A candidata à Presidência do Peru pelo partido Fuerza Popular, Keiko Fujimori, declarou que as esterilizações forçadas em mulheres que ocorreram durante o governo ditatorial de Alberto Fujimori (1990-2002), seu pai, tratam-se, na verdade, de “planejamento familiar”.
A declaração sobre a política promovida durante a ditadura fujimorista ocorreu após o Partido Popular Cristão (PCC) oficializar apoio à sua candidatura, na última sexta-feira (14). Keiko disputa o segundo turno das eleições presidenciais, que acontecem em 6 de junho, contra o candidato de esquerda Pedro Castillo, do Perú Libre.
Na ocasião, a candidata foi questionada sobre o julgamento aberto pela Justiça do Peru, iniciado em 1º de março de 2021 contra seu pai, para investigar o plano de esterilização forçada que ocorreu durante a ditadura.
“No caso do processo que está sendo realizado sobre aquilo que ´e mal chamado de 'esterilizações forçadas', que na verdade ´é um plano de planejamento familiar, são investigações que estão sendo feitas há 20 anos e já foram ajuizadas quatro vezes”, declarou.
Por outro lado, em sua campanha, Castillo tem repudiado as esterilizações forçadas do governo fujimorista: em 24 de abril, ele disse que, em seu mandato, caso seja eleito, "não irão encontrar um governo que queira arrancar o útero de mães e mulheres peruanas".
O ex-presidente Alberto Fujimori, hoje com 82 anos, governou o país entre 1990 e 2000, tendo dado um autogolpe em 5 de abril de 1992. Ele contou com o apoio das Forças Armadas para dissolver o Congresso, intervir no Poder Judiciário, tomar meios de comunicação e perseguir a oposição.
Preso no Instituto Penitenciário Nacional (INPE) em Lima, o ex-ditador cumpre pena de 25 anos por crimes contra a humanidade e corrupção. No começo de 2018, ele chegou a receber um indulto humanitário, depois de ter sido internado em uma unidade de terapia intensiva da cidade, com atestado de doença degenerativa, progressiva e incurável. Em outubro do mesmo ano, o indulto foi anulado.
Esterilizações forçadas
A prática da imposição de esterilizar mulheres era uma das medidas do Programa Nacional de Planejamento Familiar. Estima-se que mais de 300 mil mulheres e 25 mil homens em idade fértil e reprodutiva, sobretudo entre camponeses e indígenas, foram esterilizados sem consentimento.
Na verdade, o Comitê Latino-Americano e Caribeno dos Direitos da Mulher (Cladem) concluiu que apenas 10% das mulheres esterilizadas naquele período deram “consentimento genuíno” à operação. Há relatos também de complicações pós-operatórias, condições precárias de higiene, profissionais despreparados e mortes.
Organizações como a Anistia Internacional e a Cladem ouviram depoimentos junto ao Congresso peruano de pessoas que foram submetidas ao processo. Elas relataram os métodos de assédio, ameaças e chantagens empregados por funcionários dos órgãos de saúde naquela época.
Uma maneira de pressão era ameaçar mães de recém-nascidos com a recusa ao registro civil do bebê. Outra ameaça era a de fazer abortos em mulheres grávidas ou a chamar a polícia para aquelas que não aceitassem a esterilização. Incentivos financeiros também eram pagos aos maridos para que eles assinassem autorização ao procedimento.
O Tribunal Penal Internacional (TPI) classificou os atos como crimes contra a humanidade, e em 2015, o tema foi elevado por decreto a "assunto de interesse nacional do Peru" durante o governo de Ollanta Humala.
O processo judicial iniciado em março deste ano pode levar meses, ou até anos, para ter um desfecho. Nele, também são réus os ex-ministros da Saúde Alejandro Aguinaga, Eduardo Yong Motta e Marino Costa Bauer.