenário montado pelo sionismo”, refletiu.

Além disso, Gaza e partes da Cisjordânia, sob gestão palestina, não controlam fontes de água e arrecadação de impostos. Não têm soberania sobre sua defesa e sobre suas fronteiras. 

“Nos territórios ocupados, os palestinos estão sujeitos às leis israelenses, mas não têm direitos de cidadania, a começar pelo voto”, apontou o jornalista.

Segundo ele, a própria teoria sionista impedia o estabelecimento de dois Estados. "Esteve sempre assentada sobre uma contradição fatal, que acabaria por expurgar seus valores mais humanistas: a soberania de um povo através da submissão de outro povo somente poderia redundar em opressão, violência e guerra”, disse.

“A criação do Estado de Israel, em 1948, impulsionada pelo Holocausto, refletiu a enorme autoridade moral das ideias sionistas e seu apelo religioso. A partilha aprovada pelas Nações Unidas em 1947, dividindo a área em litígio entre duas pátrias, acabou por ser rechaçada pelos grupos palestinos e países árabes. Desorganizados, desunidos e mal armados, provocaram espiral bélica cujo resultado foi a expansão territorial de Israel”, ponderou.

Desde então, a ameaça externa passou a configurar novo álibi para o colonialismo sionista, levando à guerras ilegais de anexações que abalaram a hipótese de um Estado palestino. Aliado aos EUA a partir do início dos anos 50, durante o governo de Jimmy Carter, Israel logo se transformou em um dos países militarmente mais poderosos do mundo, além de ganhar a proteção do Conselho de Segurança da ONU.

Com Joe Biden, Israel segue protegido, recebendo um financiamento militar de quatro bilhões de dólares ao ano. Altman condenou o mais recente presidente norte-americano, que, para ele, “já deveria responder por crimes contra a humanidade, ao lavar as mãos e proteger o sionismo em suas ações genocidas”.

“Essa dinâmica assemelha Israel a um híbrido sistema de castas. Para a maioria dos judeus, um país moderno, democrático e relativamente justo. Para os árabes-israelenses, que constituem 20% da população interna, um regime segregacionista e cidadania de segunda classe. Para os árabes-palestinos, que vivem nos territórios ocupados depois da Guerra de 1967, um apartheid brutal e implacável”, enfatizou Altman.

Palestinos e grupos de apoio à causa palestina reivindicam o BDS como forma de pressionar o governo israelense: boicote, desinvestimento e sanções. Na opinião de Altman, “apenas a asfixia econômica e militar do Estado de Israel, somada à resistência dos palestinos, inclusive armada, e a eventual rebelião interna, de árabes-israelenses ou mesmo de parte da população judaica, poderá derrotar o colonialismo. 

É por isso que, para ele, a solução dos dois Estados parece inviável: “Manter-se em sua defesa poder virar uma falácia que colabora com as intenções do fundamentalismo sionista, desejoso de ganhar tempo infinito”. 

Assim, restaria apenas a opção de um só Estado para dois povos e duas religiões, laico, com garantias fortes para todas as minorias, baseado em um princípio básico da democracia: um homem, uma mulher, um voto. “Representaria a conversão de todos os habitantes da Palestina histórica – judeus, palestino e todas as demais etnias – em cidadãos plenos, sem qualquer discriminação nacional, religiosa ou étnica”, refletiu.

‘Antissionismo não é o mesmo que antissemitismo’

Durante o programa, Altman, apesar de ateu, fez questão de ressaltar sua origem judaica e contar que sua família foi quase dizimada no Holocausto, poucos sobreviveram. 

“Dou esse testemunho para reforçar algo essencial: antissionismo não é o mesmo que antissemitismo. Antissemitismo é discriminação racial, da qual os judeus são vítimas há muitos séculos, ainda que os árabes também sejam semitas. Semitas são todos os povos que tradicionalmente falavam línguas semíticas, entre os quais se destacam hebreus e árabes. Antissionismo é a oposição à determinada corrente ideológica presente no judaísmo, mas que atualmente também faz sucesso entre certos grupos evangélicos. Quase todos os sionistas são judeus, mas nem todos os judeus são sionistas”, concluiu.